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quarta-feira, 9 de dezembro de 2015

O exercício do dom de si (Práticas concretas para a busca da santidade na vida cotidiana)

O exercício do dom de si 


Pe. Joseph Schrijvers

Quando a alma de boa vontade se doou a Deus, estão lançados os alicerces do seu edifício espiritual. Só falta construir, isto é, renovar constantemente essa disposição. É o exercício do dom de si, que se pratica com a mesma simplicidade, com a mesma serena mansidão com que a alma interiormente livre cumpre seus deveres.

Logo pela manhã, ao despertar, a alma eleva-se a Deus, oferece-lhe todo o seu ser e pede-Lhe que disponha dela como lhe aprouver. Este ato substitui longas orações. É uma aceitação amorosa de tudo o que vier a acontecer no dia, seja doce ou amargo, agradável ou penoso. É uma alegre disposição de tudo fazer e sofrer para agradar a Deus.
A alma esforça-se por manter-se tranquilamente nessa disposição essencial e repete de tempos em tempos o seu oferecimento. Assim recolhida em Deus, entrega-se à oração e ao trabalho segundo as exigências de seu estado.
Durante seus afazeres, permanece senhora de si, agindo sem frouxidão e sem precipitação, não se deixando dominar pelo frenesi de acabar de pressa, nem pela vontade de conquistar estima alheia, nem pelo prazer que encontra na sua ocupação.

Já não se pertence mais, é inteiramente do seu Senhor, também não pertence aos outros, nem se deixa escravizar pelo seu trabalho, pois este não é um fim, mas apenas um meio. Inicia as suas ocupações sem paixão, continua-as com toda a paz, termina-as sem pressas, sabendo que, depois desse trabalho outros virão. Para acalmar a sua impaciência, repete muitas vezes: “Enquanto executo esta tarefa, não devo cumprir outra; enquanto estiver aqui pela vontade de Deus, não sou obrigado a estar em outro lugar.”

Inteiramente senhora de si, executa de coração livre os seus deveres, uns após os outros, e esta liberdade interior permite-lhe empreender com mente clara a atenção contínua, sem fatiga ou precipitação, sem desânimo ou preguiça.

Os homens verdadeiramente ativos são os que menos o aparentam. Os agitados, os apressados, não fazem quase nada. Começam, mas não acabam. Após o trabalho, ficam com o coração inquieto, o espírito oprimido e incapaz de pensar em Deus. A alma simples, pelo contrário, imita Deus, parece sempre em repouso e está sempre ativo.

Assim, a alma prossegue em seus trabalhos diários armada do seu ato de doação. Repete-o em cada ação que realiza, a cada dificuldade que surge, a cada sofrimento que lhe sobrevém, a cada alegria ou desgosto que experimenta. Tem o seu modo próprio de resistir as tentações e de afastar as distrações. Mal se apresentam, não as afugenta diretamente, como se fossem moscas, mas despreza-as contentando-se em repetir: “Senhor, auxiliai-me.” Um gesto de amor, eis a sua resposta às sugestões do demônio. Aliás, não será tentada por muito tempo: o inimigo sabe que cada tentação provoca um novo impulso do coração de Jesus.
Da mesma forma, acolhe por um simples ato de amor as contrariedades, as cruzes, os sofrimentos de cada dia. Por mais opressivos que sejam, os contratempos nada mais fazem do que provocar atos de amor.

O descanso não interrompe o seu relacionamento com Deus. Distrai-se com o coração livre, pois sabe que Deus quer que descanse. Nunca se abandona a uma alegria vã e desmedida. Tudo nela é moderado. Diverte-se como a criança sob o olhar materno. Só recorda-se de que Deus está nela, que a vê e que ama.

Toma as refeições com inteira liberdade de espírito, sem se preocupar com a qualidade do cardápio. Porventura não lhe vem tudo das mãos de Deus? Só dá atenção a esse bom Pai que ama ternamente, e não se preocupa com o resto.

Enfim, chegada a noite e concluídos os trabalhos do dia, enquanto adormece, ainda murmura uma palavra de abandono, mais comovido, mais profundo, se possível, para reparar as faltas cometidas e suprir as omissões do dia. Depois adormece em paz, sob o olhar do seu Senhor, que vela por ela.

Pe. Joseph Schrijvers – retirado do livro “O dom de si – vida de abandono em Deus”


P.S.: O sub-título entre parênteses foi acrescentado na edição feita pelo blog. Ajude a compartilhar, leve esta profunda e eficaz mensagem para mais pessoas, os menores atos feitos com boa vontade geram frutos gigantescos para a maior Glória de Deus.

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2015

Um bom exame de exame de consciência para nós católicos:

"Vejo-te, cavalheiro cristão (dizes que o és), beijando uma imagem, mascando entre dentes umas oração vocal, clamando contra os que atacam a Igreja de Deus..., e até frequentando os Santos Sacramentos.


