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quinta-feira, 2 de fevereiro de 2017

Fuga da ociosidade - Santo Afonso Maria de Ligório


É preciso notar aqui que é um engano acreditar que o trabalho é nocivo à saúde do corpo, quando é certo que o exercício corporal ajuda muito a conservar a saúde.

Muitas vezes o que faz apresentar escusas do trabalho, não é tanto o perigo da saúde, mas o peso e fadiga que o acompanham e que desejamos evitar. Ah! Quem lançar os olhos no Crucifixo, não andará esquivando-se dos trabalhos. — Um dia, Sór Francisca do Santo Anjo, Carmelita, se lamentava de ter as mãos todas dilaceradas de tanto trabalhar, e Jesus Crucificado lhe respondeu: Francisca, olha as minhas mãos e depois lamenta-te. 

Além disso, o trabalho é um remédio contra os enfados de solidão, e também contra as numerosas tentações que muitas vezes assaltam os solitários. — Sto. Antão abade achava-se um dia muito atormentado de pensamentos desonestos e ao mesmo tempo muito fatigado da solidão: não sabia o que fazer para se aliviar. Apareceu-lhe então um anjo, que o conduziu ao pequeno jardim que havia ali perto; e, tomando uma enxadinha, começou a lavrar a terra, e, em seguida, se pôs a orar. De novo, principiou a trabalhar e depois tornou a orar. Com isto, ensinou ao santo o modo como havia de conservar a solidão e ao mesmo tempo livrar-se das tentações, passando da oração ao trabalho, e do trabalho a oração. Não se deve trabalhar sempre, mas também não se pode orar sempre, sem se arriscar a perder a cabeça, e se tornar depois absolutamente inútil para todos os exercícios espirituais. — É por isso que Sta. Teresa, depois de sua morte, apareceu à Sór Paula Maria de Jesus e lhe recomendou que nunca abandonasse os exercícios corporais sob pretexto de fazer obras mais santas, assegurando-lhe que tais exercícios aproveitam muito para a salvação eterna. 

De outra parte, os trabalhos manuais, quando se fazem sem paixão e sem inquietação, não impedem de fazer oração. — Sor Margarida da Cruz, arquiduquesa de Áustria e religiosa descalça de Sta. Clara, se dedicava aos ofícios mais trabalhosos do mosteiro, e dizia que, entre outros exercícios, o trabalho não é somente útil às monjas, mas também necessário, visto que não impede o coração de se elevar para Deus.

Narra-se que S. Bernardo, um dia vendo um monge que não deixava de orar enquanto trabalhava, disse-lhe: “Continua, meu irmão, a fazer sempre o que fazes agora, e alegra-te, porque, deste modo, quando morreres, serás livre do purgatório”. O mesmo santo seguia esta prática como refere o escritor de sua vida; pois, não descuidava dos trabalhos exteriores e ao mesmo tempo se recolhia todo em Deus.

Santo Afonso de Ligório no livro: A Verdadeira Esposa de Cristo.
Créditos: Modéstia Masculina São José

sexta-feira, 20 de novembro de 2015

Padre Daniel Pinheiro IBP - O combate pela virtude da castidade [Sermão]


“Tudo o que fizerdes, em palavras ou por obras, fazei tudo em nome do Senhor Jesus Cristo, dando por Ele graças a Deus Pai.”

Na parábola de hoje, NS diz que, enquanto os homens dormiam, veio o inimigo e semeou cizânia no meio do trigo e foi-se. Entre a cizânia semeada, podemos destacar o pecado da impureza, que tão grande mal faz às almas e à sociedade e que abunda na sociedade, em todos os meios. Diz o Santo Cura d’Ars que nenhum pecado destrói tão rapidamente a alma quanto esse pecado vergonhoso que nos tira da mão de Deus e nos joga na lama. São Tomás de Aquino diz algo semelhante: pela luxúria ou impureza somos afastados ao máximo de Deus. Os santos não estão dizendo aqui que o pecado da impureza é, em si mesmo, o pecado mais grave. O pecado de ódio a Deus ou um pecado contra a fé são em si mais graves, por exemplo. Todavia, os santos dizem que a impureza afasta mais de Deus que outros pecados em virtude da dificuldade em emendar-se quando se contrai o mau hábito de cair nesses pecados vergonhosos. Levado pela ferida do pecado original, o ser humano se deixa escravizar facilmente por esse pecado. E daí vêm consequências gravíssimas. Sobre as consequências drásticas desse pecado para uma alma e para a sociedade, sobre as filhas da luxúria ou impureza, falamos em um importante sermão nos dias do carnaval. Não custa enumerar essas consequências novamente. O vício da impureza gera: cegueira de espírito, precipitação, inconsideração, inconstância, amor desordenado de si mesmo, ódio a Deus, apego à vida presente, desespero com relação à salvação. A luxúria, por tudo isso, leva também a pessoa a perder a fé, a desprezar as verdades reveladas e a se obstinar no pecado, esquecida do juízo e do inferno. Para fazer uma alma perder a fé, é muitas vezes mais eficaz fazê-la se afundar na luxúria do que combater a fé diretamente. As músicas sensuais pelas letras e ritmos, filmes, roupas indecentes, etc., contribuem muitíssimo para a perda da fé sem atacá-la diretamente. Os que combatem a Igreja sabem muito bem disso. Podemos citar ainda, entre as filhas da luxúria, o aborto, que é assassinato, e a eutanásia, que é suicídio ou assassinato. A luxúria leva ao aborto porque as pessoas querem satisfazer suas paixões desordenadas sem responsabilidade. Leva à eutanásia porque se a pessoa já não pode aproveitar a vida, melhor que morra. Quantos males gravíssimos e quantas calamidades espirituais são causados pela busca de um prazer desordenado instantâneo, passageiro. Se de nada vale ao homem ganhar o mundo inteiro, se ele vier a perder a sua alma, o quanto vale ao homem cometer tão vergonhoso e torpe pecado, que lhe faz perder o céu e merecer o inferno? Diz Santo Afonso que, entre os adultos, poucos se salvam por causa desse pecado. Ele dizia isso no século XVIII. Podemos imaginar a situação em nossos dias… Por tão pouca e vergonhosa coisa.

Tendo, então, uma breve ideia das consequências desse pecado, procuremos os meios para adquirir ou avançar na virtude oposta a esse vício, quer dizer, na virtude da castidade. A virtude da castidade é a virtude derivada da virtude de temperança que nos faz ordenar o apetite venéreo conforme a razão iluminada pela fé, que reconhece que isso se reserva aos cônjuges no bom uso do matrimônio, isto é, sem que a procriação seja impedida, podendo, nesse caso, ser verdadeiramente um ato meritório diante Deus. Nossa razão reconhece que esse ato é ordenado à procriação e subsequente educação dos filhos, que se deve fazer dentro de um matrimônio indissolúvel.

Para que possa haver castidade, é preciso que haja primeiro, nos diz São Tomás, a vergonha e a honestidade. A vergonha é o sentimento louvável de temer a desonra e a confusão que são consequência de um pecado torpe. A honestidade é o amor à beleza que provém da prática da virtude. Devemos ter essa vergonha e essa honestidade. Outra raiz da pureza é a modéstia no nosso exterior, no falar, nos modos, no vestir, etc. Sem a modéstia, a pureza será impossível para nós e seremos também causa da queda dos outros.

Colocadas essas bases, para alcançar a castidade, é preciso também rezar muitíssimo, pedindo essa graça. Rezar, sobretudo, para Nossa Senhora, Mãe Castíssima, que sabe ensinar a seus filhos a castidade. A devoção das três Ave-Marias quando se acorda e antes de dormir, pedindo a graça da pureza é muito eficaz para se adquirir a pureza ou para perseverar nela. Também a devoção a São José é muito eficaz no combate pela pureza, pela castidade, sobretudo para os homens. São José ensina aos homens a verdadeira virilidade, que consiste em ter o domínio sobre suas paixões. O homem que se deixa levar pelas paixões, pela impureza é considerado em nossa sociedade decadente como viril. Ora, esse homem é, ao contrário, efeminado, pois efeminado, tecnicamente, é aquele que se deixa levar pelas paixões, pelas más inclinações, que não tem força para combatê-las e vencê-las, em virtude da tristeza e das dificuldades que existem na prática da virtude. Portanto, a devoção a São José vai nos ensinar a verdadeira virilidade, que consiste na castidade. Como diz o Salmo (30, 25): Agi com virilidade e fortalecei o vosso coração, vós que esperais no Senhor. Viriliter agite et confortetur cor vestrum qui speratis in Domino. Invocar o nome de Jesus, Maria e José é de uma eficácia particular para se obter a pureza.

Para sermos castos, é preciso também mortificar os sentidos, sobretudo os olhos. Jó fez um pacto com seus olhos para não olhar para as moças e, assim, se manteve casto. Evitar a vã curiosidade, não parar os olhos em algo que possa suscitar maus pensamentos ou imaginações. E, justamente, é preciso mortificar nossa imaginação, controlando-a, ordenando-a.

É preciso evitar também as ocasiões de pecado, isto é, os ambientes, as pessoas, as coisas, as circunstâncias que podem levar a pecados contra a pureza. Muito cuidado é necessário no namoro ou no noivado. Namorados e noivos devem estar sempre em locais públicos que lhes impeçam de cometer pecados contra a pureza. Devem evitar andar de carro sozinhos, por exemplo. Namoro e noivado devem durar entre um e dois anos, tempo suficiente para conhecer a alma do outro, e que impede o surgimento de familiaridades indevidas. Bastaria um beijo apaixonado para haver um pecado grave entre namorados e noivos (conforme decreto do Santo Ofício de 1666, sob o Papa Alexandre VII). Os pecados contra a pureza aqui prejudicam também o correto juízo que se deve fazer da alma do outro, de suas qualidades e defeitos, a fim de saber se é possível ou não viver uma vida inteira com a pessoa… Levada pelos sentimentos e paixões, o julgamento será falseado.

Outra ocasião de pecado muito séria hoje é o computador, a internet. Deve-se usar a internet com um objetivo preciso, definido, fazendo uma oração antes ou depois. Quem navega à toa na internet dificilmente se preserva de pecado nessa matéria. Redes sociais também são grande fonte de perigo. Se uma pessoa já caiu várias vezes por meio de internet, reze antes de usá-la, coloque uma imagem de Nosso Senhor ou Nossa Senhora perto, para lembrar a presença de Deus, utilize o computador em local público, a que outras pessoas têm acesso. Se nada disso adianta, a solução é simples: renunciar à internet, ao menos temporariamente: mais vale entrar no céu sem internet do que com a internet ser condenado eternamente. O mesmo vale para TV, filmes e coisas do gênero. É preciso lembrar-se sempre de que o mais oculto dos pecados são conhecidos por Deus e serão conhecidos por todos no dia do juízo. É preciso fugir das ocasiões de pecado. Como diz São Felipe Neri, na guerra contra esse vício, os vitoriosos são os covardes, quer dizer, aqueles que fogem das ocasiões de pecado.

Além da oração, da mortificação dos sentidos e da fuga das ocasiões, é preciso evitar a ociosidade. A ociosidade é mãe de inúmeros pecados, a começar pela impureza. O Rei Davi pecou cometendo adultério e homicídio porque em um momento de ociosidade olhou para a mulher do próximo.

É preciso também mortificar-se, fazendo penitências, jejuns, abstinência de carne. Devemos começar observando a penitência da sexta-feira imposta pela Igreja, procurando fazê-la do modo tradicional, quer dizer, nos abstendo de carne. As mortificações facilitam o domínio da razão e da vontade sobre as paixões. É preciso mortificar-se em coisas lícitas para aprender a vencer a si mesmo na hora da tentação. É preciso, de modo particular, ter muita sobriedade no beber álcool.

No combate pela castidade, é preciso se aproximar dos sacramentos com assiduidade. É preciso se confessar com frequência não só depois da queda, mas também para evitá-la. Aqueles que têm o vício da luxúria ou impureza devem procurar a confissão uma vez por semana, ou pelo menos uma vez a cada duas semanas. É preciso comungar com frequência, estando em estado de graça, para evitar quedas futuras. Com o método preventivo e não só curativo, se impede que o pecado lance raízes mais profundas.

É preciso também pensar no inferno, na condenação eterna que se merece por tão pouca coisa, por algo tão passageiro e instantâneo. Perde-se o céu, se merece o inferno, se crucifica NS novamente por pecado tão torpe. Usar dessa faculdade fora do matrimônio, nos assemelha aos animais brutos, irracionais. Como diz São Tomás, o impuro não vive segundo a razão. Portanto, é preciso pensar no inferno e na nossa morte, da qual não sabemos o dia nem a hora. Não devemos adiar nossa conversão. Pode ser que Deus não nos dê a graça da conversão depois. É preciso aproveitá-la agora.

Na hora da tentação propriamente dita, é preciso rezar, em particular invocando o nome de Jesus, Maria e José e pensar em outra coisa, distrair o pensamento com algo bom, lícito, ainda que sem importância, como enumerar as capitais dos estados, por exemplo. O importante é que ocupemos a imaginação e o pensamento com outra coisa. É preciso cortar a tentação imediatamente. Se cair, procurar levantar-se imediatamente, buscando a confissão com verdadeiro arrependimento e propósito de emenda. Existe uma tendência em desmoronar depois da primeira queda, cometendo outros pecados. Isso agrava muitíssimo as coisas, multiplicando os pecados, as penas, solidificando o mau hábito, dificultando tremendamente a conversão.

Quem tem o vício da impureza não deve desesperar, mas deve se apoiar em Deus, em Nossa Senhora, nos anjos e santos e aplicar os meios que mencionamos com muita determinação. Não basta um eu quisera, um eu gostaria. Não, tem que ser um eu quero firme, disposto a empregar os meios necessários para atingir o fim buscado, que é a pureza. Ao ser humano pode parecer impossível livrar-se de tal pecado uma vez que se contraiu o vício e, de fato, não é fácil. Mas com Deus é perfeitamente possível. Quem realmente quer se livrar desse vício e se apoia em Deus, consegue ter uma vida pura. Aqueles que não têm o vício devem continuar vigiando e orando, desconfiando de si, pois se acharem que estão imunes a tais pecados, cairão.

Combater pela pureza é necessário. Devemos fazê-lo com determinação e rezando muito. Diz Santo Agostinho que nessa espécie de pecado a batalha é onipresente, mas que a vitória é rara. Mas bem determinados, vigiando, rezando, empregando os meios que citamos, é plenamente possível. E que grande liberdade nos dá a castidade, que grande alegria viver segundo a razão e a fé.

Dirijo-me agora aos pais e aos que ajudam na educação das crianças. Os pais devem vigiar e favorecer a pureza dos filhos desde a mais tenra idade, para que adquiram a vergonha e a honestidade, para que sejam modestos no falar, nos modos, nas vestes… Cabe aos pais evitar que os filhos adquiram maus hábitos nesse campo, ainda que os filhos não entendam a malícia do que estão fazendo, pois depois não conseguirão se livrar do vício. Cuidado pais, cuidado com as crianças. Vejamos o que diz Pio XII: “Por desgraça, diz o Papa, às vezes acontece que pais cristãos com tantos cuidados na educação de um filho ou de uma filha, que são mantidos sempre longe dos perigosos prazeres e das más companhias, de repente vêem os filhos, com a idade de 18 ou 20 anos, vítimas de miseráveis e escandalosas quedas: o bom grão que semearam foi arruinado pela cizânia. Quem foi o inimigo do homem que fez tanto mal? O que ocorreu, continua o Papa, foi que no próprio lar, nesse pequeno paraíso, se introduziu furtivamente o tentador, o inimigo astuto, e encontrou ali o fruto corruptor para oferecer a mãos inocentes. Um livro deixado por acaso na mesa do pai foi o que destruiu no filho a fé de seu batismo, um romance abandonado no sofá ou no quarto pela mãe foi o que ofuscou na filha a pureza de sua primeira comunhão.” Até aqui o Papa. A cizânia pode entrar ao se folhearem revistas de notícias ou jornais largados na casa. A cizânia pode entrar pela televisão por um trecho do jornal televiso a que a criança assistiu por acaso. Vigiem, pais, vigiem pela alma dos filhos. Por favor, mantenham-nos longe da internet e de tablets e ipads, em que podem acessar verdadeiramente qualquer coisa. Eles já vêem tanta coisa ruim fora de casa. Que ao menos dentro dela eles possam encontrar a pureza e a virtude, a começar pelo exemplo dos pais.

De que vale ganhar o mundo inteiro se viermos a perder a nossa alma? De que vale uma satisfação instantânea, fugaz, e que nos faz perder o céu, merecer o inferno e que crucifica novamente NS? Confiando em Deus, desconfiando de nós mesmos, com uma determinação muito determinada, sejamos castos e puros conforme o nosso estado de vida.

Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo Amém.

