Mostrar mensagens com a etiqueta distopia. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta distopia. Mostrar todas as mensagens

terça-feira, setembro 20, 2022

Sonhos alheios

Parece evidente que o “sonho americano” não é para todos nós sonharmos. É um sonho apenas ao alcance dos grandes (os grandes da política, da finança, do desporto, do espectáculo, etc.) que nos é servido goela abaixo pelos meios de comunicação de massas. 

 

A forma como nos é impingida esta narrativa mostra que os diferentes canais noticiosos são, afinal, desconcertantemente semelhantes. Fica a sensação de que há uma pretensão mais ou menos velada de nos transformar a todos numa espécie de zombies sociais. Zombies que andam de um lado para o outro à procura de um pedaço de sonho americano para devorarem num ápice e que, logo após o terem consumido, voltam a arrastar o seu desejo sem que se vislumbre outra vontade que não seja a de saciar esta fome inumana. É a discreta transformação dos cidadãos em consumidores.

 

Talvez vá sendo tempo de compreendermos que o “mundo ocidental” está a cantar como um cisne e que as gerações futuras irão habitar um mundo com equilíbrios geopolíticos muito diferentes dos actuais onde, temo bem, o discurso dos Direitos Humanos não terá lugar, nem sequer como ornamento. É o “sonho chinês”?

terça-feira, julho 14, 2020

O futuro até pode já ter acontecido

O futuro começa a tomar forma. O "sonho americano" revela-se "notícia falsa" e o "pesadelo chinês" parece ganhar força, alastrando no mapa planetário. Onde se encaixa a União Europeia nesta ordem mundial que se redesenha? Seja qual for o modelo onírico prevalecente será sempre o dinheiro a ditar os contornos definitivos da coisa social.

Deus reaparece em força. Ele sempre andou por aí. Já se sabe que os americanos confiam nele (afirmam-no nas notas de dólar), que os iranianos obedecem à sua lei, que os turcos são um povo devoto e os brasileiros acreditam que Deus é natural do Rio de Janeiro. Sabe-se também que Paulo Portas é confidente da Virgem Maria, que Putin se vem convertendo em ícone russo e que Israel é o povo escolhido e tudo o que faz é mero reflexo da vontade inquestionável e inatingível de Jeová. Esta acumulação patética de hipocrisia e agressividade moral tem muita influência na definição dos traços carregados que contornam o futuro.

As coisas acontecem num determinado momento, o ponto exacto da quebra, da transformação de algo numa outra coisa. Pode ser amanhã, daqui a dez anos, pode ter sido agora mesmo ou até, algures, no passado sem que nos tenhamos apercebido da importância radical de um qualquer acontecimento que desviou o futuro daquilo que imaginávamos que viria a ser. O tempo do comboio a vapor acabou há muito. Hoje dirigimo-nos para o nosso destino a bordo de um comboio-bala desenfreado. A chegada à estação não se adivinha auspiciosa.

À medida que vou escrevendo estas palavras uma pergunta vai-se formando no meu espírito inquieto: e se o futuro já tiver acontecido?

terça-feira, junho 12, 2018

Sangue da cor do mijo

Há uma lufada de ar bafiento a percorrer este mundo onde nos encavalitamos uns nos outros. É um ar dos tempos, um "je ne sais quoi", uma atitude de prepotência descarada que os poderosos adoptam na maior das calmas e com uma naturalidade preocupante.

Nós, o povoléu, elegemos figurões para nos governarem. Uma vez alcandorados ao vértice da pirâmide, os eleitos passam a actuar como se lhes não aplicassem leis nem regras; constituem uma espécie de novíssima realeza, mas com sangue cor de mijo.

Estes governantes tratam-nos frequentemente como se fôssemos estúpidos ou, quando muito, como se fôssemos imbecis ou meros idiotas. Mentem-nos, desprezam-nos, ignoram-nos; nós, o povoléu, somos meros pormenores pitorescos nesta vida de fausto e grandiosidade mediática que é a existência dos príncipes com sangue cor de mijo.

Não há princípios, não há valores, imperam as folhas de cálculo. Os problemas são analisados à luz da economia, as ciências humanas são encaradas como se fossem bruxaria. Não tarda regressam as fogueiras na praça pública para queimar os incréus.

Democracia? Justiça social? Estado? Previdência?

Tem cuidado com o que dizes, cabisbaixo leitor, tem, até, muito cuidado com o que pensas! A realeza do sangue cor de mijo é mesquinha, traiçoeira e compraz-se com questiúnculas de merda desde que sirvam os seus propósitos que, quase sempre, não passam muito para da mera satisfação pessoal. Custe o que custar.

A nossas vidas são coisitas.

sexta-feira, junho 01, 2018

Flashes macabros

O mundo teima em ser um lugar complicado, dá a sensação que tudo faz para se livrar da espécie humana, como um cão imenso que anseia livrar-se de multidões incontáveis de pulgas e carraças.

Não sei se sou pulga se carraça. Penso que sou mais pulga.

"Peixes grandes comem peixes pequenos", diz o ditado (penso que flamengo) magistralmente ilustrado por mestre Bruegel, o Velho. É uma imagem de indolente violência. Um homem agarra uma enorme navalha com que esventra um peixe gigantesco. Barriga e boca abertas deixam escorregar peixes mais pequenos que, das suas bocas, libertam outros num cenário delirante de morte.

A vida é uma guerra constante contra a morte, uma guerra infinita com vencedor anunciado. Um dia esta guerra irá terminar.

segunda-feira, setembro 30, 2013

Noite escura

Em comentário ao post anterior o Eduardo P.L. disse...
Que esperança se pode ter quando nossa juventude ( normalmente a esperança do futuro ) está apática, distante e desencantada. O pior dos mundos.

Neste momento estou a pensar que mundo temos nós para oferecer às gerações vindouras. As imagens que me passam pela cabeça são estranhas, são imagens distópicas, dignas de um filme de ficção científica série Z, coisa a rondar o imaginário de um filme de zombies mais ou menos pacíficos. É tudo cinema de má qualidade.

A nossa juventude é resultado da nossa idade adulta. Normalmente a juventude reage aos princípios dos mais velhos. Mas, no cenário actual, temo que essa reacção seja mais violenta do que em gerações anteriores. Parece-me evidente que estamos a exaurir o planeta, esgotando recursos a uma velocidade supersónica sem acautelarmos alternativas credíveis que permitam manter os níveis  civilizacionais por muito mais tempo.

Não sei o que sentem os mais jovens mas talvez estejam a perceber que o "planeta petróleo" não será o deles, que "os amanhãs que cantam" já foram ontem. Talvez estejam a sentir que o Estado Social não aguenta a tormenta capitalista e que os ricos serão cada vez menos e mais ricos e os mais pobres cada vez mais e mais pobres. A classe média a resvalar para a base da pirâmide social que, um dia destes, deixará de ter a forma de pirâmide para tomar a forma de uma coisa estranha com uma base enorme e compacta e um topo fininho.

Meu caro Eduardo, eu diria: que esperança se pode ter quando as nossas elites se comportam como vampiros agressivos e tão desencantados como a massa popular a quem sugam o sangue e a vida?