Mas não te vejo fazer um sacrifício, nem prescindir de certas conversas... mundanas (podia, com razão, aplicar-lhes outro qualificativo), nem ser generoso com os inferiores...- nem com a Igreja de Cristo! -, nem suportar uma fraqueza do teu irmão, nem abater a tua soberba pelo bem comum, nem desfazer-te do teu forte invólucro de egoísmo, nem... tantas coisas mais!

Vejo-te... Não te vejo... - E tu... dizes que és um cavalheiro cristão? - Que pobre conceito fazes de Cristo!" 

São Josemaria Escrivá - "Caminho, pt. 683"


Se possível, passe a diante. Obrigado.


terça-feira, 16 de setembro de 2014

O homem católico e o namoro

Por Maria Tereza Colares


Comecei a perceber que as vantagens de um relacionamento cristão eram muito maiores do que eu imaginava no consultório da minha terapeuta, quando ela me perguntou se eu não queria namorar por medo de uma possível relação sexual e, assim, ela descobriu que o namoro pelo qual ela tanto lutava para que saísse do impasse seria bem diferente do que habitual. 


“Católica”, entre aspas mesmo, como estamos acostumados, usou da minha escolha para me mostrar o quanto eu tinha sido agraciada por encontrar quem levasse Deus a sério: “Menina, homens religiosos são garantia de felicidade! Levam o namoro a sério, sabem amar, respeitar e tratar bem, são mais carinhosos e, quando é o caso, têm casamentos duradouros e felizes”, esse foi o discurso que eu escutei por bastante tempo, até o bendito sim.

Durante o namoro, não são poucas as vezes que chegam aos meus ouvidos coisas como “Queria um namoro igual ao seu!”, “Como você é abençoada por ter um namorado assim”, “Que lindo o namoro de vocês!”, “Claro que você não é insegura, ele nunca faria nada de mal pra você.” Fora as diversas vezes que eu não pude ajudar em uma situação difícil porque “Você nunca vai entender, o seu namoro não passa por isso!”.

Mas por quê? Por que ter um namoro em que Deus é a base é garantia de felicidade? Por que um namoro alicerçado nos ensinamentos da Igreja é tão leve, seguro e cheio de amor? E a resposta é simples: porque é por Ele e para Ele.

Existe uma frase que diz mais ou menos assim: “O amor imperfeito é muito frágil e fácil de ser traído, mas O Amor Perfeito, não”. Quando um homem vive em amizade com o Senhor, não é por sua namorada que ele permanece fiel, firme na batalha pela pureza, pelo amor e pela doação de si mesmo, é por Deus, o Amor Perfeito e, ir pra longe Daquele que o coração busca sem cessar, é ir contra si. Ser fiel a quem não corresponde as nossas expectativas incontáveis vezes é muito difícil, mas quando o Amor (assim, maiúsculo) entra em cena, tudo muda.

Quanto mais aconchegado no Sagrado Coração um homem estiver, maior vai ser a capacidade dele de amar, e amar com um amor que vem direto do Céu, capaz de superar qualquer coisa e de permanecer firme até o fim! Um amor generoso, que não busca felicidade e sim fazer feliz. Amor puro e pleno, que foi provado pelo fogo das renuncias, do não receber nada em troca e que se torna sobrenatural, amor de corpo e alma. Um amor que conta com a graça do Cristo para que seja como o amor Dele por nós, que entrega, sem reservas, a própria vida. 

Como não ser feliz experimentando tão grande amor? Como não confiar em um homem que é capacitado, a todo instante, por Nosso Senhor? Como entrar em crise, se o que Deus planeja é perfeito? Como não ser eterno, se foi feito para a Eternidade?

Namorar um Homem Católico é muito mais do que não ser traída, ter um relacionamento duradouro e feliz: é ser amada pelo próprio Amor através do coração de um Homem.





Leia mais sobre o assunto acessando estes textos abaixo:

















quarta-feira, 23 de julho de 2014

A mulher moderna e a pomba feminista


Viviam aquelas pombas irrequietas e felizes na doce paz do seu pombal. Todas as manhãs voavam ao campo, com o pescoço irisado pelo sol, e bicavam os grãos da foice do ceifeiro. À noite o pombal dava-lhes abrigo e calor e, ali no ninho escondido na parede, ouviam alegremente o pio de seus filhotes. Não careciam de nada; tinha tudo; viviam ditosas e morriam tranquilas. Mas, eis que um dia apareceu no pombal uma pomba revolucionária. Vinha de outras terras, onde as pombas sacrificavam a felicidade à liberdade, e falou-lhes desta maneira:

-- Companheiras, viveis dois séculos atrasadas com respeito às pombas de outros países. Basta de clássicas submissões, de vida aborrecida e estéril. Por que havemos de ser inferiores às patas? Elas podem ir a esterqueira, e nós temos medo de nos mancharmos; elas podem banhar-se até na água suja e nós não temos coragem de meter-nos no rio. Para que defender tanto a nossa alvura, a nossa pureza? Isso são preconceitos da Idade Média! Cada uma faça o que bem entender, pois para isso é dona do seu corpo e de sua vida. Vamos a esterqueira! Ao charco!