Fonte: Missa Tridentina em Brasília

quinta-feira, 19 de novembro de 2015

Catecismo da Igreja Católica - O Sexto Mandamento

ARTIGO 6
O SEXTO MANDAMENTO
«Não cometerás adultério» (Ex 20, l4) (82).
«Ouvistes que foi dito: "Não cometerás adultério". Eu, porém, digo-vos: Todo aquele que olhar para uma mulher, desejando-a, já cometeu adultério com ela no seu coração» (Mt 5, 27-28).
I. «Homem e mulher os criou»...

2331. «Deus é amor e vive em Si mesmo um mistério de comunhão pessoal de amor. Ao criar a humanidade do homem e da mulher à sua imagem [...] Deus inscreveu nela a vocaçãopara o amor e para a comunhão e, portanto, a capacidade e a responsabilidade correspondentes» (83).
«Deus criou o homem à sua imagem; [...] homem e mulher os criou» (Gn 1, 27); «Crescei e multiplicai-vos» (Gn 1, 28); «Quando Deus criou o ser humano, fê-lo à semelhança de Deus. Criou-os homem e mulher e abençoou-os; e chamou-lhes «Adão» no dia em que os criou»(Gn 5, 1-2).

2332. A sexualidade afecta todos os aspectos da pessoa humana, na unidade do seu corpo e da sua alma. Diz respeito particularmente à afectividade, à capacidade de amar e de procriar, e, de um modo mais geral, à aptidão para criar laços de comunhão com outrem.

2333. Compete a cada um, homem e mulher, reconhecer e aceitar a sua identidade sexual. A diferença e a complementaridade físicas, morais e espirituais orientam-se para os bens do matrimónio e para o progresso da vida familiar. A harmonia do casal e da sociedade depende, em parte, da maneira como são vividos, entre os sexos, a complementaridade, a necessidade mútua e o apoio recíproco.

2334. «Ao criar o ser humano homem e mulher, Deus conferiu a dignidade pessoal, de igual modo ao homem e à mulher» (84). «O homem é uma pessoa; e isso na mesma medida para o homem e para a mulher, porque ambos são criados à imagem e semelhança dum Deus pessoal» (85).

2335. Cada um dos dois sexos é, com igual dignidade, embora de modo diferente, imagem do poder e da ternura de Deus. A união do homem e da mulher no matrimónio é um modo de imitar na carne a generosidade e a fecundidade do Criador: «O homem deixará o seu pai e a sua mãe para se unir à sua mulher; e os dois serão uma só carne» (Gn 2, 24). Desta união procedem todas as gerações humanas (86).

2336. Jesus veio restaurar a criação na pureza das suas origens. No sermão da montanha, interpreta de modo rigoroso o desígnio de Deus:
«Ouvistes que foi dito: "Não cometerás adultério". Eu, porém, digo-vos: Todo aquele que olhar para uma mulher, desejando-a, já cometeu adultério com ela no seu coração» (Mt 5, 27-28). Não separe o homem o que Deus uniu (87).
A Tradição da Igreja entendeu o sexto mandamento como englobando o conjunto da sexualidade humana.

II. A vocação à castidade

2337. A castidade significa a integração conseguida da sexualidade na pessoa, e daí a unidade interior do homem no seu ser corporal e espiritual. A sexualidade, na qual se exprime a pertença do homem ao mundo corporal e biológico, torna-se pessoal e verdadeiramente humana quando integrada na relação de pessoa a pessoa, no dom mútuo total e temporalmente ilimitado, do homem e da mulher.
A virtude da castidade engloba, portanto, a integridade da pessoa e a integralidade da doação.

A INTEGRIDADE DA PESSOA

2338. A pessoa casta mantém a integridade das forças de vida e de amor em si depositadas. Esta integridade garante a unidade da pessoa e opõe-se a qualquer comportamento susceptível de a ofender. Não tolera nem a duplicidade da vida, nem a da linguagem (88).

2339. A castidade implica uma aprendizagem do domínio de si, que é uma pedagogia da liberdade humana. A alternativa é clara: ou o homem comanda as suas paixões e alcança a paz, ou se deixa dominar por elas e torna-se infeliz (89). «A dignidade do homem exige que ele proceda segundo uma opção consciente e livre, isto é, movido e determinado por uma convicção pessoal e não sob a pressão de um cego impulso interior ou da mera coacção externa. O homem atinge esta dignidade quando, libertando-se de toda a escravidão das paixões, prossegue o seu fim na livre escolha do bem e se procura de modo eficaz e com diligente iniciativa os meios adequados» (90).

2340. Aquele que quiser permanecer fiel às promessas do seu Baptismo e resistir às tentações, terá o cuidado de procurar os meios: o conhecimento de si, a prática duma ascese adaptada às situações em que se encontra, a obediência aos mandamentos divinos, a prática das virtudes morais e a fidelidade à oração. «A continência, na verdade, recolhe-nos e reconduz-nos àquela unidade que tínhamos perdido, dispersando-nos na multiplicidade» (91).

2341. A virtude da castidade gira na órbita da virtude cardial da temperança, a qual visa impregnar de razão as paixões e os apetites da sensibilidade humana.

2342. O domínio de si é uma obra de grande fôlego. Nunca poderá considerar-se total e definitivamente adquirido. Implica um esforço constantemente retomado, em todas as idades da vida (92); mas o esforço requerido pode ser mais intenso em certas épocas, como quando se forma a personalidade, durante a infância e a adolescência.

2343. A castidade conhece leis de crescimento e passa por fases marcadas pela imperfeição, muitas vezes até pelo pecado. O homem virtuoso e casto «constrói-se dia a dia com as suas numerosas decisões livres. Por isso, conhece, ama e cumpre o bem moral segundo fases de crescimento» (93).

2344. A castidade representa uma tarefa eminentemente pessoal; implica também um esforço cultural, porque existe «interdependência entre o desenvolvimento da pessoa e o da própria sociedade» (94). A castidade pressupõe o respeito pelos direitos da pessoa, particularmente o de receber uma informação e educação que respeitem as dimensões morais e espirituais da vida humana.

2345. A castidade é uma virtude moral. Mas é também um dom de Deus, uma graça, um fruto do trabalho espiritual (95). O Espírito Santo concede a graça de imitar a pureza de Cristo (96) àquele que regenerou pela água do Baptismo.

A INTEGRALIDADE DO DOM DE SI

2346. A caridade é a forma de todas as virtudes. Sob a sua influência, a castidade aparece como uma escola de doação da pessoa. O domínio de si ordena-se para o dom de si. A castidade leva quem a pratica a tornar-se, junto do próximo, testemunha da fidelidade e da ternura de Deus.

2347. A virtude da castidade expande-se na amizade. Indica ao discípulo o modo de seguir e imitar Aquele que nos escolheu como seus próprios amigos (97), que Se deu totalmente a nós e nos faz participar da sua condição divina. A castidade é promessa de imortalidade.
A castidade exprime-se especialmente na amizade para com o próximo. Desenvolvida entre pessoas do mesmo sexo ou de sexos diferentes, a amizade representa um grande bem para todos. Conduz à comunhão espiritual.

OS DIVERSOS REGIMES DA CASTIDADE

2348. Todo o baptizado é chamado à castidade. O cristão «revestiu-se de Cristo» (98), modelo de toda a castidade. Todos os fiéis de Cristo são chamados a levar uma vida casta, segundo o seu estado de vida particular. No momento do seu Baptismo, o cristão comprometeu-se a orientar a sua afectividade na castidade.

2349. «A castidade deve qualificar as pessoas segundo os seus diferentes estados de vida: uns, na virgindade ou celibato consagrado, forma eminente de se entregarem mais facilmente a Deus com um coração indiviso: outros, do modo que a lei moral para todos determina, e conforme são casados ou solteiros» (99). As pessoas casadas são chamadas a viver a castidade conjugal; as outras praticam a castidade na continência:
«Existem três formas da virtude da castidade: uma, das esposas: outra, das viúvas; a terceira, da virgindade. Não louvamos uma com exclusão das outras. [...] É nisso que a disciplina da Igreja é rica» (100).
2350. Os noivos são chamados a viver a castidade na continência. Eles farão, neste tempo de prova, a descoberta do respeito mútuo, a aprendizagem da fidelidade e da esperança de se receberem um ao outro de Deus. Reservarão para o tempo do matrimónio as manifestações de ternura específicas do amor conjugal. Ajudar-se-ão mutuamente a crescer na castidade.

AS OFENSAS À CASTIDADE

2351. A luxúria é um desejo desordenado ou um gozo desregrado de prazer venéreo. O prazer sexual é moralmente desordenado quando procurado por si mesmo, isolado das finalidades da procriação e da união.

2352. Por masturbação entende-se a excitação voluntária dos órgão genitais, para daí retirar um prazer venéreo. «Na linha duma tradição constante, tanto o Magistério da Igreja como o sentido moral dos fiéis têm afirmado sem hesitação que a masturbação é um acto intrínseca e gravemente desordenado». «Seja qual for o motivo, o uso deliberado da faculdade sexual fora das normais relações conjugais contradiz a finalidade da mesma». O prazer sexual é ali procurado fora da «relação sexual requerida pela ordem moral, que é aquela que realiza, no contexto dum amor verdadeiro, o sentido integral da doação mútua e da procriação humana» (101).
Para formar um juízo justo sobre a responsabilidade moral dos sujeitos, e para orientar a acção pastoral, deverá ter-se em conta a imaturidade afectiva, a força de hábitos contraídos, o estado de angústia e outros factores psíquicos ou sociais que podem atenuar, ou até reduzir ao mínimo, a culpabilidade moral.

2353. A fornicação é a união carnal fora do matrimónio entre um homem e uma mulher livres. É gravemente contrária à dignidade das pessoas e da sexualidade humana, naturalmente ordenada para o bem dos esposos, assim como para a geração e educação dos filhos. Além disso, é um escândalo grave, quando há corrupção dos jovens.

2354. A pornografia consiste em retirar os actos sexuais, reais ou simulados, da intimidade dos parceiros, para os exibir a terceiras pessoas, de modo deliberado. Ofende a castidade, porque desnatura o acto conjugal, doação íntima dos esposos um ao outro. É um grave atentado contra a dignidade das pessoas intervenientes (actores, comerciantes, público), uma vez que cada um se torna para o outro objecto dum prazer vulgar e dum lucro ilícito. E faz mergulhar uns e outros na ilusão dum mundo fictício. É pecado grave. As autoridades civis devem impedir a produção e a distribuição de material pornográfico.

2355. A prostituição é um atentado contra a dignidade da pessoa que se prostitui, reduzida ao prazer venéreo que dela se tira. Quem paga, peca gravemente contra si mesmo: quebra a castidade a que o obriga o seu Baptismo e mancha o seu corpo, que é templo do Espírito Santo (102). A prostituição constitui um flagelo social. Envolve habitualmente mulheres, mas também homens, crianças ou adolescentes (nestes dois últimos casos, o pecado duplica com o escândalo). É sempre gravemente pecaminoso entregar-se à prostituição; mas a miséria, a chantagem e a pressão social podem atenuar a imputabilidade do pecado.

2356. A violação designa a entrada na intimidade sexual duma pessoa à força, com violência. É um atentado contra a justiça e a caridade. A violação ofende profundamente o direito de cada um ao respeito, à liberdade e à integridade física e moral. Causa um prejuízo grave, que pode marcar a vítima para toda a vida. É sempre um acto intrinsecamente mau. É mais grave ainda, se cometido por parentes próximos (incesto) ou por educadores contra crianças a eles confiadas.

CASTIDADE E HOMOSSEXUALIDADE

2357 A homossexualidade designa as relações entre homens ou mulheres, que experimentam uma atracção sexual exclusiva ou predominante para pessoas do mesmo sexo. Tem-se revestido de formas muito variadas, através dos séculos e das culturas. A sua génese psíquica continua em grande parte por explicar. Apoiando-se na Sagrada Escritura, que os apresenta como depravações graves (103) a Tradição sempre declarou que «os actos de homossexualidade são intrinsecamente desordenados» (104). São contrários à lei natural, fecham o acto sexual ao dom da vida, não procedem duma verdadeira complementaridade afectiva sexual, não podem, em caso algum, ser aprovados.

2358. Um número considerável de homens e de mulheres apresenta tendências homossexuais profundamente radicadas. Esta propensão, objectivamente desordenada, constitui, para a maior parte deles, uma provação. Devem ser acolhidos com respeito, compaixão e delicadeza. Evitar-se-á, em relação a eles, qualquer sinal de discriminação injusta. Estas pessoas são chamadas a realizar na sua vida a vontade de Deus e, se forem cristãs, a unir ao sacrifício da cruz do Senhor as dificuldades que podem encontrar devido à sua condição.

2359. As pessoas homossexuais são chamadas à castidade. Pelas virtudes do autodomínio, educadoras da liberdade interior, e, às vezes, pelo apoio duma amizade desinteressada, pela oração e pela graça sacramental, podem e devem aproximar-se, gradual e resolutamente, da perfeição cristã.

III. O amor dos esposos

2360. A sexualidade ordena-se para o amor conjugal do homem e da mulher. No matrimónio, a intimidade corporal dos esposos torna-se sinal e penhor de comunhão espiritual. Entre os baptizados, os laços do matrimónio são santificados pelo sacramento.
2361. «A sexualidade, mediante a qual o homem e a mulher se dão um ao outro com os actos próprios e exclusivos dos esposos, não é algo de puramente biológico, mas diz respeito à pessoa humana como tal, no que ela tem de mais íntimo. Esta só se realiza de maneira verdadeiramente humana se for parte integrante do amor com o qual homem e mulher se comprometem totalmente um para com o outro até à morte» (105).
«Tobias ergueu-se do leito e disse [...] [a Sara]: "Irmã, levanta-te; vamos orar ao Senhor e pedir-lhe que nos conceda a sua misericórdia e salvação". Levantaram-se ambos e puseram-se a orar e a implorar que lhes fosse enviada a salvação, dizendo: "Bendito sejas, Deus dos nossos pais [...]. Tu criaste Adão e deste-lhe Eva, sua esposa, como amparo valioso, e de ambos procedeu o género humano. Com efeito, disseste: 'Não é bom que o homem esteja só; façamos-lhe uma auxiliar semelhante a ele'. Agora, Senhor, Tu bem sabes que não é por luxúria que agora tomo por esposa esta minha irmã, mas é com intenção pura. Permite, pois, que eu e ela encontremos misericórdia e cheguemos juntos à velhice» (Tb8, 4-9).
2362. «Os actos pelos quais os esposos se unem íntima e castamente são honestos e dignos; realizados de modo autenticamente humano, exprimem e alimentam a mútua entrega pela qual se enriquecem um ao outro com alegria e gratidão» (106). A sexualidade é fonte de alegria e de prazer:
«Foi o próprio Criador Quem [...] estabeleceu que, nesta função [da geração], os esposos experimentassem prazer e satisfação do corpo e do espírito. Portanto, os esposos não fazem nada de mal ao procurar este prazer e gozar dele. Aceitam o que o Criador lhes destinou. No entanto, devem saber manter-se dentro dos limites duma justa moderação» (107).
 2363. Pela união dos esposos realiza-se o duplo fim do matrimónio: o bem dos próprios esposos e a transmissão da vida. Não podem separar-se estes dois significados ou valores do matrimónio sem alterar a vida espiritual do casal nem comprometer os bens do matrimónio e o futuro da família.
O amor conjugal do homem e da mulher está, assim, colocado sob a dupla exigência da fidelidade e da fecundidade.

A FIDELIDADE CONJUGAL

2364. Ambos os esposos constituem «uma íntima comunidade de vida e de amor, fundada pelo Criador e por Ele dotada de leis próprias». Esta comunidade «é instaurada pela aliança conjugal, ou seja, por um irrevogável consentimento pessoal» (108). Os dois entregam-se, definitiva e totalmente, um ao outro. Doravante, já não são dois, mas uma só carne. A aliança livremente contraída pelos esposos impõe-lhes a obrigação de a manter una e indissolúvel (109). «O que Deus uniu, não o separe o homem»(Mc 10, 9) (110).

2365. A fidelidade exprime a constância em manter a palavra dada. Deus é fiel. O sacramento do matrimónio introduz o homem e a mulher na fidelidade de Cristo à sua Igreja. Pela castidade conjugal, eles dão testemunho deste mistério perante o mundo.
São João Crisóstomo sugere aos jovens casados que façam este discurso às suas esposas: «Tomei-te nos meus braços, amo-te e prefiro-te à minha própria vida. Porque a vida presente não é nada e o meu sonho mais ardente é passá-la contigo, de tal maneira que tenhamos a certeza de não ser separados naquela que nos está reservada [...]. Eu ponho o teu amor acima de tudo, e nada me seria mais penoso do que não ter os mesmos pensamentos que tu» (111).
A FECUNDIDADE DO MATRIMÓNIO

2366. A fecundidade é um dom, uma finalidade do matrimónio, porque o amor conjugal tende naturalmente a ser fecundo. O filho não vem de fora juntar-se ao amor mútuo dos esposos; surge no próprio coração deste dom mútuo, do qual é fruto e complemento. Por isso, a Igreja, que «toma partido pela vida» (112), ensina que «todo o acto matrimonial deve, por si estar aberto à transmissão da vida» (113). «Esta doutrina, muitas vezes exposta pelo Magistério, funda-se sobre o nexo indissolúvel estabelecido por Deus e que o homem não pode quebrar por sua iniciativa, entre os dois significados inerentes ao acto conjugal: união e procriação» (114).

