Corujas e morcegos

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terça-feira, 16 de abril de 2013

Concepção




                   Para Tânia Contreiras e Leonardo B. 

Com quantas contas me conta
teu rosário de dor e rosas,
à minha espera em silente cio?

Por que ardores me chamas
das profundezas que afloram
oceânicos vulcões de sangue?

A que final me destinas
em teu ciclo de incêndios
para os quais me concebeste?

terça-feira, 26 de junho de 2012

pássaros para sempre

  
. . . . . . . . . . . . meus pés descalços
. . . . . . . . . . . . já não rejeitam a lama frígida
. . . . . . . . . . . . que os enrugará cada dia mais
. . . . . . . . . . . . nem as pedras que os esfolarão
. . . . . . . . . . . . até que deles nada mais reste
. . . . . . . . . . . . no asfalto ardente que fritará suas almas (
. . . . . . . . . . . . sim, há pés com alma)

. . . . . . . . . . . . meus pés descalços apenas sonham
. . . . . . . . . . . . me sonhar de cabeça para baixo
. . . . . . . . . . . . eles nas nuvens, altíssimas nuvens
. . . . . . . . . . . . calçando sapatos que os ventos
. . . . . . . . . . . . para espantar a solidão tricotaram
. . . . . . . . . . . . com penas perdidas pelas aves migratórias,
. . . . . . . . . . . . generosas, distraídas, desapegadas
. . . . . . . . . . . . de toda dor que ficou para trás, bem para trás
. . . . . . . . . . . . de cada mínima pluma que um dia
. . . . . . . . . . . . haverá de passar, empassarada
. . . . . . . . . . . . no compasso compassivo dos passos
. . . . . . . . . . . . de meus pés, meros passageiros, alvos de leveza
. . . . . . . . . . . . pássaros para sempre
. . . . . . . . . . . . a teus pés, esses teus pés
. . . . . . . . . . . . caminhantes de aerovias no azul
. . . . . . . . . . . . infinito enquanto voas a meu lado

segunda-feira, 3 de outubro de 2011

A dança dos tangarás



“Eu queria ser um avestruz/
Um monte de passarinhos”

Simone Guimarães

Tem coisa mais linda
que mulher feia
quando lambuza a gente
de desejo e paixão?

Essas deusas de unhas e asas
e estrelas bem aparadas
fazem de mim, esse avestruz
metido a fênix, uma revoada
de passarinhos multicoloridos.

Tangarás, incontáveis tangarás
disputando dentro de mim
a fêmea desgraciosa que vem
toda vez que eles, despidos
do preconceito de enfeitar-se,
dançam, dançam, dançam...
até que um deles conquiste
o pequeno útero que haverá
de tragá-lo inteiro, bem fundo,
até o coração da vida.

terça-feira, 13 de setembro de 2011

Primaveril

.

 
Está florida, primaveril
a planta dos meus pés,
a  lembrar-me que neles
levo,
sempre fértil, a terra firme,
por esse incessante oceano
de nuvens que percorro
tanto
quanto elas me percorrem.

sexta-feira, 1 de abril de 2011

Suruba cívica


(De O Maracangalhudo e sucursais)....
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Uma récova de altas patentes militares remanescentes do Golpe de 64 resolveu dar sua contribuição à campanha pelo resgate da verdade histórica no período ditatorial. Reunidos em seu atual quartel-general, o Asilo Direita Volver!, os generais de pijama decidiram oficializar a data verdadeira da quartelada: 1o de abril – em vez do ilegítimo e já surrado 31 de março.