Todas as pombas incautas aplaudiram a estrangeira agitando as asas. Dirigidas pela revolucionária, voaram para um pântano infecto que se via a distância. Enlambuzaram-se, revolveram-se no lodo com grande algazarra e... não vos direi como saíram dali as pombas!

Assim, caros leitores, viviam nossas ditosas e tranquilas mulheres. No ninho do seu lar viviam em paz a vida do trabalho e do amor. Mas a civilização revolucionária começou a cantar seu canto de sereia assim: -- Como! Estareis toda a vida fechadas em casa? E escravas dos homens? Basta, basta já de submissões! Não vedes como se chegou, em outros países, à emancipação da mulher? Abandonai os vossos preconceitos medievais! A mulher é dona do corpo e de sua vida. Por que sacrificar à alvura da pureza todas as alegrias do prazer? Ao charco! Ao pântano!

E as mulheres modernas lançaram-se e revolveram-se no charco da vida... e, não vos direi como saem dele as mulheres de hoje!

Fonte: Fonte: “Tesouro de Exemplos”, compilado por Pe. Francisco Alves, C.SS.R. - Ed. Vozes


Nota do blog: O título original do texto, como está no livro, é apenas “A mulher moderna”, complementamos o titulo na postagem do blog para ressaltar mais uma vez os males que o feminismo trouxe para a vida das mulheres e consequentemente para toda a sociedade.


sábado, 19 de julho de 2014

A moça que vale 1 milhão

Aquele rapaz, ótimo congregado mariano, estava para ficar noivo. Por medida de prudência, depois de ter rezado e consultado os pais, foi aconselhar-se com o pároco. Querendo anotar as qualidades da moça, o padre tomou uma folha de papel e um lápis.
-- Ela tem um dote apreciável, é rica – disse o rapaz.
O vigário escreveu um 0 (zero)
-- É também muito bela.
Outro zero.
-- Além disso, sabe piano e pintura.
Terceiro zero.
-- Dá pra boa dona de casa.
Quarto zero.
-- A família dela é respeitável.
Quinto zero.
-- Finalmente, possui diploma.
Sexto zero.
-- Ah, senhor padre, esquecia-me de dizer que é excelente cristã.
Agora, colocando à esquerda daqueles zeros o algarismo 1 e mostrando o papel ao rapaz, disse:
-- Vai, vai tranqüilo e casa-te com ela, porque vale 1 000 000 (1 milhão)!
Riquezas, dotes, nobreza, se faltar religião, valem tanto quanto zero. Ser religiosa, eis a primeira e principal qualidade apreciável da mulher.

Fonte: “Tesouro de Exemplos”, compilado por Pe. Francisco Alves, C.SS.R. - Ed. Vozes




terça-feira, 14 de janeiro de 2014

O apóstolo deve possuir uma ardente devoção a Nossa Senhora


Retirado do livro A Alma de Todo Apostolado

Sendo membro da Ordem de Cister e filho de São Bernardo, não posso deixar de dizer que o santo Abade de Claraval atribuía a Maria todos os seus progressos na união com Jesus e todas as suas vitórias no apostolado.
Todos sabem o que foi o apostolado do mais ilustre dos filhos do patriarca São Bento, sobre os povos, os reis, os concílios, e até sobre o coração dos Papas. Todos exaltam a santidade, o gênio, a ciência e a unção dos escritos do último dos Padres da Igreja. Porém, o que, sobretudo, sintetiza a admiração dos séculos pelo santo doutor, é o título de “cantor de Maria”, que lhe foi outorgado.
Este incomparável apóstolo da Europa, não foi excedido por nenhum outro daqueles que celebraram as glórias da Mãe de Deus. Grandes santos, como São Bernardino de Sena, São Francisco de Sales, Santo Afonso de Ligório, São Luís de Montfort, e outros, não deixaram de ir beber os tesouros de São Bernardo, quando quiseram falar da Virgem Maria.
“Vejamos, meus irmãos —diz o santo doutor— quais os sentimentos de devoção, com que Deus quis que honrássemos Maria, Ele que pôs n’Ela toda a plenitude dos seus bens. Se, em nós, existe qualquer esperança, qualquer graça, qualquer penhor de salvação, reconheçamos que tudo isso jorra sobre nós d’Aquela que está cumulada de delícias (…) Tirai esse sol que alumia o mundo, e deixará de haver dia. Tirai Maria, essa estrela do mar, do nosso grande e imenso mar, e que fica senão profunda escuridão, sombras de morte e trevas espessas? É, pois, do fundo dos nossos corações e das nossas entranhas, e com os nossos melhores anseios que devemos honrar a Virgem Maria; pois tal é a vontade d’Aquele que quis que tudo tivéssemos por meio d’Ela”.[1]
Apoiados nesta doutrina, não hesitamos em dizer que, se a atividade do apóstolo não se fundar numa especialíssima devoção a Nossa Senhora, arrisca-se, seriamente, a construir sobre a areia.