2367. Chamados a dar a vida, os esposos participam do poder criador e da paternidade de Deus (115). «No dever de transmitir e educar a vida humana – dever que deve ser considerado como a sua missão própria – saibam os esposos que são cooperadores do amor de Deus e como que os seus intérpretes. Cumprirão, pois, esta missão, com responsabilidade humana e cristã» (116).

2368. Um aspecto particular desta responsabilidade diz respeito à regulação da procriação.Os esposos podem querer espaçar o nascimento dos seus filhos por razões justificadas (117). Devem, porém, verificar se tal desejo não procede do egoísmo, e se está de acordo com a justa generosidade duma paternidade responsável. Além disso, regularão o seu comportamento segundo os critérios objectivos da moralidade:
«Quando se trata de conciliar o amor conjugal com a transmissão responsável da vida, a moralidade do comportamento não depende apenas da sinceridade da intenção e da apreciação dos motivos; deve também determinar-se por critérios objectivos, tomados da natureza da pessoa e dos seus actos; critérios que respeitem, num contexto de autêntico amor, o sentido da mútua doação e da procriação humana. Tudo isto só é possível, se se cultivar sinceramente a virtude da castidade conjugal» (118).
2369. «É salvaguardando estes dois aspectos essenciais, união e procriação, que o acto conjugal conserva integralmente o sentido de mútuo e verdadeiro amor e a sua ordenação para a altíssima vocação do homem para a paternidade» (119).

2370. A continência periódica, os métodos de regulação dos nascimentos baseados na auto-observação e no recurso aos períodos infecundos (120), são conformes aos critérios objectivos da moralidade. Estes métodos respeitam o corpo dos esposos, estimulam a ternura entre eles e favorecem a educação duma liberdade autêntica. Em contrapartida, é intrinsecamente má «qualquer acção que, quer em previsão do acto conjugal, quer durante a sua realização, quer no desenrolar das suas consequências naturais, se proponha, como fim ou como meio, tornar impossível a procriação» (121).
«À linguagem que exprime naturalmente a doação recíproca e total dos esposos, a contracepção opõe uma linguagem objectivamente contraditória, segundo a qual já não se trata de se darem totalmente um ao outro. Daí deriva, não somente a recusa positiva da abertura à vida, mas também uma falsificação da verdade interna do amor conjugal, chamado a ser um dom da pessoa toda. [...] Esta diferença antropológica e moral, entre a contracepção e o recurso aos ritmos periódicos, implica dois conceitos de pessoa e de sexualidade humana irredutíveis um ao outro» (122).
2371. «Aliás, todos devem ter bem presente que a vida humana e a missão de a transmitir não se limitam aos horizontes deste mundo, nem podem ser medidas ou compreendidas unicamente em função dele, mas estão sempre relacionadas com o destino eterno do homem» (123).

2372. O Estado é responsável pelo bem-estar dos cidadãos. A tal título, é legítimo que intervenha para orientar o crescimento da população. Pode fazê-lo mediante uma informação objectiva e respeitosa, não porém com imposições autoritárias e obrigatórias. O Estado não pode legitimamente substituir-se à iniciativa dos esposos, primeiros responsáveis pela procriação e educação dos seus filhos (124). Neste domínio, não tem autoridade para intervir com medidas contrárias à lei moral.

O DOM DO FILHO

2373. A Sagrada Escritura e a prática tradicional da Igreja vêem nas famílias numerosas um sinal da bênção divina e da generosidade dos pais (125).

2374. É grande o sofrimento dos casais que descobrem que são estéreis. «Que me dareis, Senhor Deus?» – pergunta Abraão a Deus. «Vou-me sem filhos...» (Gn 15, 2). – «Dá-me filhos ou então morro!» – grita Raquel ao seu marido Jacob (Gn 30, 1).

2375. As pesquisas que se destinam a reduzir a esterilidade humana devem ser encorajadas, com a condição de serem colocadas «ao serviço da pessoa humana, dos seus direitos inalienáveis e do seu bem verdadeiro e integral, em conformidade com o projecto e a vontade de Deus» (126).

2376. As técnicas que provocam a dissociação dos progenitores pela intervenção duma pessoa estranha ao casal (dádiva de esperma ou ovócito, empréstimo de útero) são gravemente desonestas. Estas técnicas (inseminação e fecundação artificial heteróloga) lesam o direito do filho a nascer dum pai e duma mãe seus conhecidos e unidos entre si pelo casamento. E atraiçoam «o direito exclusivo a não serem nem pai nem mãe senão um pelo outro» (127).

2377. Praticadas no seio do casal, estas técnicas (inseminação e fecundação artificial homóloga) são talvez menos prejudiciais, mas continuam moralmente inaceitáveis. Dissociam o acto sexual do acto procriador. O acto fundador da existência do filho deixa de ser um acto pelo qual duas pessoas se dão uma à outra, e «remete a vida e a identidade do embrião para o poder dos médicos e biólogos. Instaurando o domínio da técnica sobre a origem e destino da pessoa humana. Tal relação de domínio é, de si, contrária à dignidade e à igualdade que devem ser comuns aos pais e aos filhos» (128). «A procriação é moralmente privada da sua perfeição própria, quando não é querida como fruto do acto conjugal, isto é, do gesto específico da união dos esposos. [...] Só o respeito pelo laço que existe entre os significados do acto conjugal e o respeito pela unidade do ser humano permite uma procriação conforme à dignidade da pessoa» (129).

2378O filho não é uma dívida, é uma dádiva. O «dom mais excelente do matrimónio» é uma pessoa humana. O filho não pode ser considerado como objecto de propriedade, conclusão a que levaria o reconhecimento dum pretenso «direito ao filho». Neste domínio, só o filho é que possui verdadeiros direitos: o de «ser fruto do acto específico do amor conjugal dos seus pais, e também o de ser respeitado como pessoa desde o momento da sua concepção» (130).

2379. O Evangelho mostra que a esterilidade física não é um mal absoluto. Os esposos que, depois de esgotados os recursos médicos legítimos, sofrem de infertilidade, associar-se-ão à cruz do Senhor, fonte de toda a fecundidade espiritual. Podem mostrar a sua generosidade adoptando crianças abandonadas ou realizando serviços significativos em favor do próximo.

IV. As ofensas à dignidade do matrimónio

2380. O adultério. É o termo que designa a infidelidade conjugal. Quando dois parceiros, dos quais pelo menos um é casado, estabelecem entre si uma relação sexual, mesmo efémera, cometem adultério. Cristo condena o adultério, mesmo de simples desejo (131). O sexto mandamento e o Novo Testamento proíbem absolutamente o adultério (132). Os profetas denunciam-lhe a gravidade. E vêem no adultério a figura do pecado da idolatria (133).

2381. O adultério é uma injustiça. Aquele que o comete, falta aos seus compromissos. Viola o sinal da Aliança, que é o vínculo matrimonial, lesa o direito do outro cônjuge e atenta contra a instituição do matrimónio, violando o contrato em que assenta. Compromete o bem da geração humana e dos filhos que têm necessidade da união estável dos pais.

O DIVÓRCIO

2382. O Senhor Jesus insistiu na intenção original do Criador, que queria um matrimónio indissolúvel (134). E abrogou as tolerâncias que se tinham infiltrado na antiga Lei (135).
Entre baptizados, «o matrimónio rato e consumado não pode ser dissolvido por nenhum poder humano, nem por nenhuma causa, além da morte» (136).

2383. A separação dos esposos, permanecendo o vínculo matrimonial, pode ser legítima em certos casos previstos pelo direito canónico (137).
Se o divórcio civil for a única maneira possível de garantir certos direitos legítimos, tais como o cuidado dos filhos ou a defesa do património, pode ser tolerado sem constituir falta moral.

2384. O divórcio é uma ofensa grave à lei natural. Pretende romper o contrato livremente aceite pelos esposos de viverem um com o outro até à morte. O divórcio é uma injúria contra a aliança da salvação, de que o matrimónio sacramental é sinal. O facto de se contrair nova união, embora reconhecida pela lei civil, aumenta a gravidade da ruptura: o cônjuge casado outra vez encontra-se numa situação de adultério público e permanente:
«Não é lícito ao homem, despedida a esposa, casar com outra; nem é legítimo que outro tome como esposa a que foi repudiada pelo marido»(138).
2385. O carácter imoral do divórcio advém-lhe também da desordem que introduz na célula familiar e na sociedade. Esta desordem traz consigo prejuízos graves: para o cônjuge que fica abandonado; para os filhos, traumatizados pela separação dos pais e, muitas vezes, objecto de contenda entre eles; e pelo seu efeito de contágio, que faz dele uma verdadeira praga social.

2386. Pode acontecer que um dos cônjuges seja a vítima inocente do divórcio declarado pela lei civil; esse, então, não viola o preceito moral. Há uma grande diferença entre o cônjuge que sinceramente se esforçou por ser fiel ao sacramento do matrimónio e se vê injustamente abandonado, e aquele que, por uma falta grave da sua parte, destrói um matrimónio canonicamente válido (139).

OUTRAS OFENSAS À DIGNIDADE DO MATRIMÓNIO

2387. É compreensível o drama daquele que, desejoso de se converter ao Evangelho, se vê obrigado a repudiar uma ou mais mulheres com quem partilhou anos de vida conjugal. Contudo, a poligamia não está de acordo com a lei moral. «Opõe-se radicalmente à comunhão conjugal: porque nega, de modo directo, o desígnio de Deus, tal como nos foi revelado no princípio e é contrária à igual dignidade pessoal da mulher e do homem, os quais, no matrimónio, se dão um ao outro num amor total que, por isso mesmo, é único e exclusivo»(140). O cristão que anteriormente foi polígamo é gravemente obrigado, por justiça, a honrar as obrigações contraídas para com as suas antigas mulheres e respectivos filhos.

2388. O incesto designa relações íntimas entre parentes ou afins, num grau que proíbe o matrimónio entre eles (141). São Paulo estigmatiza esta falta particularmente grave: «É voz corrente que existe entre vós um caso de imoralidade [...] ao ponto de certo homem viver com a mulher de seu pai! [...] Em nome do Senhor Jesus [...], que esse homem seja entregue a Satanás [...] para ruína do seu corpo» (1 Cor 5, 1. 4-5). O incesto corrompe as relações familiares e representa uma regressão à animalidade.

2389. Podem relacionar-se com o incesto os abusos sexuais cometidos por adultos em relação a crianças ou adolescentes confiados à sua guarda. Nesse caso a culpa é dupla por se tratar dum escandaloso atentado contra a integridade física e moral dos jovens, que assim ficarão marcados para toda a sua vida e duma violação da responsabilidade educativa.

2390.  união livre quando homem e mulher recusam dar forma jurídica e pública a uma ligação que implica intimidade sexual.
A expressão é falaciosa: que pode significar uma união em que as pessoas não se comprometem uma para com a outra, testemunhando assim uma falta de confiança na outra, em si mesmas, ou no futuro?
A expressão tenta camuflar situações diferentes: concubinato, recusado matrimónio como tal, incapacidade de se ligar por compromissos a longo prazo (142). Todas estas situações ofendem a dignidade do matrimónio; destroem a própria ideia de família; enfraquecem o sentido da fidelidade. São contrárias à lei moral: o acto sexual deve ter lugar exclusivamente no matrimónio; fora dele constitui sempre um pecado grave e exclui da comunhão sacramental.

2391. Hoje em dia, há muitos que reclamam uma espécie de «direito à experiência», quando há intenção de contrair matrimónio. Seja qual for a firmeza do propósito daqueles que enveredam por relações sexuais prematuras, «estas não permitem assegurar que a sinceridade e a fidelidade da relação interpessoal dum homem e duma mulher fiquem a salvo nem, sobretudo, que esta relação fique protegida de volubilidade dos desejos e dos caprichos»(143). A união carnal só é legítima quando se tiver instaurado uma definitiva comunidade de vida entre o homem e a mulher. O amor humano não tolera o «ensaio». Exige o dom total e definitivo das pessoas entre si (144).

Resumindo:

2392. «O amor é a vocação fundamental e inata de todo o ser humano» (145).
2393. Ao criar o ser humano homem e mulher, Deus conferiu a dignidade pessoal, de igual modo, a um e a outra. Compete a cada um, homem e mulher, reconhecer e aceitar a sua identidade sexual.
2394. Cristo é o modelo da castidade. Todo o baptizado é chamado a levar uma vida casta, cada um segundo o seu próprio estado de vida.
2395. A castidade significa a integração da sexualidade na pessoa. Implica a aprendizagem do autodomínio.
2396. Entre os pecados gravemente contrários à castidade, devem citar-se: a masturbação, a fornicação, a pornografia e as práticas homossexuais.
2397. A aliança livremente contraída pelos esposos implica um amor fiel. Ele impõe-lhes a obrigação de guardar indissolúvel o seu matrimónio.
2398. A fecundidade é um bem, um dom, uma finalidade do matrimónio. Dando a vida, os esposos participam da paternidade de Deus.
2399. A regulação dos nascimentos representa um dos aspectos da paternidade e da maternidade responsáveis. A legitimidade das intenções dos esposos não justifica o recurso a meios moralmente inadmissíveis (por exemplo, a esterilização directa ou a contracepção).
2400. O adultério e o divórcio, a poligamia e a união livre são ofensas graves à dignidade do matrimónio.

Fonte:Vatican,va

sexta-feira, 29 de maio de 2015

Domínio de si mesmo (Humanae Vitae, Papa Paulo VI)



“Uma prática honesta da regulação da natalidade exige, acima de tudo, que os esposos adquiram sólidas convicções acerca dos valores da vida e da família e que tendam a alcançar um perfeito domínio de si mesmos. O domínio do instinto, mediante a razão e a vontade livre, impõe, indubitavelmente, uma ascese, para que as manifestações afetivas da vida conjugal sejam conformes com a ordem reta e, em particular, concretiza-se essa ascese na observância da continência periódica. Mas, esta disciplina, própria da pureza dos esposos, longe de ser nociva ao amor conjugal, confere-lhe pelo contrário um valor humano bem mais elevado. Requer um esforço contínuo, mas, graças ao seu benéfico influxo, os cônjuges desenvolvem integralmente a sua personalidade, enriquecendo-se de valores espirituais: ela acarreta à vida familiar frutos de serenidade e de paz e facilita a solução de outros problemas; favorece as atenções dos cônjuges, um para com o outro, ajuda-os a extirpar o egoísmo, inimigo do verdadeiro amor e enraíza-os no seu sentido de responsabilidade no cumprimento de seus deveres. Além disso, os pais adquirem com ela a capacidade de uma influência mais profunda e eficaz para educarem os filhos; as crianças e a juventude crescem numa estima exata dos valores humanos e num desenvolvimento sereno e harmônico das suas faculdades espirituais e sensitivas.”

(Papa Paulo VI, “Humanae Vitae”, 25 de julho de 1968)

Créditos: O Camponês

sábado, 18 de abril de 2015

A tatuagem e sua moralidade - Padre Daniel Pinheiro


A tatuagem e sua moralidade

Padre Daniel Pinheiro, IBP

Vemos em nossos tempos um número cada vez maior de tatuagens em diversos tipos de ambientes. É preciso dizer algo, ainda que brevemente, quanto à moralidade delas.

Alguns afirmam não haver problema com tatuagens em nossos dias atuais e que o preceito dado no Antigo Testamento (Levítico XIX, 28: “Não fareis incisões na vossa carne, por causa de algum morto, nem fareis figuras algumas ou sinais sobre o vosso corpo. Eu sou o Senhor.”) com relação a isso era válido unicamente pelo fato de ela favorecer o paganismo naquele contexto. A tatuagem era coisa de pagãos. Assim, o povo judeu era o único povo monoteísta, rodeado de pagãos e, para ser preservado na crença em um só Deus, o Senhor deu-lhe vários preceitos circunstanciais. Entre eles, a não utilização de tatuagem, que poderia favorecer a infidelidade do povo israelita naquele contexto. Portanto, a proibição da tatuagem não era a proibição da tatuagem em si, mas a proibição em virtude das circunstâncias. Continuam o argumento dizendo que essas circunstâncias já não existem e, consequentemente, a tatuagem pode ser lícita. Em geral, é esse o raciocínio que se faz em favor da tatuagem. É preciso fazer, diante disso, duas perguntas: (1) as circunstâncias que existiam na época e que proibiam a tatuagem realmente não existem mais? (2) a tatuagem é lícita sem uma causa proporcional que a justifique?