A notícia foi divulgada no final da noite de ontem pelo embaixador-comandante-em-chefe da tropa de micróbios – digo, macróbios ­–, deputado federal Jair Bolsonaro, que informou ainda:

– Para comemorar a nova data promoveremos amanhã (hoje) um grande rebuceteio patriótico, familiar e cristão. Estão convidados a participar todos os brasileiros e sobretudo as brasileiras, exceto os negros, pardos, paraíbas, ateus, maconheiros, esquerdistas e centristas de um modo geral, viados, sapatões e pobres.
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quinta-feira, 31 de março de 2011

Cerâmica sexual

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 .
 . . . . .. . . . . . . . . . . . . . . . . . .Da argila tirou um pedaço
 . . . . .. . . . . . . . . . . . . . . . . . .e fezô’.. E desse ô’ tirou
 . . . . .. . . . . . . . . . . . . . . . . . .um pedaço e fez ‘ä’..Então
 . . . . .. . . . . . . . . . . . . . . . . . .pegou o resto da argila e o
 . . . . .. . . . . . . . . . . . . . . . . . .levou com ‘ô’ e ‘ä’ ao forno.
 . . . . .. . . . . . . . . . . . . . . . . . .E desejou, sem medo ou cu-
 . . . . .. . . . . . . . . . . . . . . . . . .lpa: 'Seja o que Eu quiser.'

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quarta-feira, 30 de março de 2011

Boca a boca


.
. . . . . . . . . . . . . . . . . Na carne, no osso
. . . . . . . . . . . . . . . . . A dor vai penetrando
. . . . . . . . . . . . . . . . . Quem sentirá, tanto como eu, minha agonia?
. . . . . . . . . . . . . . . . . Delírio de velha
. . . . . . . . . . . . . . . . . Visão ou lembrança
. . . . . . . . . . . . . . . . . Ah, como fui jovem
. . . . . . . . . . . . . . . . . E amei demais a vida.

. . . . . . . . . . . . . . . . . Estou sozinha na cama fria
. . . . . . . . . . . . . . . . . Meu corpo arde na lenta espera
. . . . . . . . . . . . . . . . . Estou sozinha na cama, na vida
. . . . . . . . . . . . . . . . . Estou sozinha diante da morte.
. . . . . . . . . . . . . . . . . É o medo, é o frio
. . . . . . . . . . . . . . . . . Nas juntas, nos nervos
. . . . . . . . . . . . . . . . . Quem me dará forças
. . . . . . . . . . . . . . . . . Para ver o fim de tudo?

. . . . . . . . . . . . . . . . . Eu tenho fé no mundo e nos homens
. . . . . . . . . . . . . . . . . Eu tenho fé nesta louca aventura
. . . . . . . . . . . . . . . . . Eu quero sim este ar que me falta
. . . . . . . . . . . . . . . . . Eu quero sim respirar boca a boca, amar.

. . . . . . . . . . . . . . . . . Nas juntas, nos nervos
. . . . . . . . . . . . . . . . . Quem te dará forças
. . . . . . . . . . . . . . . . . Para ver o fim de tudo?
 .
  
Esta canção, umas das mais belas e certamente a mais sombria da dupla Milton Nascimento/ Fernando Brant, não ‘tocou no rádio’. Milton a incluiu no disco Maria Maria/ Último trem (1975), mas não a ‘trabalhou’ nem em shows. No ano seguinte, Nana Caymmi registrou sua versão – imbatível, antológica!  - no LP Renascer.

A música é tão boa, tão sofisticada (com Brant em estado de graça demoníaca!) que, claro, não se encontra no Youtube. Achei a letra em diversos sites, mas não a gravação. Em alguns, acompanha a letra um vídeo em que Nana canta 'Cala a boca menino'. Então... cala a boca, menino(a), e tenta ouvir por aí, de preferência na voz de Nana, a velha ainda a gemer de tesão pela vida na hora da morte!

 (A foto – em cores invertidas – é da escultura ‘O Beijo da Morte’, instalada em 1930 numa sepultura do Cemitério de Barcelona.)

sexta-feira, 25 de março de 2011

Toda luz


 .   .   .   .   .   .   .   .   .   .   .   .  .   .   .   Fecha os olhos e vê
 .   .   .   .   .   .   .   .   .   .   .   .  .   .   .   toda luz
 .   .   .   .   .   .   .   .   .   .   .   .  .   .   .   da escuridão.
 

quinta-feira, 24 de março de 2011