a) Para a vida interior pessoal.
O apóstolo será insuficientemente devoto de Nossa Senhora, se não tiver confiança filial e amorosa na Mãe de Deus, ou se apenas for exterior o culto que lhe prestar. Para sermos seus verdadeiros filhos, o nosso amor deve corresponder ao dela; devemos estar firmemente convencidos das grandezas, privilégios e funções da Mãe de Deus e dos homens; devemos estar compenetrados de que a luta contra as faltas, a aquisição das virtudes, o reinado de Jesus Cristo nas almas, dependem do grau de devoção que tivermos a Maria; [2] devemos estar compenetrados de que a vida interior é mais segura, mais suave e mais rápida, quando se opera com Maria; [3] devemos transbordar de confiança filial e de amor pela Medianeira de todas as graças. [4] 
Todos estes sentimentos se encontravam em alto grau no coração do exemplar apóstolo que foi São Bernardo. Quem não conhece as palavras que brotaram da alma deste santo abade, quando, ao explicar aos seus monges o Evangelho Missus est, exclamou:
“Ó tu que compreendes que, no fluxo e refluxo deste mundo, flutuas entre ressacas e tempestades e não caminhas em terra firme, fixa os teus olhos sobre essa estrela, para não pereceres na tormenta. Se os ventos das tentações se desencadearem, se fores de encontro aos escolhos das tribulações, olha para a estrela, invoca Maria! Se te vires sacudido pelas ondas do orgulho, da ambição, da maledicência, da inveja; olha para a estrela, invoca Maria! Se a cólera, a avareza, ou a cobiça assaltarem a frágil barquinha da tua alma, ergue os olhos para Maria! Se, acabrunhado pela enormidade das tuas faltas, confundido pelas hediondas chagas da tua consciência, horrorizado pelo pavor do juízo, começares a ser absorvido pelos abismos da tristeza e do desespero, pensa em Maria! Nos perigos, nas angústias, nas dúvidas, pensa em Maria, invoca Maria! Jamais saia Maria dos teus lábios; jamais fique Maria longe do teu coração; e, para obteres o bom despacho das tuas preces, não olvides o exemplo da sua vida. Seguindo-a, não te desviarás; invocando-a, não desesperarás; contemplando-a, não errarás. Por ela amparado, nunca cairás; sob a sua proteção, nada te causará temor; guiado por ela, nunca te cansarás; se ela te for propícia, chegarás, certamente, ao bom porto.”
Não querendo alongar-me, mas desejando facultar aos apóstolos um resumo dos conselhos de São Bernardo, para quem quiser ser verdadeiro filho de Maria, aconselho-os, fraternalmente, a lerem com atenção o precioso livro: “La vie spirituelle, à l’école du Bienheureux Grignion de Montfort”, escrito pelo Padre Lhoumeau, superior geral dos Monfortinos.[5]
Esta obra sólida, do ponto de vista teológico, mas, ao mesmo tempo, prática e cheia de unção, reflete, maravilhosamente, o pensamento de São Bernardo. Nada lhe falta para alcançar os resultados tão desejados pelo abade de Claraval: afeiçoar o coração dos seus filhos à imagem do seu e dar-lhes o carácter dominante dos autores cistercienses: a necessidade do recurso habitual a Maria e a vida de união com ela.
Terminemos com as palavras consoladoras que a admirável cisterciense Santa Gertrudes ouviu dos lábios da Santíssima Virgem: “Não se diga que o meu dulcíssimo Jesus é meu Filho único, mas meu primogênito. Foi Ele quem eu concebi primeiro, no meu seio, mas, por Ele, concebi, depois, a todos vós para serdes seus irmãos e meus filhos, adotando no seio do meu amor maternal”.