(1) Parece-nos claro que a mesma razão que proibia a tatuagem no Antigo Testamento continua sendo válida hoje. A associação com o paganismo da época passada é substituída pela associação com o neo-paganismo reinante em nossos dias, pela cultura de revolta e de rebelião contra a ordem natural e sobrenatural. Não se deve considerar como um puro acaso que a tatuagem tenha se difundido e se difunda justamente no momento em que o catolicismo recua e que uma nova ordem, independente de Cristo ,se estabelece. Essa nova ordem tem uma concepção altamente errônea do corpo, colocando-o irracionalmente acima da alma (hedonismo) ao mesmo tempo em que o despreza (donde a cremação e as tatuagens). Aqueles que defendem que se pode fazer a tatuagem hoje simplesmente porque já estamos no Novo Testamento, sob a lei da graça, adotam uma postura que poderíamos chamar de essencialista. Dizem: se algo não é intrinsecamente mau, se não é essencialmente mau, se não é em si proibido, podemos fazer, pois estamos na Nova Aliança, não precisamos nos preocupar com esses detalhes, pois Cristo nos liberou deles. É a tese de que, se não é pecado em si, pode-se fazer. Ora, para se julgar da moralidade de um ato humano, é preciso levar também em conta as circunstâncias, mesmo no Novo testamento, como é evidente. É preciso levar em conta as circunstâncias, sem cair, porém em uma espécie de existencialismo, sem cair na moral de situação, em que só se consideram as circunstâncias sem considerar o ato em si. São Paulo, para resolver a questão da carne oferecida aos ídolos, por exemplo, considera justamente as circunstâncias. A carne oferecida aos ídolos não é em si má, pode-se comê-la, a princípio. Todavia, pela circunstância do possível escândalo gerado para os fracos, não se deve comê-la, se o escândalo for previsível. Em um ato humano, portanto, é preciso considerar o ato em si, a finalidade e ascircunstâncias. Para que um ato seja bom, ele precisa ser integralmente bom – bonum ex integra causa. Assim, o ato para ser moralmente bom precisa ser bom em si mesmo ou indiferente, precisa ser feito conforme as circunstâncias o pedem e o agente deve ter uma boa finalidade. Se há um defeito em um dos três aspectos, o ato já não pode ser classificado como bom, pois basta um só defeito para que o ato seja mau – malum ex quocumque defectu. No tempo presente, é relativamente claro que as circunstâncias ainda militam fortemente contra a tatuagem, pois está muito associada a uma revolta contra o real, contra a ordem estabelecida, contra os superiores, portanto contra Deus. Ela está associada a uma mentalidade neo-pagã, sendo fruto dela e conduzindo a ela.

(2) Além disso, e independente das circunstâncias, a tatuagem marca o corpo praticamente de forma indelével, o que constitui um tipo de mutilação. Ora, a mutilação só é lícita se há causa proporcionalmente grave. Assim, só podemos mutilar uma parte de nosso corpo em vista do bem do todo, pois o homem não tem um domínio completo sobre o seu próprio corpo. É importante compreender que o homem não tem um domínio completo sobre o seu corpo: o homem só pode dispor de seu corpo para os usos determinados por Deus através da própria natureza do homem. Essa ausência de domínio absoluto sobre o próprio corpo destrói até mesmo o absurdo argumento das feministas, que querem o aborto porque pretendem fazer o que quiserem com o próprio corpo. A finalidade proposta pela tatuagem não é, evidentemente, o bem do todo, nem outro bem proporcional à mutilação causada pela tatuagem. Quem se tatua, normalmente o faz por vaidade, para ser visto pelos outros, para chocar, para mostrar uma pretensa força, etc. Todos esses motivos são motivos desordenados, o que torna a tatuagem pecaminosa (gravemente ou venialmente, dependendo do tamanho, do tema, do local em que é feita, do grau de malícia da intenção). O mesmo, porém, não se pode dizer de brincos usados segundo o costume recebido, pois eles são usados como adereço feminino, que distingue a mulher do homem e corresponde à inclinação natural da mulher de se ornar, desde que com moderação.

Na prática:

(a) Se a tatuagem é uma imagem ou frase diabólica, esotérica, ou que envolve símbolos de falsas religiões, vai contra o 1º mandamento, contra a virtude de religião. Se a tatuagem é simplesmente feia ou de mau gosto, ela é umaexaltação da feiura, se opondo a Deus, infinitamente belo. Promover e se alegrar com o feio se opõe à ordem natural e é promover o reino do demônio.

(b) Se a tatuagem for de um símbolo religioso, como uma Cruz ou Nossa Senhora, por exemplo, é um pecado de irreverência, contrário, portanto, ao 2º mandamento, à virtude de religião.

(c) Se o objetivo for repelir, intimidar, chocar os outros, ela se opõe à caridade fraterna, ao 5º mandamento.

(d) Se o objetivo for se opor aos superiores, ao pais, à ordem, etc., se opõe ao 4º mandamento, isto é, à virtude de piedade.

(e) Se for por vaidade, isto é, para chamar a atenção dos outros, para exaltar alguma qualidade, é contra a humildade. Opõe-se também à modéstia chamando demasiadamente atenção ao exterior da pessoa.

(f) Se a tatuagem for de algo indecente ou impuro, ou de uma frase indecente ou impura, se opõe ao sexto mandamento. Ela pode se opor ao 6º mandamento também pela sua localização ou por dirigir olhares para partes menos honestas.

Em suma, é quase impossível haver uma causa proporcional para justificar uma tatuagem em nossa civilização. A pele humana não é uma tela. Foi criada com outra finalidade: servir a Deus sendo ordenado pela alma. Raciocínio análogo se aplica a piercings e coisas semelhantes.

Se uma tatuagem é gravemente pecaminosa, por exemplo, opondo-se ao primeiro mandamento ou ao sexto, a obrigação de tirá-la é grave. Também a sua visibilidade pelas outras pessoas aumenta a necessidade de tirá-la. Se ela for levemente pecaminosa, a obrigação é leve.

Todavia, há cristãos que já há muito tempo (desde a Idade Média, ao menos) fazem tatuagens, que são os coptas. Aparentemente, começaram a fazê-lo para se protegerem contra o Islã. Tanto para dificultar a apostasia – pois tendo a tatuagem não poderão negar que são cristãos – quanto para poderem ser identificados pelos outros cristãos, se forem sequestrados ou assassinados. Nesse caso, há uma causa proporcionalmente grave para se fazer a tatuagem. Normalmente, esses cristãos fazem uma pequena cruz no punho ou na mão.

Há também o caso de Santa Joana de Chantal, que marcou o Santo Nome de Jesus com ferro incandescente em seu coração. Ora, a santa fez isso por moção divina, o que torna a ação lícita, já que Deus tem o domínio absoluto sobre o nosso corpo. Ela não o fez por simples veleidade, mas por inspiração divina.

Portanto, as circunstâncias – associação com o paganismo – que existiam à época dos judeus e que levaram à proibição da tatuagem continuam bem presentes em nossa sociedade neo-paganizada, com uma concepção não cristã do corpo. E a tatuagem não é intrinsecamente má, mas seria preciso uma causa proporcionalmente grave para fazê-la sem pecado. Não encontramos essas causas em nossa sociedade. A vaidade, o desejo de chamar a atenção, de estar na moda, de fazer como todos fazem, ou de mostrar algo que temos, somos, ou pensamos, não são causas que justifiquem a tatuagem. Encontrar nessas causas uma justificativa para a tatuagem é tornar-se um católico mundano.

É preciso se revestir de Cristo, de sua graça e virtudes e não de tatuagens, que são indício de barbárie e de corrupção da reta razão.

Pode-se ler com proveito:

Padre James Jackson, FSSP :

http://www.thinkinghousewife.com/wp/2011/04/on-the-morality-of-tattoos/

Padre Peter Joseph, professor de Seminário:

http://www.latinmassmagazine.com/articles/articles_2002_SU_Joseph.html

Pe Daniel Pinheiro

Créditos: Scutum Fidei

sábado, 17 de janeiro de 2015

Carta Encíclica Sacerdotalis Caelibatus - Papa Paulo VI



CARTA ENCÍCLICA
SACERDOTALIS CAELIBATUS
DE SUA SANTIDADE O
PAPA PAULO VI 
AOS BISPOS, AOS IRMÃOS
NO SACERDÓCIO
E AOS FIÉIS DE TODO
O MUNDO CATÓLICO

SOBRE O CELIBATO SACERDOTAL



Veneráveis Irmãos e diletos filhos
saúde e bênção apostólica

O celibato consagrado nos dias de hoje

1. O celibato sacerdotal, que a Igreja guarda desde há séculos como brilhante pedra preciosa, conserva todo o seu valor mesmo nos nossos tempos, caracterizados por transformação profunda na mentalidade e nas estruturas.

Mas no clima atual de novos fermentos, manifestou-se também a tendência, e até a vontade expressa, de pedir à Igreja que torne a examinar esta sua instituição característica, cuja observância, segundo alguns, se tornou problemática e quase impossível no nosso tempo e no nosso mundo.

Uma promessa

2. Este estado de coisas, que agita a consciência e provoca perplexidades nalguns sacerdotes e jovens aspirantes ao sacerdócio, e atemoriza muitos fiéis, obriga-nos a não dilatar o cumprimento da promessa, feita aos Veneráveis Padres do Concílio, a quem declaramos o nosso propósito de imprimir novo lustre e novo vigor ao celibato sacerdotal nas circunstâncias atuais. [1] Desde então, invocamos longa e ardentemente as necessárias luzes e auxílios do Espírito Santo e examinamos diante de Deus os pareceres e solicitações que de toda a parte chegaram às nossas mãos, sobretudo de vários Pastores da Igreja de Deus.

Amplitude e gravidade da questão

3. A importante questão do celibato do Clero, na Igreja, foi-se apresentando demoradamente ao nosso espírito em toda a sua amplidão e gravidade. Deve ainda hoje subsistir essa severa e transcendente obrigação para aqueles que desejam receber as sacras ordens maiores? Será hoje possível e conveniente a observância de tal obrigação? Não terá chegado o momento de quebrar o vínculo que, na Igreja, une celibato e sacerdócio? Não poderia tornar-se facultativa esta difícil observância? Não ficaria assim favorecido o ministério sacerdotal e facilitada a aproximação ecumênica? Se a áurea lei do celibato consagrado deve ainda manter-se, quais são os motivos que provam que ela é santa e conveniente? Quais são os meios que tornam possível essa observância, e como se pode ela transformar de peso em auxílio, para a vida sacerdotal?

Realidade e problemas

4. Fixou-se a nossa atenção, de modo particular, nas objeções que, em formas diversas, foram e continuam a ser expressas contra a manutenção do celibato. Com efeito, tema de tão grande importância e complexidade obriga-nos, em virtude do nosso serviço apostólico, a considerar lealmente a realidade e os problemas que essa implica mas, como é nosso dever e nosso encargo, havemos de fazer essa consideração à luz da verdade que é Cristo, propondo-nos cumprir em tudo a vontade daquele que nos entregou a nossa missão e propondo-nos também mostrar aquilo que somos diante da Igreja, isto é, Servo dos servos de Deus.



OBJEÇÕES CONTRA O CELIBATO SACERDOTAL

Celibato e Novo Testamento

5. Pode dizer-se que, nunca como hoje, o tema do celibato eclesiástico foi com tanta agudeza examinado, sob todos os aspectos - no plano doutrinal, histórico, sociológico, psicológico e pastoral - e muitas vezes com intenções fundamentalmente retas, se bem que as palavras, de quando em quando, as tenham traído.

Consideremos honestamente as principais objeções contra a lei do celibato eclesiástico unido ao sacerdócio. A primeira provém, ao que parece, da fonte mais autorizada, o Novo Testamento, no qual se conserva a doutrina de Cristo e dos Apóstolos. O Novo Testamento não exige o celibato dos ministros sagrados, mas propõe-no simplesmente como obediência livre a uma vocação especial ou a um carisma particular (cf. Mt19, 11-12). Jesus não impôs esta condição ao escolher os Doze, como também os Apóstolos não a impuseram àqueles que iam colocando à frente das primeiras comunidades cristãs (cf.1 Tm 3, 2-5; Tt 1, 5-6).

Padres da Igreja

6. A relação íntima que os Padres da Igreja e os escritores eclesiásticos estabeleceram, com o andar dos séculos, entre a vocação ao sacerdócio ministerial e a virgindade consagrada origina-se em mentalidades e situações históricas bastante diferentes das nossas. Muitas vezes, nos textos patrísticos, recomenda-se ao clero, mais que o celibato, a abstinência do uso do matrimônio; e as razões, aduzidas em favor da castidade perfeita dos ministros sagrados, parecem às vezes inspiradas em pessimismo excessivo quanto à condição do homem na carne, ou ainda, num conceito particular da pureza necessária para o contato com as coisas sagradas. Além disso, os argumentos antigos já não estariam em conformidade com os ambientes sócio-culturais em que a Igreja é chamada a atuar, por meio dos sacerdotes, no mundo de hoje.

Vocação e celibato

7. Uma dificuldade, que muitos notam, consiste em fazer-se coincidir, na disciplina vigente do celibato, o carisma da vocação sacerdotal com o da perfeita castidade, considerada como estado de vida próprio do ministro de Deus. E por isso perguntam se é justo afastar do sacerdócio aqueles que parecem ter vocação ministerial, sem terem vocação de vida celibatária.

Celibato e escassez de clero

8. Manter o celibato sacerdotal na Igreja muito prejudicaria, além disso, as regiões onde a escassez numérica do clero, reconhecida e lamentada pelo Concílio, [2] provoca situações dramáticas, dificultando a plena realização do plano divino de salvação e pondo às vezes em perigo até mesmo a possibilidade do primeiro anúncio evangélico. De fato, a preocupante rarefação do clero é atribuída por alguns ao peso da obrigação do celibato.

Sombras sobre o celibato

9. Nem faltam pessoas convencidas de que o sacerdócio no matrimônio não só tiraria a ocasião de infidelidades, desordens e defecções dolorosas, que ferem e magoam a Igreja inteira, mas consentiria aos ministros de Cristo mais completo testemunho de vida cristã, mesmo no campo da família, campo que lhes está vedado pelo estado atual em que vivem.

Violência contra a natureza?

10. Há ainda quem insista em afirmar que o sacerdote se encontra, em virtude do celibato, numa situação física e psicológica artificial nociva ao equilíbrio e manutenção da sua personalidade humana; acontece, segundo dizem, que muitas vezes o sacerdote se torna insensível, falto de calor humano e de plena comunhão de vida e destino com o resto dos seus irmãos, vendo-se obrigado a uma solidão que é fonte de amargura e aviltamento.

Não indicará tudo isto violência injusta e desprezo injustificável dos valores humanos, derivados da obra divina da criação e integrados na obra da redenção realizada por Cristo?

Formação inadequada

11. Reparando, além disso, no modo como o candidato ao sacerdócio chega a aceitar tão pesado encargo, objeta-se que, na prática, esse fato é conseqüência duma atitude passiva, causada muitas vezes por formação não perfeitamente adequada, nem respeitadora da liberdade humana, mais que resultado duma decisão autenticamente pessoal, pois o grau de conhecimento e de autodecisão do jovem e a sua maturidade psicofísica são bastante inferiores, e sempre desproporcionados com a realidade, com as dificuldades objetivas e com a duração da obrigação que assumem.

Verdadeiro ponto de vista

12. Não ignoramos que se podem levantar outras objeções contra o celibato: é tema muito complexo, que toca no âmago da concepção habitual da vida e introduz nela a luz superior que vem da revelação divina; interminável série de dificuldades ocorrerá ao espírito daqueles que "não compreendem esta linguagem" (Mt19, 11), não entendem ou esquecem o "dom de Deus" (cf. Jo 4, 10), nem conhecem a lógica superior desse novo conceito de vida, a sua admirável eficácia e plenitude exuberante.

Testemunho do passado e do presente

13. Este coro de objeções parece que sufoca a voz secular e solene dos Pastores da Igreja, dos mestres de espírito, do testemunho vivido duma legião sem número de santos e de fiéis ministros de Deus, que fizeram do celibato objeto interior e sinal exterior da sua alegre e total doação ao mistério de Cristo. Não, esta voz é ainda forte e serena; não vem só do passado, vem do presente também. Constantemente atento como estamos a observar a realidade, não podemos fechar os olhos a este fato magnífico e surpreendente: na santa Igreja de Deus, em todas as partes do mundo onde ela levantou felizmente as suas tendas, ainda hoje há inumeráveis ministros sagrados - subdiáconos, diáconos, presbíteros e bispos - que vivem de modo ilibado o celibato voluntário e consagrado; e, ao lado destes, não podemos deixar de notar as falanges imensas de religiosos, religiosas, e também de jovens e leigos, todos fiéis ao compromisso da perfeita castidade: vivem-na, não por desprezo do dom divino da vida, mas por amor superior à vida nova que brota do mistério pascal; vivem-na com austeridade corajosa, com religiosidade alegre, dum modo exemplar e íntegro, e mesmo com relativa facilidade. Este grandioso fenômeno prova a realidade singular do reino de Deus, vivo no seio da sociedade moderna, à qual presta o humilde e benéfico serviço de "luz do mundo" e de "sal da terra" (cf. Mt 5, 13-14). Não podemos calar a nossa admiração: neste fenômeno, sopra indubitavelmente o Espírito de Cristo.