b) Quanto à fecundidade do apostolado.
Como diz São Paulo, quando o apóstolo tira as almas do pecado e as faz crescer na virtude, está a gerar nelas o próprio Cristo. Por conseguinte, se Jesus Cristo veio ao mundo por meio da Santíssima Virgem, também é por meio dela que Ele deve ser gerado nas almas dos seus filhos.
Esquecer Maria no apostolado seria desconhecer uma parte essencial do plano divino. “Todos os predestinados —diz Santo Agostinho— estão neste mundo ocultos no seio da Santíssima Virgem, onde crescem, são guardados e alimentados por esta boa Mãe, até nascerem para a glória, depois da morte.”
“Após a Encarnação —conclui justamente São Bernardino de Sena— Maria adquiriu uma espécie de jurisdição sobre a missão temporal do Espírito Santo, de tal modo que as criaturas só recebem graças pelas mãos d’Ela”. Por sua vez, o verdadeiro devoto de Maria torna-se omnipotente sobre o Coração da sua Mãe. O seu apostolado é eficacíssimo, pois dispõe da omnipotência de Maria sobre o sangue infinitamente precioso do Redentor. Por isso, todos os grandes conquistadores de almas têm extraordinária devoção à Santíssima Virgem. A força com que conseguem persuadir as almas a abandonar o pecado, e a abraçarem a virtude, vem-lhes do horror ao mal e o amor à pureza daquela que a si mesma se chamou Imaculada Conceição.
Ao ouvir a dulcíssima voz de Maria, São João Baptista reconheceu a presença de Jesus, e exultou de alegria no seio de Santa Isabel. Os verdadeiros filhos de Nossa Senhora sabem, também, encontrar as palavras capazes de tocarem os corações mais empedernidos e abri-los para Jesus; sabem encontrar, com o auxílio da Mãe de Misericórdia, a palavra que salva do desespero e abre as almas para as vias da confiança; sabem colocar os pecadores nas mãos daquela que é o seu Refúgio seguro e a sua verdadeira Mãe.
São João Baptista Vianney encontrou, por vezes, pecadores que se escudavam em práticas exteriores de devoção à Santíssima Virgem, para calarem a própria consciência, pecarem mais facilmente e não temerem a justiça de Deus. A palavra incisiva do santo pároco de Ars revelava-lhes, contudo, a injúria que estavam a fazer à Mãe de Misericórdia, e levava-os a servirem-se dessas mesmas práticas de devoção para implorarem e, assim, obterem a graça da conversão.
Em caso igual, um apóstolo pouco devoto de Maria, poderia facilmente levar o pobre náufrago a abandonar tais práticas que talvez fossem a sua única tábua de salvação.
Se Maria viver no coração do apóstolo, ele conseguirá ter a eloquência maternal que toque as almas mais duras. Dir-se-ia que, por uma delicadeza admirável, Nosso Senhor reserva para a sua Mãe as conquistas mais difíceis e só as concede aos verdadeiros devotos de Maria. O verdadeiro filho de Nossa Senhora nunca carecerá de argumentos, meios e expedientes, quando haja de animar os fracos e consolar os inconsoláveis.
O decreto pontifício que acrescentou à Ladainha Lauretana a invocação: “Mãe do bom conselho”, funda-se nos títulos de “Tesoureira das graças celestes” e “Consoladora universal” que Maria merece.
É aos seus verdadeiros devotos que a “Mãe do bom conselho” faculta, como em Caná, o segredo de obterem, para distribuir, o vinho da força e da alegria. Mas, sobretudo, quando é preciso falar do amor de Deus às almas, é que a “Raptora dos corações”, Raptrix cordium, conforme expressão de São Bernardo, a Esposa do Amor substancial, põe nos lábios dos seus filhos as palavras de fogo que ateiam o amor de Jesus e, por meio desse amor, fazem germinar todas as virtudes.
O verdadeiro apóstolo deve amar, apaixonadamente, aquela a quem Pio IV chamou Virgo sacerdos, cuja dignidade ultrapassa a de todos os sacerdotes e pontífices. E este amor dar-lhe-á o direito de nunca considerar perdida uma obra, se a começou com Maria e se com Ela a quer consolidar. Maria, com efeito, está na base e no topo de tudo quanto interessa ao Reino de Cristo.
Mas trabalhar com Ela não é, apenas, erguer-lhe altares ou entoar cânticos em sua honra. O que Ela quer, verdadeiramente, é que vivamos unidos a Ela, que as nossas afeições passem pelo seu Coração e que recorramos ao seu conselho e auxílio. Sobretudo, espera de nós a imitação das suas virtudes e a entrega total nas suas mãos, para que nos possa revestir do seu divino Filho.
Se recorrermos habitualmente a Maria, imitaremos aquele general do Povo de Deus que, antes de avançar contra o inimigo, dizia a Débora: “Se fores comigo, eu irei; mas, se não fores, não irei” (Jz 4, 8), e faremos, então, verdadeiramente, todas as nossas obras com Ela. E Ela entrará, não só nas decisões principais, mas também em todos os casos imprevistos e em todos os pormenores da execução da obra.
Unidos àquela, cuja invocação de Nossa Senhora do Sagrado Coração, resume, em nossa opinião, todos os outros títulos, não correremos o risco de desvirtuar as obras, permitindo que elas prejudiquem a vida interior e se tornem um perigo para as nossas almas. Pelo contrário, por meio dessas mesmas obras, progrediremos na vida interior, em união com aquela que nos assegura a posse do seu divino Filho durante toda a eternidade.

Epílogo

Depomos este modesto trabalho aos pés de Maria Imaculada.
O perfeito ideal do apostolado é o Coração da Santíssima Virgem, tal como aparece na gravura bizantina, do século VI, reproduzida neste livro. [6] 
Parece-nos a própria imagem da vida interior. A Virgem tem no peito o Verbo Encarnado. Como o Pai Eterno, conserva sempre em si o Verbo que deu ao mundo. Jesus vive n’Ela.
O Menino Jesus aparece, porém, dentro do seu Coração no ato de exercer o seu apostolado. O seu porte, o rolo do Evangelho que tem na mão esquerda, o gesto da mão direita, o seu olhar: tudo indica que está a ensinar. E a Virgem une-se à sua palavra. A expressão do seu rosto parece dizer que quer também falar. Os seus olhos grandes abertos procuram almas às quais possa comunicar o seu Filho: imagem perfeita da vida ativa, pela pregação e pelo ensino.
As suas mãos estendidas — como as dos orantes das catacumbas, ou as do sacerdote que oferece a Vítima santa sobre o altar— recordam-nos que é, sobretudo, pela oração e pela união ao sacrifício de Jesus que a nossa vida interior será profunda e o nosso apostolado dará fruto.
Ela vive da vida de Jesus, do seu amor, do seu sacrifício, e Jesus fala nela e por ela. Jesus é a sua vida e ela é o porta-voz, a custódia de Jesus. Assim deve ser a alma dedicada ao apostolado, deve viver de Deus, para poder falar eficazmente d’Ele, já que a vida ativa é apenas a vida interior a transbordar da alma.
Rainha dos Apóstolos
Salve, Virgem Mãe, receptáculo vivo do Coração de Jesus! Desta divina fonte haurimos, por vosso intermédio, o espírito de sacrifício e de oração.

Retirado do livro "A Alma de Todo Apostolado" , 
de Dom Jean-Baptiste Chautard, pg. 173 à 184 - Editora Civilização.


Recomendamos muitíssimo a leitura deste livro, recomendado por tantos, como por exemplo o Santo Padre Pio X o tinha como livro de cabeceira.

Palavras de São Pio X, durante a visita ad limina dos bispos do Canadá em 1914:

"Se quereis que Deus abençõe e torne fecundo o vosso apostolado, empreendido para a sua glória, impregnai-vos bem do espírito de Jesus Cristo, procurando adquirir uma intensa vida interior. Para este fim, nao vos posso indicar melhor guia do que "A alma de todo o apostolado" de Dom Chautard, abade cisterciense. Recomendo-vos, calorosamente, esta obra, que estimo particularmente, e da qual fiz o meu próprio livro de cabeceira".

Como adquiri-lo? Clique nos links abaixo:
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Referências:
[1] São Bernardo, Serm. in Nat. B. M. V. alias de Aquaeductu.
[2]“Ninguém recebe o dom de Deus senão por vós, ó cheia de graça” (São Germano). “A santidade cresce, em razão da devoção que se professa a Maria” (Padre Faber).
[3] “Com Maria, fazem-se mais progressos no amor de Jesus num só mês, do que em vários anos vivendo-se menos unidos a esta boa Mãe” (São Luís de Montfort).
[4] “Meus filhos, ela é a base da minha confiança e a razão da minha esperança” (São Bernardo).
[5] Livraria Oudin, Paris.

[6] A imagem que aqui reproduzimos representa a “Panaghia Parthenos”, uma das mais célebres e antigas imagens da Mãe de Deus. O original, dádiva da imperatriz Pulquéria (450-453), encontrava-se numa das mais belas e ricas igrejas de Constantinopla, e ainda aí se conservava nos fins do século XIV. Encontram-se, com bastante frequência, reproduções desta célebre pintura na Rússia, por exemplo em Kiev, Novgorod e Moscovo, bem como na Grécia.

quinta-feira, 5 de dezembro de 2013

A contrição perfeita - Uma chave de ouro do Céu



"Não devia haver cristão algum que não estivesse solidamente instruído
sobre a transcendência que tem um ato de contrição e caridade perfeita, pois que é de incalculável importância tanto para a hora da morte própria como para a dos outros, a quem talvez tenha de assistir."


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Imprima o material e leia com atenção, conheça melhor este santo meio que a Misericórdia infinita de Nosso Senhor deixou para a nossa salvação. E não deixe de compartilhar este santo material com outros irmãos na fé. Fique com Deus, que Nossa Senhora o (a) guarde sempre.




A contrição perfeita
Uma chave de ouro do Céu.