Confirmada a validez do celibato

14. Julgamos portanto que a lei vigente do celibato consagrado deve, ainda hoje, acompanhar firmemente o ministério eclesiástico; deve tornar possível ao ministro a sua escolha, exclusiva, perene e total, do amor único e supremo de Cristo e a sua dedicação ao culto de Deus e ao serviço da Igreja, e deve ser característica do seu estado de vida, tanto na comunidade dos fiéis como na profana.

Poder da Igreja

15. É certo que o carisma da vocação sacerdotal, ordenada ao culto divino e ao serviço religioso e pastoral do Povo de Deus, se distingue do carisma que leva à escolha do celibato como estado de vida consagrada (cf. nn. 5 e 7); mas a vocação sacerdotal, ainda que divina na sua inspiração, não se torna definitiva e operante sem o exame e a aceitação de quem possui na Igreja o poder e a responsabilidade do ministério ao serviço da comunidade eclesial; e pertence por conseguinte à autoridade da Igreja estabelecer, segundo os tempos e os lugares, quais devam ser em concreto os homens e quais os requisitos exigidos para que possam considerar-se aptos para o serviço religioso e pastoral da mesma Igreja.

Finalidade da Encíclica

16. Guiando-nos pelo espírito de fé, consideramos portanto favorável a ocasião, que nos é oferecida pela Divina Providência, de explicarmos de novo e de maneira mais adaptada aos homens do nosso tempo as razões profundas do celibato consagrado, pois, se as dificuldades contra a fé "podem estimular o espírito à mais cuidadosa e profunda inteligência" da mesma, [3] não acontece diferentemente com a disciplina eclesiástica, que dirige a vida dos crentes.

Sentimo-nos vibrar de alegria ao contemplar, nestas circunstâncias e desde este ponto de vista, a divina riqueza e beleza da Igreja de Cristo que nem sempre é imediatamente decifrável a olhos humanos, sendo obra do amor do Chefe divino da mesma Igreja e manifestando-se em tal perfeição de santidade (cf. Ef 5, 25-27) que maravilha o espírito do homem e ultrapassa tudo quanto as forças da criatura humana poderiam fazer para explicá-la.



PRIMEIRA PARTE

I. RAZÕES DO CELIBATO CONSAGRADO

Concílio e celibato

17. É certo, conforme declarou o Concílio Ecumênico Vaticano II, que a virgindade "não é requerida pela própria natureza do sacerdócio, como se conclui da prática da Igreja primitiva e da tradição das Igrejas Orientais". [4] Mas o mesmo Sagrado Concílio não hesitou em confirmar solenemente a antiga, sagrada e providencial lei vigente do celibato sacerdotal, expondo também os motivos que a justificam aos olhos de quem sabe apreciar com espírito de fé e com fervor íntimo e generoso os dons divinos.

Argumentos antigos à luz nova

18. Não foi hoje que se começou a refletir sobre a "múltipla conveniência" (1.c.) do celibato para os ministros de Deus, e, mesmo que os motivos explícitos tenham variado conforme as várias mentalidades e as diversas situações, esses motivos inspiraram-se sempre em considerações especificamente cristãs, no fundo das quais está a intuição das razões mais profundas. Estas podem ser vistas com melhor luz, mas somente por influxo do Espírito Santo, prometido por Cristo aos seus para dar conhecimento das coisas vindouras (cf.Jo 16, 13) e aumentar no Povo de Deus a inteligência do mistério de Cristo e da Igreja, mesmo através da experiência dimanante de maior penetração das coisas espirituais no decurso dos séculos. [5]



SIGNIFICADO CRISTOLÓGICO DO CELIBATO

Novidade de Cristo

19. O sacerdócio cristão, que é novo, só pode ser compreendido à luz da novidade de Cristo, Pontífice máximo e Sacerdote eterno, que instituiu o sacerdócio ministerial como participação do seu sacerdócio único.[6] Portanto o ministro de Cristo e administrador dos mistérios de Deus (1 Cor 4, 1), encontra também nele o modelo direto e o ideal supremo (cf. 1 Cor 11, 1). O Senhor Jesus Cristo, Unigênito de Deus, enviado ao mundo pelo Pai, fez-se homem para que a humanidade sujeita ao pecado e à morte, fosse regenerada e, por meio dum nascimento novo (Jo 3, 5; Tt 3, 5), entrasse no reino dos céus. Consagrando-se inteiramente à vontade do Pai (Jo 4,34; 17, 4), Jesus realizou, por meio do seu mistério pascal, esta nova criação (2 Cor 5, 17; Gl 6, 15), introduzindo no tempo e no mundo uma forma de vida, sublime e divina, que transforma a condição terrena da humanidade (cf. Gl 3, 28).

Matrimônio e celibato na novidade de Cristo

20. O matrimônio que, por vontade de Deus, continua a obra da primeira criação (cf. Gn 2, 18), ao ser integrado no desígnio total da salvação, adquire novo significado e valor. Na verdade, Jesus, restituiu-lhe a dignidade primitiva (Mt 19, 3-8), honrou-o (cf. Jo 2, 1-11) e elevou-o à dignidade de sacramento e de sinal misterioso da sua união com a Igreja (Ef 5,32). Assim, os cônjuges cristãos, no exercício do amor mútuo e no cumprimento dos próprios deveres, e tendendo para aquela santidade que lhes é própria, caminham juntos em direção à pátria celeste. Mas Cristo, Mediador dum Testamento mais excelente (Hb 8, 6), abriu também novo caminho, em que a criatura humana, unindo-se total e diretamente ao Senhor e preocupada apenas com Ele e com as coisas que lhe dizem respeito (1 Cor 7, 33-35), manifesta de maneira mais clara e completa a realidade profundamente inovadora do Novo Testamento.

Virgindade e sacerdócio em Cristo Mediador

21. Cristo, Filho único de Deus, está constituído, em virtude da sua mesma encarnação, Mediador entre o céu e a terra, entre o Pai e o gênero humano. Em plena harmonia com esta missão, Cristo manteve-se toda a vida no estado de virgindade, o que significa a sua dedicação total ao serviço de Deus e dos homens. Este nexo profundo em Cristo, entre virgindade e sacerdócio, reflete-se também naqueles que têm a sorte de participar da dignidade e da missão do Mediador e Sacerdote eterno, e essa participação será tanto mais perfeita quanto o ministro sagrado estiver mais livre dos vínculos da carne e do sangue.[7]

O celibato para o reino dos céus

22. Jesus que escolheu os primeiros ministros da salvação e quis que eles fossem participantes dos mistérios do reino dos céus (Mt 13, 11; cf. Mc 4,11; Lc 8, 10), cooperadores de Deus a título especialíssimo e seus embaixadores (2 Cor 5,20), Jesus que lhes chamou amigos e irmãos (cf. Jo 15, 15; 20, 17), e se consagrou por eles para que também eles fossem consagrados na verdade (cf. Jo 17, 19), prometeu superabundante recompensa a todos quantos abandonem casa, família, mulher e filhos pelo reino de Deus (cf. Lc 18, 29-30). E até recomendou, [8] com palavras densas de mistério e de promessas, uma consagração mais perfeita ainda, ao reino dos céus, com a virgindade, em conseqüência dum dom especial (cf. Mt 19, 11-12). A correspondência a este carisma divino tem como motivo o reino dos céus (ibid. v 12); e, do mesmo modo, é neste reino (cf. Lc 18,29-30), no evangelho (Mc 10, 29-30) e no nome de Cristo (Mt 19, 29), que se encontram motivados os convites de Jesus às difíceis renúncias apostólicas no sentido duma participação mais íntima na sua própria sorte.

Testemunho dado a Cristo

23. É portanto o mistério da novidade de Cristo, de tudo o que Ele é e significa, é a soma dos mais altos ideais do evangelho e do reino, é uma manifestação particular da graça, que brota do mistério pascal do Redentor, e torna desejável e digna a escolha da virgindade por parte dos que foram chamados pelo Senhor Jesus, não só a participarem do seu ministério sacerdotal, mas a compartilharem com Ele o seu mesmo estado de vida.

Plenitude de amor

24. A correspondência à vocação divina é resposta de amor ao amor que Jesus Cristo nos mostrou de maneira sublime (cf. Jo 3, 16; 15, 13); é resposta coberta de mistério no amor particular pelas almas a quem Ele fez sentir os apelos mais instantes (cf. Mc 10, 21). A graça multiplica, com força divina, as exigências do amor; este, quando autêntico, é total, exclusivo, estável e perene, e estímulo irresistível que leva a todos os heroísmos. Por isso, a escolha do celibato consagrado foi sempre considerada pela Igreja "como sinal e estímulo da caridade": [9] sinal de amor sem reservas, estímulo de caridade que a todos abraça. Numa vida de entrega tão inteira, feita pelos motivos que expusemos, quem poderá reconhecer sinais de pobreza espiritual ou de egoísmo, sendo ela e devendo ser, pelo contrário, exemplo raro e excepcionalmente expressivo duma vida impulsionada e fortalecida pelo amor, no qual o homem exprime a grandeza que é exclusivamente sua? Quem poderá duvidar da plenitude moral e espiritual duma vida, assim consagrada não a qualquer ideal, por mais nobre que seja, mas a Cristo e à sua obra em favor duma humanidade nova, em todos os lugares e em todos os tempos?

Convite ao estudo

25. Esta perspectiva bíblica e teológica, que associa o nosso sacerdócio ministerial ao de Jesus, e que, na total e exclusiva dedicação de Cristo à sua missão salvadora, encontra exemplo e razão de ser para assimilarmos, na nossa vida, a forma de caridade e de sacrifício própria de Cristo Redentor, parece-nos tão profunda e tão rica de verdades especulativas e práticas, que vos convidamos, veneráveis Irmãos, - como convidamos os que se dão ao estudo da doutrina cristã, os mestres de espírito e todos os sacerdotes capazes de intuições sobrenaturais a respeito da sua vocação - a perseverardes no estudo de tal perspectiva, e a penetrardes nas suas íntimas e fecundas realidades, de maneira que o vínculo entre sacerdócio e celibato apareça cada vez mais claro na sua lógica, luminosa e heróica, de amor único e ilimitado a Cristo Senhor e à sua Igreja.



SIGNIFICADO ECLESIOLÓGICO DO CELIBATO

Celibato e amor de Cristo e do sacerdote para com a Igreja

26. "Conquistado por Cristo Jesus" (Fl 3,12) até ao abandono total de si mesmo a Ele, o sacerdote configura-se mais perfeitamente a Cristo, também no amor com que o eterno Sacerdote amou a Igreja seu Corpo, oferecendo-se inteiramente por ela, para a tornar Esposa sua, gloriosa, santa e imaculada (cf. Ef 5, 25-27). A virgindade consagrada dos sacerdotes manifesta, de fato, o amor virginal de Cristo para com a Igreja e a fecundidade virginal e sobrenatural desta união em que os filhos de Deus não são gerados pela carne e pelo sangue (Jo 1, 13).[10]

Unidade e harmonia da vida sacerdotal: o ministério da Palavra

27. O sacerdote, dedicando-se ao serviço do Senhor Jesus e do seu Corpo místico, em plena liberdade, facilitada pela sua oferta total, realiza, de modo mais completo, a unidade e a harmonia da vida sacerdotal;[11] torna-se mais capaz de ouvir a Palavra de Deus e de se entregar à oração. Na verdade, a Palavra de Deus, conservada pela Igreja, deixa na alma do sacerdote, que diariamente a medita, vive e anuncia, os ecos mais vibrantes e mais profundos.

Ofício divino e oração

28. Deste modo, como Cristo, aplicado total e exclusivamente às coisas de Deus e da Igreja (cf. Lc 2,49;1 Cor 7,32-33), o ministro do Senhor, à imitação do sumo Sacerdote sempre vivo na presença de Deus a interceder por nós (cf. Hb 9,24; 7,25), encontra na recitação devota e atenta do Ofício divino, [12] na qual empresta a sua voz à Igreja que ora em união com o seu Esposo, alegria e impulso incessantes e sente necessidade de ser mais assíduo na oração, dever eminentemente sacerdotal (cf. At 6,2).

Ministério da graça e da eucaristia

29. E tudo o mais da vida do sacerdote, adquire maior plenitude de significado e de eficácia santificadora. Com efeito, o seu compromisso especial de santificação encontra novos incentivos no ministério da graça e no da eucaristia, "em que está encerrado todo o bem da Igreja": [13] operando em nome de Cristo, o sacerdote une-se mais intimamente à oferta, colocando sobre o altar a sua vida inteira, marcada com sinais de holocausto.

Vida pleníssima e fecunda

30. Quantas considerações poderíamos acrescentar ainda sobre o aumento de capacidade, de serviço, de amor e sacrifício do sacerdote em favor do Povo de Deus? Cristo disse de Si mesmo: "Se o grão de trigo que cai na terra não morrer, permanecerá só; mas se morrer, produzirá muito fruto" (Jo 12,24); e o apóstolo São Paulo não hesitava em expor-se à morte de todos os dias, para possuir nos seus fiéis a glória em Cristo Jesus (cf. 1 Cor 15,31). Assim o sacerdote, na morte cotidiana a toda a sua pessoa, na renúncia ao amor legítimo de uma família própria, por amor de Jesus e do seu reino, encontrará a glória duma vida em Cristo pleníssima e fecunda, porque, como Ele e nele, ama e se entrega a todos os filhos de Deus.

Sacerdote celibatário na comunidade dos féis

31. Na comunidade dos fiéis comados aos seus cuidados, o sacerdote é Cristo presente; daqui a suma conveniência de que ele reproduza em tudo a imagem de Cristo e lhe siga o exemplo, tanto na vida íntima como na vida do próprio ministério. Para os seus filhos em Cristo, o sacerdote é sinal e penhor das realidades sublimes e novas do reino de Deus, das quais é distribuidor, possuindo-as em si no grau mais perfeito e alimentando a fé e a esperança de todos os cristãos, que, como tais, são obrigados à observância da castidade segundo o próprio estado.

Eficácia pastoral do celibato

32. A consagração a Cristo, em virtude dum título novo e excelso como é o celibato, consente, além disso, ao sacerdote, mesmo no campo prático, como é evidente, a máxima eficiência e a melhor aptidão psicológica e afetiva para o exercício contínuo daquela caridade perfeita que lhe permitirá, de maneira mais ampla e concreta, dar-se todo para o bem de todos (cf. 2 Cor 12,15),[14] e garante-lhe, como é óbvio, maior liberdade e disponibilidade no ministério pastoral, [15] na sua ativa e amorosa presença no mundo, ao qual Jesus Cristo o enviou (cf. Jo 17,18), a fim de que ele pague inteiramente a todos os filhos de Deus a dívida que tem para com eles (cf. Rm 1,14).



SIGNIFICADO ESCATOLÓGICO DO CELIBATO

Aspiração do Povo de Deus pelo reino celeste

33. O reino de Deus, que "não é deste mundo" (Jo 18,36), está nele presente, aqui na terra, em mistério e atingirá a sua perfeição com a vinda gloriosa do Senhor Jesus.[16] A Igreja constitui, aqui na terra, o germe e o início deste reino; e, ao passo que vai crescendo lenta mas seguramente, aspira pelo reino perfeito e ambiciona, com todas as forças, unir-se com o seu Rei na glória.[17]

O Povo de Deus peregrino encontra-se, na história, a caminho da sua verdadeira pátria (cf. Fl 3,20), onde se manifestará em plenitude a filiação divina dos remidos (cf.1 Jo 3,2) e onde brilhará definitivamente a beleza transfigurada da Esposa do Cordeiro divino.[18]

Celibato como sinal dos bens celestes

34. O nosso Senhor e Mestre disse que "na ressurreição, nem eles se casam, e nem elas se dão em casamento, mas são todos como anjos no céu" (Mt 22,30). No mundo do homem, tão absorvido nos cuidados terrenos e dominado muitas vezes pelos desejos da carne (cf.1 Jo 2,16), o precioso dom divino da continência perfeita, por amor do reino dos céus, constitui exatamente "um sinal particular dos bens celestes", [19] anuncia a presença na terra dos últimos tempos da salvação (cf. 1 Cor 7,29-31) com o advento dum mundo nova, e antecipa, de alguma maneira, a consumação do reino, armando os valores supremos do mesmo, que um dia hão de brilhar em todos os filhos de Deus. É, por isso, testemunho da tensão necessária do Povo de Deus orientada para a meta última da peregrinação terrestre e é incitamento para todos erguerem o olhar às coisas do alto, onde o Senhor está sentado à direita do Pai e onde a nossa vida está escondida com Cristo em Deus, até se manifestar na glória (cf. Cl 3,1-4).



II. O CELIBATO NA VIDA DA IGREJA

Antigüidade

35. Muito instrutivo seria, embora demasiado longo, o estudo dos documentos históricos sobre o celibato eclesiástico. Uma alusão apenas. Os Padres e escritores eclesiásticos da antiguidade cristã dão testemunho da difusão, tanto no Oriente como no Ocidente, da livre prática do celibato nos sagrados ministros,[20] em virtude da grande conveniência dele com a total dedicação ao serviço de Cristo e da Igreja.