Padre J. de Driesch

NIHIL OBSTAT.
Fr. Benigno Randebrock, O.F.M. Cens.
Dioc.
IMPRIMATUR.
Bahia, 11 de Março de 1913.
Mons. Castro,
Vigário Geral
Prólogo
Tanto pela importância da matéria, de certo bem pouco conhecida da maioria dos cristãos, como pela abundância de doutrina e o interesse com que ela é tratada no que diz respeito à sua utilidade prática, bem pode dizer­se que este livrinho encerra em suas poucas páginas o valor de muitos volumes.
O grande meio de salvação chamou Santo Afonso Maria de Ligório a um livrinho que, entre muitos outros, compôs sobre a oração; e diz dele que queria vê-lo nas mãos de todos, por tratar de um meio tão principal e de tanta eficácia para assegurar o Céu às almas. Pois, com não menos verdade, ainda que em sentido algum tanto distinto, devemos dizer outro tanto da prática do amor e contrição perfeita, como sendo o grande meio de salvação, pois que está em conexão ainda mais imediata com a consecução da vida eterna do que somente a oração.
         Por isso, queria eu, como Santo Afonso com o seu, ver este livrinho nas mãos de todos, persuadido de que a sua atenta leitura e a execução prática das doutrinas que nele se ensinam, abrirão as portas do céu a muitíssimas almas, para quem, sem ele, estariam eternamente cerradas, e de que hão de acrescentar de uma maneira inesperada o direito ao Céu e à eterna bem­aventurança a muitas outras que, pela guarda da graça santificante, já são credores dele.
         Não devia haver cristão algum que não estivesse solidamente instruído sobre a transcendência que tem um ato de contrição e caridade perfeita, pois que é de incalculável importância tanto para a hora da morte própria como para a dos outros, a quem talvez tenha de assistir.
Assim, pois, ninguém deveria esquecer-se desta verdade em tempo de saúde; porém, para o tempo de enfermidade e de perigo sobretudo, é sumamente para desejar-se que a conheçam a fundo e profundamente a gravem na alma os que a têm esquecido ou só imperfeitamente a conhecem.
Oxalá, pois, se difunda o mais possível esta obrazinha, e não duvido de que a sua leitura será acompanhada de inumeráveis bênçãos do céu.
Pe. Agostinho Lehmkuhl, S.J.
Valkenburg, Colégio de Santo Inácio, outubro de 1903.
Introdução.
Ao ver o título de Chave de ouro do Céu, parece-me, amado leitor, que estarás ansioso por ver se este livrinho corresponde por dentro ao que promete por fora. Mas, pode ser que te ocorram algumas suspeitas. Talvez que, nas práticas dominicais, o teu zeloso pároco te tenha prevenido contra certas folhas e publicações supersticiosas, contra as Chaves do Céu, os Ferrolhos do Inferno, as Orações maravilhosas autênticas e contra todas as mercadorias parecidas, chamem-lhe como quiserem.
“Porém, se este livrinho é o que deve e promete ser — dirás, de ti para ti — seria ditoso, teria uma chave do Céu, de que poderia muito bem aproveitar­me”. E verdadeiramente de ouro e digna, portanto, de todo o apreço deve ser a chave que este autor me apresenta reluzente diante dos olhos. Se é de verdadeiro ouro, e não só de ouropel, estou feliz.
Sim, amado leitor, sólida e legítima é a chave e bem fácil de manejar por certo: é a contrição perfeita. Ela te abrirá, em cada dia e a cada momento, o Céu se o fechaste com o ferrolho do pecado mortal; e, sobretudo se, no fim da tua vida, como pode suceder, não tiveres nem puderes ter a teu lado o sacerdote, que é o depositário das chaves da divina misericórdia, a contrição perfeita será a última e suprema chave com que, ajudado da graça de Deus, poderás franquear-te o Céu. Porém, para isso, é preciso que te acostumes a manejá-la em vida.
Pela contrição perfeita, estão salvas no Céu inumeráveis almas que, de outro modo, se teriam perdido para sempre. Já vês, pois, que é importante, e sumamente importante, o que te recomendo neste livrinho. Por isso, dizia o douto e piedoso cardeal Franzelin: “Se eu pudesse percorrer os campos pregando a palavra divina, nenhuma outra coisa pregaria com mais freqüência do que a contrição perfeita”.
Mais adiante, no capítulo V, te direi como vim a escrever este livrinho e a percorrer assim os campos pregando a contrição perfeita. Deus Nosso Senhor, por seu amor e misericórdia, te assista com sua graça para que o compreendas, e, sobretudo, para que o pratiques, que é o que importa, conforme a sua doutrina.
Posto isto, começo em nome do Senhor.
Que é a contrição perfeita?
Contrição é uma dor da alma e uma detestação dos pecados cometidos. Deve acompanhá-la o propósito, quer dizer, uma firme vontade de emendar a vida e de não mais pecar. Para que a contrição seja legítima, deve ser interna e estar na alma, isto é‚ que não seja uma mera expressão feita com os lábios e sem reflexão: isto seria apenas contrição de boca.