Igreja do Ocidente

36. Desde os inícios do século IV, a Igreja do Ocidente, por meio das decisões de vários Concílios provinciais e dos Sumos Pontífices, corroborou, difundiu e sancionou esta prática.[21] Foram sobretudo os supremos Pastores e Mestres da Igreja de Deus, guardas e intérpretes do patrimônio da fé e dos santos costumes cristãos, quem promoveu, defendeu e restaurou o celibato eclesiástico nas épocas sucessivas da história, ainda mesmo quando no próprio clero surgiam oposições a ele e os costumes da sociedade favoreciam pouco os heroísmos da virtude. A obrigação do celibato foi solenemente sancionada pelo Concílio Ecumênico de Trento [22] e por fim inserida no Código de Direito Canônico (can.132 § 1).

Recente magistério pontifício

37. Os Sumos Pontífices mais recentes empregaram o seu ardentíssimo zelo e doutrina em iluminar o clero e estimulá-lo a essa observância. [23] Não queremos deixar de render aqui especial homenagem à piíssima memória do nosso imediato predecessor, ainda vivo no coração do mundo, o qual, no Sínodo Romano e com a sincera anuência do nosso clero da Urbe, pronunciou as seguintes palavras: "Amargura-nos saber... que alguns fantasiam sobre o desejo ou a conveniência, que haveria para a Igreja católica, em renunciar ao que por tantos séculos foi e continua a ser uma das mais nobres e mais puras glórias do sacerdócio. A lei do celibato eclesiástico, com o empenho de fazê-la prevalecer, continua a evocar as batalhas dos tempos heróicos, quando a Igreja teve que lutar e venceu, evoca o triunfo do seu trinômio glorioso, que será sempre emblema de vitória: Igreja de Cristo, livre, casta e católica".[24]

Igreja do Oriente

38. Se é diferente a legislação da Igreja Oriental em matéria de disciplina celibatária para o clero, como foi finalmente estabelecido no Concílio Trulano do ano 692 [25] e abertamente reconhecido pelo Concílio Ecumênico Vaticano II, [26] deve-se a uma situação histórica, também diversa, daquela parte nobilíssima da Igreja, à qual o Espírito Santo conformou providencial e sobrenaturalmente o seu influxo.

Aproveitamos esta ocasião para exprimir os nossos sentimentos de estima e de respeito por todo o clero das Igrejas Orientais, e para reconhecer nele os exemplos de fidelidade e de zelo que o tornam digno de sincera veneração.

A voz dos Padres Orientais

39. Mas a apologia que os Padres Orientais fizeram da virgindade é-nos igualmente motivo de conforto para perseverarmos na observância da disciplina sobre o celibato do clero. Ainda hoje faz eco no nosso coração, por exemplo, a voz de São Gregório Nisseno, quando nos recorda que "a vida virginal é a imagem da felicidade que nos espera no mundo que há de vir". [27] Nem é menos confortante o louvor, em que ainda hoje meditamos, dado por São João Crisóstomo ao sacerdócio quando pretendia fazer ressaltar a necessária harmonia que deve reinar entre a vida particular do ministro do altar e a dignidade de que está revestido, em função dos seus deveres sagrados: "...quem se aproxima do sacerdócio, deve ser puro como se estivesse no céu". [28]

Indicações significativas na tradição oriental

40. Além disso, não será inútil observar que, mesmo no Oriente, somente os sacerdotes celibatários são sagrados bispos, e nunca os sacerdotes podem contrair matrimônio depois da ordenação; o que faz compreender como também aquelas venerandas Igrejas possuem, em certo modo, o princípio do sacerdócio celibatário e o de certa conveniência do celibato para o sacerdócio cristão, do qual os bispos têm o auge e a plenitude. [29]

Fidelidade da Igreja ocidental à própria tradição

41. Em todo o caso, a Igreja ocidental nâo pode faltar em sua fidelidade à própria antiga tradição; nem poderá passar pela cabeça de ninguém que ela tenha seguido durante séculos um caminho que, em vez de favorecer a riqueza espiritual dos indivíduos e do Povo de Deus, a tenha de algum modo comprometido, ou levado a oprimir, com arbitrárias intervenções jurídicas, a livre expansão das mais profundas realidades da natureza e da graça.

Alguns casos particulares

42. Em virtude da norma fundamental do governo da Igreja católica, a que aludimos acima (n.15), se, por um lado, permanece firme a lei que exige a escolha livre e perpétua do celibato naqueles que são admitidos às Ordens sacras, por outro, poderá admitir-se o estudo das condições peculiares de sacerdotes casados, membros de Igrejas ou comunidades cristãs ainda separadas da comunhão católica, os quais desejando aderir à plenitude desta comunhão e nela exercer o sagrado ministério, forem admitidos às funções sacerdotais. Mas há de ser de tal forma que não causem prejuízo à disciplina vigente sobre o sagrado celibato.

E como prova de que a autoridade da Igreja não se recusa ao exercício deste poder, temos o fato, previsto pelo recente Concílio Ecumênico, da concessão do diaconado também a homens casados de idade madura.[30]

Confirmação

43. Tudo isto porém não significa relaxamento da lei vigente, nem tampouco deve ser interpretado como prelúdio da sua abolição. Em vez de se favorecer esta hipótese que enfraquece nos ânimos a força e o amor, pelos quais o celibato se torna seguro e feliz, e obscurece a verdadeira doutrina que justifica a sua existência e glorifica o seu esplendor, há de promover-se o estudo em defesa do conceito espiritual e do valor moral da virgindade e do celibato. [31]

Confiança da Igreja

44. A virgindade consagrada é certamente dom especial. Mas a Igreja inteira da nossa época, representada solene e universalmente pelos seus Pastores responsáveis, e respeitando, como dizíamos, a disciplina das Igrejas orientais, manifestou a sua plena certeza no Espírito de "que o dom do celibato, tão em harmonia com o sacerdócio do Novo Testamento, será concedido liberalmente pelo Pai, desde que os participantes do sacerdócio de Cristo pelo sacramento da Ordem, e toda a Igreja, humilde e insistentemente o peçam". [32]

Oração do Povo de Deus

45. Nós convocamos em espírito todo o Povo de Deus para que em cumprimento do dever de fomentar as vocações sacerdotais, [33] se dirija insistentemente ao Pai comum, ao divino Esposo da Igreja e ao Espírito Santo que é a sua alma, pedindo que pela intercessão da bem-aventurada Virgem Maria, Mãe de Cristo e da Igreja, derramem especialmente no nosso tempo esse dom divino, do qual o Pai não é certamente avaro, e façam que as almas se disponham a recebê-lo com espírito de fé profunda, e de amor generoso. Assim, neste nosso mundo que necessita da glória de Deus (cf. Rom 3,23), os sacerdotes, tornando-se cada vez mais perfeitamente conformes ao único e sumo Sacerdote, serão irradiante glória de Cristo (cf. 2 Cor 8,23), e por meio deles resplandecerá "a glória da graça" de Deus, no mundo atual (cf. Ef 1,6).

Mundo atual e celibato consagrado

46. Sim, Veneráveis e caríssimos Irmãos no sacerdócio, que amamos "com a ternura de Jesus Cristo" (Fl1,8), o mundo em que hoje vivemos, perturbado por uma crise de crescimento e de transformação, justamente orgulhoso dos valores e das conquistas humanas, tem neste momento, necessidade urgente do testemunho de vidas consagradas aos mais altos e sagrados valores espirituais, para que não lhe falte a rara e incomparável luz das mais sublimes conquistas do espírito.

Escassez numérica de sacerdotes

47. Nosso Senhor Jesus Cristo não temeu contar a um punhado de homens, que todos teríamos julgado insuficientes tanto em número como em qualidade, o encargo imenso da evangelização do mundo até então conhecido; e ordenou a essa "pequena grei" que não tivesse receio (cf. Lc 12,32), porque alcançaria com Ele e por Ele, a vitória sobre o mundo (Jo 16,33) graças à constante assistência que lhe daria (Mt 28,20). Advertiu-nos também Jesus de que o Reino de Deus possui uma força íntima e secreta, que o faz crescer e chegar à messe sem que o homem saiba como (cf. Mc 4,26-29). Essa messe do Reino de Deus é grande, e os operários ainda são poucos, como ao princípio; ou por outra, nunca chegaram a ser tão numerosos, que se pudessem dizer suficientes segundo os cálculos humanos. Mas o Senhor do Reino exige que se reze, para que o Dono da messe mande operários para o seu campo (Mt 9,37-38). Os planos e a prudência dos homens não podem sobrepor-se à misteriosa sabedoria daquele que, na história da salvação, desafiou a sabedoria e o poder do homem com a sua insensatez e fraqueza (1 Cor 1,20-31).

Coragem da fé

48. Nós fazemos apelo à coragem da fé, para exprimir a profunda convicção que a Igreja nutre de que uma resposta mais responsável e generosa à graça, uma confiança mais explicita e qualificada na sua força misteriosa e transformadora, um testemunho mais aberto e completo dado ao mistério de Cristo, nunca a farão errar na sua missão salvadora para com o mundo inteiro, sejam quais forem os cálculos humanos e as aparências exteriores. Não esqueçamos que tudo podemos naquele que é o único a dar força às almas (cf. Fl4,13) e incremento à sua Igreja (cf.1 Cor 3,6-7).

Raiz do problema

49. Não se pode acreditar sem reservas que, abolido o celibato eclesiástico, as vocações sacerdotais cresceriam por isso mesmo e de forma considerável: a experiência contemporânea das Igrejas e das comunidades eclesiais que permitem o matrimônio aos seus ministros, parece depor em contrário. A rarefação das vocações sacerdotais deve ser procurada principalmente noutras causas: por exemplo, na perda ou na diminuição do sentido de Deus e do que é sacro nos indivíduos e nas famílias, e na perda da estima pela Igreja como instituição de salvação mediante a fé e os sacramentos. O problema tem portanto que ser estudado na sua verdadeira raiz.



III. CELIBATO E VALORES HUMANOS

Celibato e amor

50. A Igreja, como dizíamos acima (cf. n.10), não ignora que a escolha do celibato consagrado, implicando uma série de severas renúncias que atingem o íntimo do homem, traz também consigo graves dificuldades e problemas a que são particularmente sensíveis os homens de hoje. Poderia, de fato, parecer que o celibato não condiz com o solene reconhecimento dos valores humanos por parte da Igreja no recente Concílio Ecumênico. Mas, se refletirmos mais atentamente, veremos que o sacrifício do amor humano, tal como é vivido na família, feito pelo sacerdote por amor de Cristo, é na realidade homenagem singular prestada a esse amor. É fato universalmente reconhecido, que a criatura humana soube oferecer sempre a Deus o que é digno de quem dá e de quem recebe.

Graça e natureza

51. A Igreja, por outro lado, não pode nem deve ignorar que a escolha do celibato é obra da graça, quando é feita com prudência humana e cristã e com responsabilidade. Mas a graça não destrói nem violenta a natureza: eleva-a e dá-lhe capacidade e vigor sobrenatural. Deus que criou e remiu o homem, sabe o que lhe pode pedir e dá-lhe tudo o que é necessário para poder fazer o que o Criador e Redentor lhe pede. Santo Agostinho, tendo experimentado ampla e dolorosamente em si mesmo a natureza humana, exclamava: "Dá o que ordenas e manda o que queres". [34]

Peso real das dificuldades

52. O conhecimento sincero das dificuldades reais do celibato é muito útil, ou antes, é necessário ao sacerdote, para que ele se dê conta, com pleno conhecimento, daquilo que o celibato requer para ser autêntico e benéfico. Mas se queremos proceder com igual sinceridade, não se deve atribuir a estas dificuldades valor e peso maiores do que têm de fato no contexto humano e religioso, ou declará-las impossíveis de resolver.

O celibato não vai contra a natureza

53. Depois do que a ciência deu como certo, não é justo repetir ainda (cf. n.10) que o celibato vai contra a natureza, por se opor a legítimas exigências físicas, psicológicas e afetivas, cuja satisfação seria necessária para a completa realização e maturidade da pessoa humana. O homem, criado à imagem e semelhança de Deus (Gn 1, 26-27), não é somente carne, e o instinto sexual não é tudo nele. O homem é também e sobretudo inteligência, vontade, liberdade e, graças a estas faculdades, é e deve ter-se como superior ao universo: elas tornam-no senhor dos próprios apetites físicos, psicológicos e afetivos.

Razão profunda do celibato

54. A verdadeira e profunda razão do celibato é, como já dissemos, a escolha duma relação pessoal mais íntima e completa com o mistério de Cristo e da Igreja, em prol da humanidade inteira. Nesta escolha há lugar, sem dúvida, para a expressão dos valores supremos e humanos no grau mais elevado.

Celibato como elevação do homem

55. A escolha do celibato não comporta ignorância, ou desprezo do instinto sexual ou da afetividade, o que teria conseqüências certamente prejudiciais para o equilíbrio físico e psicológico do sacerdote, mas exige lúcida compreensão, atento domínio de si mesmo e sapiente sublimação da própria psique, encarada num plano superior. Deste modo o celibato, elevando integralmente o homem, contribui efetivamente para a sua perfeição.

Celibato e maturação da personalidade

56. O desejo natural e legítimo de o homem amar uma mulher e o de constituir família são superados pelo celibato, mas não é verdade que o matrimônio e a família sejam a única via para a maturidade da pessoa humana. No coração do sacerdote não está extinto o amor. Bebida na mais pura fonte (cf. 1 Jo 4,8-16), exercida à imitação de Cristo e da Igreja, a caridade, como todo o autêntico amor, é exigente e concreta (cf:1 Jo 3,16-18), abre até ao infinito o horizonte do sacerdote, aprofunda e dilata-lhe o sentido de responsabilidade, índice de personalidade madura, desenvolve nele, como expressão de mais alta e ampla paternidade, a plenitude e delicadeza de sentimentos [35] que o enriquecem com superabundante medida.

Celibato e matrimônio

57. Todo o Povo de Deus deve dar testemunho do mistério de Cristo e do seu reino, mas este testemunho não é unívoco para todos. Deixando aos filhos leigos casados, o dever do necessário testemunho da vida conjugal e familiar autêntica e plenamente cristã, a Igreja confia aos sacerdotes o testemunho de vida totalmente dedicada às mais novas e fascinantes realidades do reino de Deus.

Se ao sacerdote falta a experiência pessoal e direta da vida de matrimônio, não lhe faltará certamente, em virtude da formação, do ministério e da graça de estado, um conhecimento do coração humano, talvez ainda mais profundo, que lhe permitirá atingir esses problemas na sua fonte, e prestar valioso auxílio aos cônjuges e às famílias cristãs assistindo-as e aconselhando-as (cf. 1 Cor 2,15). A presença, no lar cristão, do sacerdote que vive em plenitude o celibato, vincará a dimensão espiritual de todo o amor digno deste nome, e o sacrifício pessoal que ele faz merecerá para os féis, unidos pelos vínculos do matrimônio, a graça de uma autêntica união.

Solidão do sacerdote celibatário

58. É certo: o sacerdote, pelo seu celibato, é homem solitário. Mas não é solidão vazia, porque está plena de Deus e da superabundante riqueza do seu reino. Além disso, ele preparou-se para esta solidão, que deve ser plenitude interior e exterior de caridade, escolheu-a conscientemente e não por orgulho de ser diferente dos outros, não para subtrair-se às responsabilidades comuns, não para estremar-se dos irmãos ou por desestima do mundo. Segregado do mundo, o sacerdote não está separado do Povo de Deus, porque foi constituído em favor dos homens (Hb 5,1), consagrado totalmente ao serviço da caridade (cf. 1 Cor 14,4ss) e à obra para que o Senhor o chamou.[36]

Cristo e a solidão sacerdotal

59. Por vezes a solidão pesará dolorosamente sobre o sacerdote, mas nem por isso há de arrepender-se de tê-la generosamente escolhido. Também Cristo, nas horas mais trágicas da vida, ficou só, abandonado mesmo daqueles que tinha escolhido para testemunhas e companheiros e que Ele tinha amado até ao fim (Jo 13,1), mas declarou: "Eu não estou só, porque o Pai está comigo" (Jo 16,32). Quem escolheu ser todo de Cristo há de encontrar, antes de tudo, na intimidade com Ele e na sua graça, a força de ânimo necessária para dissipar a melancolia e para vencer os desânimos. Não lhe faltará a proteção da Virgem Mãe de Jesus e os maternos desvelos da Igreja a cujo serviço se consagrou. Poderá contar com a solicitude do seu pai em Cristo, o Bispo, com a fraternidade íntima dos irmãos no sacerdócio e com o conforto de todo o Povo de Deus. E se a hostilidade, a desconfiança, a indiferença dos homens lhe tornarem por vezes demasiado amarga a solidão, há de saber compartilhar com dramática evidência a mesma sorte de Cristo, como o apóstolo que não é maior do que Aquele que o enviou (cf. Jo 13,16;15,18), como o amigo que foi admitido aos segredos mais dolentes e mais gloriosos do divino Amigo que o escolheu para produzir, num viver aparentemente de morte, frutos misteriosos de vida (cf. Jo 15,15-16.20).



SEGUNDA PARTE

I. FORMAÇÃO SACERDOTAL

Formação adequada

60. A reflexão sobre a beleza, importância e íntima conveniência da virgindade para os ministros de Cristo e da Igreja, impõe também àquele que exerce as funções de Mestre e de Pastor a obrigação de assegurar e promover a sua positiva observância, a partir do momento em que o candidato principia a preparar-se para acolher dom tão precioso.

De fato, as dificuldades e os problemas que tornam para alguns penosa, ou mesmo inteiramente impossível, a observância do celibato, derivam não raro duma formação sacerdotal que, em virtude das profundas mudanças destes últimos tempos, já não é de todo adequada a formar uma personalidade digna do "homem de Deus" (1Tm 6,11).

Execução das normas do Concílio

61. O Concílio Ecumênico Vaticano II indicou já, a este respeito, critérios e normas sapientíssimas, de harmonia com o progresso da psicologia e da pedagogia e mesmo com a mudança das condições dos homens e da sociedade contemporânea.[37] É vontade nossa publicar, o mais cedo possível, instruções adequadas onde este tema seja tratado com a necessária amplitude recorrendo para isso a peritos, a fim de podermos prestar um competente e oportuno auxílio aos que na Igreja têm o gravíssimo dever de preparar os futuros sacerdotes.

Resposta pessoal à vocação divina

62. O sacerdócio é ministério instituído por Cristo para serviço do seu Corpo Místico que é a Igreja. A esta compete admitir os que julgar aptos, isto é, aqueles a quem Deus concedeu o carisma do celibato juntamente com os outros sinais de vocação eclesiástica (cf. n.15).

Em virtude deste carisma corroborado pela lei canônica, o homem é chamado a responder com decisão livre e entrega total, subordinando o próprio eu ao beneplácito divino que o chama. Em concreto a vocação divina manifesta-se num indivíduo determinado, dotado de estrutura pessoal própria que a graça não costuma violentar. Por isso, no candidato ao sacerdócio, há de cultivar-se o sentido da receptividade do dom divino, e da disponibilidade nas relações com Deus, dando essencial importância aos meios sobrenaturais.

Plano da natureza e plano da graça

63. É também necessário que se atenda com toda a diligência ao estado biológico e psicológico do candidato, para poder guiá-lo e orientá-lo para o ideal do sacerdócio. A formação bem adequada há, portanto, de coordenar harmonicamente o plano da graça e o da natureza naquele em quem se reconhecem com clareza qualidades reais e verdadeira aptidão. A presença das qualidades há de reconhecer-se com o mais escrupuloso cuidado, mal se delineiem os sinais da vocação, sem bastar um juízo apressado e superficial. Recorra-se mesmo à assistência e ao auxílio dum médico ou psicólogo competente. Nem se deverá omitir uma séria investigação anamnéstica para se apurar a idoneidade do candidato, também na importantíssima linha dos fatores hereditários.

Inaptos

64. Os candidatos que se encontrem física, psicológica ou moralmente inaptos, devem ser logo dissuadidos de seguir a carreira do sacerdócio. Saibam os educadores que isto é para eles gravíssimo dever. Não se abandonem a falazes esperanças e a perigosas ilusões, e não permitam de modo algum que o candidato as nutra, com resultados nocivos para ele e para a Igreja. Uma vida tão inteira e amavelmente dedicada, no interior e no exterior, como a do sacerdote celibatário, exclui, de fato, candidatos com insuficiente equilíbrio psicofísico e moral. Não se deve pretender que a graça supra o que falta à natureza.

Desenvolvimento da personalidade

65. Uma vez verificada a idoneidade do candidato e depois de admitido a percorrer o itinerário que o há de levar à meta do sacerdócio, deverá cuidar-se do progressivo desenvolvimento da sua personalidade, com a educação física, intelectual e moral, no que respeita à regulação e ao domínio pessoal dos instintos, dos sentimentos e das paixões.

Necessidade de disciplina

66. Esta personalidade será comprovada pela firmeza de ânimo com que aceita a disciplina pessoal e comunitária que é a exigida pela vida sacerdotal. Tal disciplina, cuja falta ou insuficiência é de deplorar, pois expõe a graves riscos, não deve ser suportada só como imposição exterior, mas por assim dizer, deve ser interiorizada, inserida no complexo da vida espiritual como seu componente indispensável.

Iniciativa pessoal

67. A arte do educador deverá estimular os jovens a cultivar a virtude sumamente evangélica da sinceridade (cf. Mt 5,37) e da espontaneidade, favorecendo toda a boa iniciativa pessoal, para que o próprio candidato aprenda a conhecer-se e a medir as forças, a assumir conscientemente as próprias responsabilidades, e a adestrar-se no domínio de si mesmo que é de suma importância na educação sacerdotal.

Exercício da autoridade

68. O exercício da autoridade, cujo princípio deve em todo o caso manter-se firme, há de inspirar-se numa sapiente moderação e em sentimentos pastorais, e há de exercer-se como num colóquio e num treino gradual, que permita ao educador compreensão cada vez mais profunda da psicologia do jovem e dê a toda a obra educativa caráter eminentemente positivo e persuasivo.

Escolha consciente

69. A formação integral do candidato ao sacerdócio deve ter em vista uma escolha livre, calma, e convicta das graves obrigações que este há de vir a assumir responsavelmente, diante de Deus e da Igreja.

O ardor e a generosidade são qualidades admiráveis da juventude e, esclarecidas e amparadas, merecem-lhe, com a bênção do Senhor, a admiração e confiança da Igreja e de todos os homens. Mas, para que o entusiasmo não seja superficial e oco, não se lhes há de esconder nenhuma das verdadeiras dificuldades pessoais e sociais com que terão de enfrentar-se em virtude da sua escolha. E, juntamente com as dificuldades será justo que se ponha em relevo, com não menor verdade e clareza, a sublimidade desta escolha, a qual, se por um lado provoca na pessoa humana certo vazio físico e psíquico, por outro dá-lhe plenitude interior capaz de sublimá-la desde o íntimo da alma.

Ascese para a maturação da personalidade

70. Os jovens deverão convencer-se de que não podem percorrer o difícil caminho do aspirante ao sacerdócio, sem uma ascese particular e própria, superior à que se pede aos demais fiéis. Será ascese severa, mas não sufocante, exercício assíduo e meditado daquelas virtudes que fazem do homem um sacerdote: abnegação de si mesmo no mais alto grau - condição essencial para o seguimento de Cristo (Mt16,24; Jo 12,25) -; humildade e obediência como expressão de verdade interior e de liberdade ordenada; prudência e justiça, fortaleza e temperança, virtudes sem as quais não pode existir vida religiosa verdadeira e profunda; sentido de responsabilidade, de fidelidade e de lealdade no assumir das próprias obrigações; desprendimento e espírito de pobreza, que dão tom e vigor à liberdade evangélica; castidade conquistada com perseverança e de harmonia com todas as outras virtudes naturais e sobrenaturais; contato sereno e seguro com o mundo a cujo serviço o candidato se irá dedicar por Cristo e o seu reino.

Assim, o aspirante ao sacerdócio adquirirá com o auxílio da divina graça personalidade equilibrada, forte e madura, síntese de elementos naturais e adquiridos, harmonia de todas as faculdades à luz da fé e da íntima união com Cristo que o escolheu para Si e para o ministério da salvação do mundo.

Períodos de tirocínio

71. Contudo, para se chegar a maior certeza da idoneidade do jovem para o sacerdócio e se poderem obter sucessivas provas de que atingiu a maturidade humana e sobrenatural, tendo em conta o fato de que "é mais difícil comportar-se bem na vida de apostolado por causa dos perigos externos", [38] será útil que a obrigação do celibato seja posta à prova, durante certos períodos de tirocínio, antes de se tornar estável e definitiva com o Presbiterado.[39]

Escolha do celibato como doação

72. Uma vez obtida a certeza moral de que a maturidade do candidato oferece garantias suficientes, poderá este assumir a grave e doce obrigação da castidade, como doação total de si mesmo ao Senhor e à Igreja.

Deste modo, a obrigação do celibato, que a Igreja vincula objetivamente à sagrada ordenação, é assumida de modo pessoal pelo próprio candidato, sob o influxo da graça divina e com plena consciência e liberdade. E óbvio que não hão de faltar os conselhos sábios e prudentes de provados mestres do espírito, para se tornar mais consciente esta grande e livre opção, mas nunca para impô-la. E nesse momento solene, que decidirá para sempre de toda a sua vida, o candidato sentirá, não o peso duma imposição externa, mas a alegria íntima duma escolha feita por amor de Cristo.



II. VIDA SACERDOTAL

Conquista incessante

73. Não creia o sacerdote que a ordenação tudo tornará fácil e o livrará definitivamente de qualquer tentação ou perigo. A castidade não se adquire de uma vez para sempre, mas é resultado de laboriosa conquista e de reafirmação cotidiana. O mundo de hoje deu grande relevo ao valor positivo do amor nas relações entre os sexos, mas multiplicou também as dificuldades e os riscos nesta matéria. Importa, por isso, que o sacerdote, para salvaguardar com todo o cuidado o bem da castidade e para reforçar-lhe o significado sublime, reflita lúcida e serenamente sobre a sua condição de homem exposto ao combate espiritual contra as seduções da carne que lhe vêm de si mesmo e do mundo, e isto com a intenção incessantemente renovada de aperfeiçoar sempre mais a sua irrevogável oferta, que o obriga a uma fidelidade plena, sincera e real.

Meios sobrenaturais

74. O sacerdote de Cristo encontrará nova força e nova alegria à medida que for aprofundando, na meditação e na oração de cada dia, os motivos da sua entrega e a convicção de que escolheu a melhor parte. Há de, por isso, implorar com humildade e perseverança, a graça da fidelidade, que nunca é recusada a quem a pede com coração sincero e, ao mesmo tempo, recorre aos meios naturais e sobrenaturais de que dispõe. E sobretudo, não há de descuidar aquelas normas ascéticas, que estão garantidas pela experiência da Igreja e que não são menos necessárias nas circunstâncias atuais do que o foram noutros tempos.[40]

Intensa vida espiritual

75. Antes de mais nada, procure o sacerdote cultivar, com todo o amor que a divina graça lhe inspira, a intimidade com Cristo, tirando todo o proveito desse inexaurível e beatificante mistério. Procure igualmente adquirir conhecimento sempre mais profundo do mistério da Igreja, pois fora deste contexto o seu estado de vida correria o risco de parecer-lhe inconsistente e incôngruo.

A piedade sacerdotal, alimentada na fonte puríssima da Palavra de Deus e da Santíssima Eucaristia, vivida no drama da Sagrada Liturgia, animada por terna e esclarecida devoção à Virgem, Mãe do Sumo e eterno Sacerdote e Rainha dos Apóstolos,[41] pô-lo-á em contato com as fontes da autêntica vida espiritual, único e solidíssimo fundamento em que há de assentar a observância da sagrada virgindade.

Espírito do ministério sacerdotal

76. Com a graça e a paz no coração, poderá o sacerdote enfrentar com grandeza de ânimo as múltiplas obrigações da sua vida e do seu ministério. E se as cumprir, com fé e com zelo, encontrará nelas outras tantas ocasiões de demonstrar a sua total consagração a Cristo e ao seu Corpo místico para santificação de si mesmo e do próximo. A caridade de Cristo que o impele (cf. 2 Cor 5,14), ajudá-lo-á também, não a renunciar aos melhores sentimentos do seu íntimo, mas a sublimá-los e a aprofundá-los em espírito de consagração, à imitação de Cristo, Sumo Sacerdote, que participou intimamente da vida dos homens, os amou e por eles sofreu (cf. Hb 4,15); à semelhança do Apóstolo Paulo, que participava das angústias de todos (cf. l Cor 9,22; 2 Cor 11,29) para irradiar no mundo a luz e a força "da Boa Nova da graça de Deus" (cf. At 20,24).

Proteção contra os perigos

77. Santamente cioso da sua integral doação ao Senhor, saiba o sacerdote defender-se contra aquelas inclinações do sentimento que põem em jogo uma afetividade não suficientemente iluminada e guiada pelo espírito, e procure não buscar justificações espirituais e apostólicas para o que, na realidade, são perigosas inclinações do coração.

Ascética viril

78. Para viver do Espírito e conformar-se com Ele (cf. Gl 5,25), a vida sacerdotal exige intensidade espiritual genuína e segura, ascética interior e exterior verdadeiramente viril. Pois, quem pertence a Cristo por um título especial, crucificou nele e por ele a própria carne com as paixões e concupiscências (Gl 5,24), não tendo receio de enfrentar, por isso, duras e contínuas provas (cf. 1Cor 9, 26-27). Assim, poderá o ministro de Cristo manifestar melhor ao mundo os frutos do Espírito, que são: "amor, alegria, paz, longanimidade, benignidade, bondade, fidelidade, mansidão, autodomínio" (Gl 5, 22-23).

Fraternidade sacerdotal

79. O gênero de vida, o ambiente e a atividade próprias do ministro de Deus, são também causas de incremento, proteção e defesa da castidade sacerdotal. Por isso, é necessário que se fomente ao máximo aquela "íntima fraternidade sacramental", [42] da qual gozam todos os sacerdotes em virtude da sagrada ordenação. Jesus, nosso Senhor, ensinou-nos a urgência do mandamento novo da caridade, e deu-nos dele exemplo admirável no mesmo momento em que instituía o sacramento da Eucaristia e do sacerdócio católico (cf. Jo 13,15;23-35), e pediu ao Pai celeste, que o amor com que o Pai o tinha amado desde sempre, estivesse nos seus ministros e Ele neles (cf. Jo 17,26).

Comunhão sacerdotal de espírito e vida

80. Há de ser, portanto, perfeita a comunhão de espírito entre os sacerdotes, e intenso o intercâmbio de orações, de serena amizade e de auxílios de toda a espécie. Nunca será demasiado recomendar aos sacerdotes a utilidade de certa vida comum entre eles, inteiramente orientada ao ministério propriamente espiritual; a prática de freqüentes encontros, com fraternas trocas de idéias, de conselhos e de experiências; a promoção de associações que favoreçam a santidade sacerdotal.

Caridade para com os irmãos em perigo

81. Reflitam os sacerdotes na advertência feita pelo Concílio Vaticano II [43] sobre a sua participação comum no sacerdócio, para se sentirem vivamente responsáveis pelos colegas perturbados por dificuldades que vão expor a sérios perigos o dom divino que possuem. Mostrem entranhas de caridade ardente por eles, uma vez que têm mais necessidade de amor, de compreensão, de orações, de ajuda discreta mas eficaz, e têm justo motivo para contar com a caridade sem limites dos que são e devem ser os seus mais autênticos amigos.

Renovação da eleição

82. Quereríamos finalmente, a título de complemento e de recordação deste nosso colóquio epistolar convosco, veneráveis Irmãos no Episcopado, Sacerdotes e ministros do altar, sugerir que cada um de vós tomasse a resolução de, todos os anos, no aniversário da respectiva ordenação, ou todos unidos em espírito na Quinta-feira Santa, nesse dia misterioso da instituição do sacerdócio, renovar a doação total e cheia de fé a Cristo Senhor, reavivar assim a consciência da própria eleição para o divino serviço, e repetir, com humildade e coragem, a promessa de indefectível fidelidade ao amor único e à castíssima oblação feita (cf.Rm 12,1).



III. DESERÇÕES DOLOROSAS

Verdadeira responsabilidade

83. Neste momento, o nosso coração volta-se com amor paterno, com ansiedade e grande mágoa para aqueles infelizes, mas sempre muito queridos e saudosos irmãos no sacerdócio, que, mantendo impresso na alma o caráter sagrado que lhes foi conferido na ordenação sacerdotal, foram ou são desgraçadamente infiéis às obrigações assumidas quando se consagraram ao serviço do Senhor.

A sua deplorável situação e as conseqüências particulares ou públicas que dela derivam, levam alguns a duvidar se não será precisamente o celibato responsável de algum modo por tais dramas e tais escândalos que afligem o Povo de Deus. Na realidade, a responsabilidade não recai sobre o próprio celibato, mas sobre o fato de se não terem avaliado a tempo de modo satisfatório e prudente as qualidades do candidato ao sacerdócio, ou ainda, sobre a maneira como os ministros sagrados vivem a sua consagração total.

Motivos para as dispensas

84. Sendo muito sensível à triste sorte destes seus filhos, a Igreja julga necessário fazer todo o esforço para prevenir ou cicatrizar as chagas que estas defecções lhe trazem. Seguindo o exemplo de nossos imediatos antecessores de saudosa memória, também nós quisemos e determinamos que a investigação das causas que têm por objeto a ordenação sacerdotal fosse ampliada a outros motivos gravíssimos que não estão previstos na legislação canônica atual (cf. CIC, can. 214), motivos que podem dar ocasião a dúvidas reais e fundadas sobre a plena liberdade e responsabilidade do candidato ao sacerdócio e sobre a sua idoneidade para o estado sacerdotal, de modo a libertarem-se todos aqueles que um processo judiciário cuidadoso demonstre não serem realmente aptos.

Justiça e caridade da Igreja

85. As dispensas que vêm a ser concedidas, numa percentagem verdadeiramente mínima em relação ao grande número de sacerdotes sãos e dignos, ao mesmo tempo que provêem com justiça à saúde espiritual dos indivíduos, demonstram também a solicitude da Igreja pela defesa do celibato e pela fidelidade integral de todos os seus ministros.

Ao fazer isto, a Igreja procede sempre com amargura no coração, especialmente nos casos particularmente dolorosos nos quais a recusa de levar dignamente o suave jugo de Cristo se deve a uma crise de fé ou a fraquezas morais, e é por isso, muitas vezes, responsável e escandalosa.

Doloroso apelo

86. Oh, se estes sacerdotes soubessem quanta dor, quanta desonra, quanta perturbação causam à santa Igreja de Deus, se refletissem na solenidade e beleza dos compromissos assumidos, e nos perigos que enfrentarão nesta vida e na futura, seriam mais cautelosos e reflexivos ao tomar suas decisões, mais solícitos na oração e mais lógicos e corajosos em prevenir as causas do seu colapso espiritual e moral.

Interesse materno da Igreja

87. A Igreja volta-se com particular interesse para os casos dos sacerdotes ainda jovens que tinham iniciado com entusiasmo e com zelo a sua vida de ministros de Cristo. Não será talvez fácil que hoje, no meio da tensão dos deveres sacerdotais, tenham eles momentos de desconfiança, de dúvida, de paixâo, de loucura? É por isso que a Igreja deseja que se tentem, sobretudo nestes casos, todos os meios persuasivos, para levar o irmão vacilante à calma, à confiança, ao arrependimento, à perseverança, e só quando o caso não apresenta nenhuma solução possível, permite que o infeliz ministro seja demitido do ministério que lhe tinha sido confiado.

Concessão de dispensas

88. No caso em que ele demonstrasse ser irrecuperável para o sacerdócio, mas apresentasse ainda algumas boas e sérias disposições para viver cristãmente como leigo, a Sé Apostólica, estudadas todas as circunstâncias de acordo com o Ordinário ou o Superior Religioso, deixando ao amor vencer a dor, satisfaz algumas vezes os pedidos de dispensa, mas não sem acompanhá-la da imposição de obras de piedade e de reparação, a fim de que permaneça no filho, infeliz mas sempre caro, um sinal salutar da dor maternal da Igreja e uma lembrança mais viva da necessidade comum da divina misericórdia.

Encorajamento e aviso

89. Tal disciplina, ao mesmo tempo severa e misericordiosa, inspirando-se sempre na justiça e na verdade, em suma prudência e reserva, contribuirá sem dúvida para confirmar os bons sacerdotes no propósito de vida intemerata e santa, e será aviso aos aspirantes ao sacerdócio, para que, sob a sábia direção dos educadores, avancem para o altar com plena consciência, com sumo desinteresse, com desejo ardente de corresponderem à graça divina e à vontade de Cristo e da Igreja.

Consolações

90. Não queríamos, enfim, deixar de dar graças ao Senhor, com profunda alegria, ao reconhecermos que muitos daqueles que infelizmente foram infiéis por algum tempo às suas obrigações, reencontraram, com a graça do Sumo Sacerdote, o caminho justo e, para alegria de todos, voltaram a ser ministros exemplares, depois de terem recorrido com boa vontade comovedora a todos os meios idôneos e principalmente à intensa vida de oração, de humildade e de contínuos esforços sustentados pela freqüência do sacramento da penitência.



IV. PATERNIDADE DO BISPO

Bispo e sacerdotes

91. Os nossos caríssimos sacerdotes têm o direito e o dever de encontrar em vós, veneráveis irmãos no Episcopado, auxílio valiosíssimo e insubstituível para a observância mais fácil e mais feliz dos deveres assumidos. Fostes vós que os aceitastes e destinastes ao sacerdócio, vós quem lhes impusestes as mãos sobre as cabeças, convosco estão aparentados pela honra do sacerdócio e pela virtude do Sacramento da Ordem, representam-vos na comunidade dos fiéis, estão unidos a vós, com magnanimidade e confiança, tomando sobre si, na medida do seu grau, os vossos encargos e a vossa solicitude. [44] Escolhendo o celibato, eles seguiram o exemplo dos Prelados do Oriente e do Ocidente, em vigor desde a antiguidade. E este é novo motivo de comunhão entre o Bispo e o sacerdote, e deve ser fator propício para essa comunhão ser vivida mais intimamente.

Responsabilidade e caridade pastoral

92. A ternura de Jesus pelos seus apóstolos manifestou-se toda, com plena evidência, ao fazê-los ministros do seu Corpo real e místico (cf. Jo cc. 13-17). Também vós, em quem "está presente no meio dos fiéis o Senhor Jesus Cristo, Pontífice Máximo", [45] conheceis o dever de dar o melhor do vosso coração e da vossa solicitude pastoral aos sacerdotes e aos que se preparam para sê-lo. [46] De nenhum outro modo podereis manifestar melhor esta vossa convicção do que por meio da responsabilidade consciente e da caridade sincera e insuperável com que haveis de orientar a educação dos futuros ministros do altar e ajudar com todos os meios os sacerdotes a manterem-se fiéis à vocação e ao cumprimento dos próprios deveres.

O coração do Bispo

93. A solidão humana do sacerdote, lacuna que é a origem não última de tentações e desânimos, há de ser preenchida sobretudo pela vossa presença ativa, fraterna e amiga. [47] Antes de serdes superiores e juízes dos vossos sacerdotes, haveis de ser mestres, pais, amigos, e irmãos bons e misericordiosos, prontos para os compreender, para os desculpar, para os ajudar. Procurai de todos os modos que os sacerdotes vos dediquem amizade pessoal e levai-os a abrirem-se confiadamente convosco, sem que esta amizade e confiança suprimam a relação de obediência jurídica; devem, pelo contrário superá-la dentro da caridade pastoral, para que essa obediência seja mais voluntária, mais leal e mais segura. A amizade dedicada e a confiança filial convosco, levarão os sacerdotes a abrir-vos, a tempo, as suas almas, a confiar-vos as dificuldades, na certeza de poderem contar sempre com o vosso coração, para nele depositarem mesmo as possíveis derrotas, sem o temor servil do castigo, mas esperando como filhos, correção, socorro e perdão, o que os irá estimular a retomarem confiadamente o árduo caminho da vida.

Autoridade e paternidade

94. Todos Vós, Veneráveis Irmãos, estais certamente persuadidos de que o restituir à alma sacerdotal a alegria e o entusiasmo pela própria vocação, a paz interior e a salvação, é ministério urgente e glorioso que tem influxo incalculável numa multidão de almas. Se em determinado momento fordes obrigados a recorrer à vossa autoridade e à justa severidade para com os poucos que, contra a vossa vontade, causam escândalo ao Povo de Deus com a sua conduta, procurai ter em vista, antes de tudo, a sua recuperação ao tomardes as providências necessárias. À imitação do Senhor Jesus Cristo, Pastor e Bispo das nossas almas (1 Pd 2,25), não quebreis a cana fendida e não apagueis a mecha que fumega (Mt 12,20). Curai, como Jesus, as chagas (cf. Mt 9,12), salvai o que se tenha perdido (cf. Mt 18,11), buscai com ânsia e amor a ovelha desgarrada e trazei-a ao calor do redil (cf. Lc 15,4ss.), procurai, como Ele, até ao fim, chamar uma vez mais o amigo infiel (cf. Lc 22,48).

Magistério e vigilância

95. Temos a certeza, Veneráveis Irmãos, que não deixareis de experimentar todos os meios para cultivar assiduamente no vosso clero, com doutrina e zelo de pastores, o ideal do celibato, e que não perdereis nunca de vista os sacerdotes que abandonaram a casa de Deus, que é a sua própria casa, pois eles serão para sempre vossos filhos, seja qual for o desfecho da sua dolorosa aventura.



V. A PARTE DOS FIÉIS

Responsabilidade de todo o Povo de Deus

96. A virtude sacerdotal é um bem de toda a Igreja, é riqueza e glória que, não sendo humanas, redundam em edificação e benefício de todo o Povo de Deus. Queremos, por isso, dirigir esta nossa afetuosa e premente exortação a todos os fiéis, nossos filhos em Cristo, para que também eles se sintam responsáveis pela virtude destes irmãos que assumiram a missão de servi-los no sacerdócio para os levar à salvação. Rezai e trabalhai pelas vocações sacerdotais, ajudai os sacerdotes com dedicação e amor filial, com dócil cooperação a eles dada, com a intenção bem determinada de oferecer-lhes o conforto da alegre correspondência aos seus cuidados pastorais. Animai estes vossos pais em Cristo a superarem as diversas dificuldades que encontram no cumprimento fiel dos deveres, para a edificação do mundo. Cultivai, com espírito de fé e de caridade cristã, profundo respeito pelo sacerdote, de modo particular na condição de homem totalmente consagrado ao serviço de Deus e da Igreja.

Convite aos leigos

97. O nosso convite dirige-se particularmente àqueles leigos que buscam mais assídua e intensamente a Deus, e tendem à perfeição cristã na vida secular: podem ser de grande auxílio aos sacerdotes com dedicada e cordial amizade. De fato, os leigos estando inseridos na ordem temporal e, ao mesmo tempo, empenhados na mais generosa e perfeita correspondência à vocação batismal, têm possibilidade de, nalguns casos, iluminar e confortar o sacerdote que, imerso no ministério de Cristo e da Igreja, poderia vir a sofrer dano na integridade da vocação, devido a certas situações e a um turvo espírito mundano. Deste modo, todo o Povo de Deus honrará o Senhor Jesus Cristo naqueles que o representam e dos quais Ele disse, prometendo recompensa certa àqueles que de algum modo, exercerem a caridade para com os seus enviados (Mt 10,42): "Quem vos recebe, a Mim me recebe; e quem me recebe, recebe ao que me enviou" (Mt 10,40).



CONCLUSÃO

Intercessão de Maria

98. Veneráveis Irmãos, Pastores do rebanho de Deus espalhado pelas diversas partes do mundo, caríssimos sacerdotes irmãos e filhos nossos, para concluir esta carta que vos dirigimos de alma aberta a toda a caridade de Cristo, convidamo-vos a voltardes confiadamente os olhos e o coração para a dulcíssima Mãe da Igreja, invocando, com renovada e filial confiança, a sua materna e poderosa intercessão em favor do sacerdócio católico. Nela, o Povo de Deus admira e venera o tipo e a figura da Igreja, na ordem da fé, da caridade e da perfeita união com Cristo. Maria, Virgem e Mãe, alcance para a Igreja, que também é chamada mãe e virgem, [48] a graça de poder gloriar-se, humildemente e sempre, da fidelidade dos sacerdotes ao sublime dom da virgindade, e de vê-lo florescer e ser cada vez mais apreciado, em todos os ambientes, para que engrossem as fileiras dos que acompanham o Cordeiro por onde quer que Ele vá (cf. Ap 14,4).

Firme esperança da Igreja

99. A Igreja proclama altamente esta sua esperança em Cristo: tem consciência da dramática escassez de sacerdotes em relação às necessidades espirituais da população do mundo, mas espera firmemente, fundada nos recursos infinitos e misteriosos da graça, que a qualidade espiritual dos seus ministros há de produzir também o seu aumento em número, pois a Deus tudo é possível (cf. Mc 10,27; Lc 1,37).

Nesta fé e nesta esperança, a bênção apostólica que de todo o coração vos concedemos, seja para todos vósaugúrio de graças celestes e testemunho da nossa paternal benevolência.

Dado em Roma, junto de S. Pedro, a 24 de junho, festa de S. João Batista, do ano 1967, quinto do nosso pontificado.



PAULUS PP. VI



Notas

[1] Carta de 10 de outubro de 1965 a Sua Eminência o Card. E. Tisserant, lida na Congr. Ger.146 de 11 de outubro.

[2] Conc. Ecum. Vat. II, Decreto Christus Dominus, n. 25; Apostolicam actuositatem, n. l; Presbyterorum Ordinis, nn.10,11; Ad Gentes, nn. l9-38.

[3] Conc. Ecum. Vat. II, Const. Gaudium et Spes, n. 62.

[4] Decr. Presbyterorum Ordinis, n.16.

[5] Conc. Ecum. Vat. II, Const Dogm. Dei Verbum, n. 8.

[6] Conc. Ecum. Vat. II, Const. Dogm. Lumen Gentium, n. 28; Decr. Presbyterorum Ordinis, n. 2.

[7] Decr. Presbyterorum Ordinis, n.16.

[8] Decr. Presbyterorum Ordinis, n.16.

[9] Const. Lumen Gentium, n. 42.

[10] Cf. Const. dogm. Lumen Gentium, n. 42; Decr. Presbyterorum Ordinis, n.16.

[11] Decr. Presbyterorum Ordinis, n.14.

[12] Cf. Decr. Presbyterorum Ordinis, n.13.

[13] Decr. Presbyterorum Ordinis, n. 5.

[14] Decr. Optatam Totius, n.10.

[15] Decr. Presbyterorum Ordinis, n. l6.

[16] Const. past. Gaudium et Spes, n. 39.

[17] Const. dogm. Lumen Gentium, n. 5.

[18] Const. dogm. Lumen Gentium, n. 48.

[19] Conc. Ecum. Vat. II, Decr. Perfectae Caritatis, n.12.

[20] Cf. Tertuliano, De exhort. castitatis, 13: PL 2,930; S. Epifânio, Adv. haer. II, 48,9 e 59, 4: PG41,869,1025; S. Efrém, Carmina nisibena., XVIII, XIX, ed. G. Bickell, Leipzig 1866, p. 122; Eusébio de Cesaréia, Demonstr. evang. 1,9: PG 22,81; S. Cirilo de Jerusalém, Catech.12,25: PG 33, 757; S. Ambrósio,De offic ministr. 1,50: PL 16,97 ss.; S. Agostinho, De moribus Eccl. cathol.1,32: PL 32,1939; S. Jerônimo,Adv. Vgilant, 2: PL 23,340-41; Sinésio Bispo de Toulon, Epist. 105: PG 66,1485.

[21] A primeira vez no Concílio de Elvira em Espanha (c.a. 300), c. 33: Mansi II,11.

[22] Sess. XXIV, can. 9-10.

[23] S. Pio X, Exhort. Haerent animo, 4 ag.1908, AAS 41,1908, pp. 555-577; Bento XV, Carta ao Arceb. de Praga F. Kordac. 29 jan.1920, AAS 12,1920, p. 57s.; Alloc. consist. 16 dic.1920, AAS 12,1920, pp. 585-588; Pio XI, Enc. Ad catholici sacerdotii, 20 dic.1935, AAS 28,1936, pp. 24-30; Pio XII, Adhort. Ap. Menti Nostrae, 23 set.1950, AAS 42,1950, pp. 657-702; Enc. Sacra virginitas, 25 março 1954, AAS 46,1954, pp.161-191; João XXIII, Enc. Sacerdotii Nostri primordia,1 ag.1959, AAS 51,1959, pp. 554-556.

[24] Aloc. II ao Sínodo Romano, 26 janeiro 1960, AAS 52,1960, pp. 235-236 (texto lat. p. 226).

[25] Can. 6,12,13,48: Mansi XI, 944-948, 965.

[26] Decr. Presbyterorum Ordinis, n.16.

[27] De Virginitate, l3: PG 46, 381-382.

[28] De Sacerdotio, l, II, 4, PG 48,642.

[29] Const. dogm. Lumen Gentium, nn. 21,28,64.

[30] Const. cit., n. 29.

[31] Const. cit., n. 42.

[32] Decr. Presbyterorum Ordinis, n.16.

[33] Decr. Optatam Totius, n. 2; Presbyterorum Ordinis, n. 11.

[34] Confes., X, 29,40: PL 796.

[35] Cf.1 Tes 2,11;1 Cor 4,15; 2 Cor 6,13; Gl 4,19;1 Tm 5,1-2.

[36] Decr. Presbyterorum Ordinis, n. 3.

[37] Decr. Optatam Totius, nn. 3-11; Cf. Perfectae Caritatis, n.12.

[38] S. Tomás d'Aquino, Summa Th., IIa IIae, q.184, a. 8c.

[39] Decr. Optatam Totius, n.12.

[40] Decr. Presbyterorum Ordinis, nn.16,18.

[41] Decr. Presbyterorum Ordinis, n.18.

[42] Decr. Presbyterorum Ordinis, n. 8.

[43] Decr. cit., ibid.

[44] Const. Dogm. Lumen Gentium, n. 28.

[45] Const. Dogm. Lumen Gentium, n. 21.

[47] Decr. Presbyterorum Ordinis, n. 7.

47. Decr. cit., ibid.

[48] Const. dogm. Lumen Gentium, nn. 63, 64.



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