Não é necessário manifestar exteriormente a contrição interna por meio de suspiros, lágrimas, etc... tudo isto pode ser sinal de contrição, não é, porém, sua essência. A essência da contrição está na alma, na vontade, em afastar-se deveras do pecado e converter-se para Deus.
Além disto, a contrição deve ser geral, quer dizer, deve estender-se a todos os pecados cometidos ou, pelo menos, a todos os mortais. Deve, finalmente, ser sobrenatural e não meramente natural, pois esta nada aproveita.
Segue-se que a contrição, como todo o bem, deve proceder de Deus e da sua graça, e, com a graça de Deus, desenvolver-se na alma. Porém, não tenhas receio; basta que a peças, basta que tenhas boa vontade e te arrependas por algum motivo legítimo, sobrenatural, e Deus te dará a graça necessária.
Se o motivo se funda na natureza ou somente na razão (por exemplo, nos danos temporais, na vergonha, doença, etc.), é muito fácil que a dor seja puramente natural e sem mérito; porém, se o motivo da contrição é alguma verdade da Fé, por exemplo: o inferno, o purgatório, o céu, Deus, etc., então a contrição é legítima, sobrenatural.
E esta contrição legítima e sobrenatural pode, por sua vez, ser de duas classes: perfeita e imperfeita; e com isto temos chegado a nossa matéria da contrição perfeita. Em poucas palavras, contrição perfeita é a contrição que procede de amor; imperfeita, a que procede do temor de Deus.
É contrição perfeita quando procede de amor perfeito a Deus. Pois bem, o nosso amor a Deus é perfeito quando o amamos porque Ele é em Si infinitamente perfeito, formoso e bom (amor de benevolência), e porque nos mostrou de uma maneira tão admirável o seu amor (amor de agradecimento).
É imperfeito o amor de Deus quando o amamos porque esperamos alguma coisa dEle. De modo que, com o amor imperfeito, pensamos sobretudo nos dons; com o perfeito, na bondade do doador; com o amor imperfeito, amamos mais os dons; com o perfeito amamos mais o doador, e isto não tanto pelos seus dons como pelo amor e bondade que nos dons se manifesta.
Do amor nasce a contrição. Será, pois, perfeita a contrição se nos arrependermos dos pecados por amor perfeito de Deus, quer seja de benevolência quer de agradecimento. Será imperfeita se nos arrependermos dos pecados por temor de Deus, porque pelo pecado perdemos a recompensa de Deus, o Céu, e merecemos seu castigo, o inferno ou o purgatório.
Na contrição imperfeita, fixamo-nos principalmente em nós e nas desgraças que, segundo a Fé nos ensina, nos acarretou o pecado. Na contrição perfeita, fixamo-nos sobretudo em Deus, na sua grandeza, na sua formosura, amor e bondade, vendo quanto o pecado O ofende, e que foi o pecado que Lhe ocasionou tantos sofrimentos e dores para nos redimir. Na contrição perfeita, não queremos unicamente o nosso bem, senão o bem de Deus.
Com um exemplo o verás melhor. Quando São Pedro negou o Divino Salvador, saiu fora e “chorou amargamente” (Lc. 22,62).
— Por que chora São Pedro?
É, porventura, pensando na vergonha que vai ter diante dos outros apóstolos? Se assim fosse, a sua dor teria sido puramente natural e sem mérito. É porque receia que seu Divino Mestre lhe tire, como ele merece, o cargo de Apóstolo e Superior e o expulse do seu reino? Então seria boa contrição, mas somente imperfeita. Mas, não; Pedro arrepende-se e chora, antes de tudo, porque ofendeu a seu amado Mestre, tão bom, tão santo, tão digno de ser amado e por ser tão desagradecido ao seu imenso amor por ele. Tem, pois, verdadeira e perfeita contrição.
Agora dize-me: tens tu também, cristão de minha alma, algum fundamento, algum motivo, parecido com o de São Pedro, para te arrependeres dos teus pecados por amor, e por amor perfeito e agradecido? Sim, certamente, pois os benefícios que Deus te tem feito são mais que os cabelos da tua cabeça, e, considerando-os, podes dizer, em cada um deles, o que dizia São João: “Amemos a Deus já que Ele nos amou primeiro” (I Jo 4,19). E como te amou? “... amo-te com eterno amor, e por isso a ti estendi o meu favor.” (Jer 31,3).
Sim, com amor eterno te amou. Desde toda a eternidade, desde quando ainda não havia nem um átomo de ti sobre a terra, te olhou com aqueles seus olhos amorosos e que tudo penetram, e te preparou alma e corpo, céu e terra, com o amor com que uma mãe prepara todo o necessário para o filhinho que ainda não nasceu.
Ele deu-te a saúde e a vida, Ele te deu e te dá, em cada dia, todos os bens naturais. Consideração esta que até aos pagãos pode fazê-los chegar ao conhecimento e amor perfeito de Deus; quanto mais a ti, cristão, que conheces outro gênero muito diferente de amor e de bondade, o amor e bondade sobrenatural de Deus para contigo; porque Deus se compadeceu de ti; e quando, com todo o gênero humano, estavas condenado pela culpa original, Deus enviou o seu Unigênito Filho, e Ele se fez teu Salvador e te remiu com seu sangue, morrendo na Cruz.
E em ti pensava com entranhado amor quando agonizava no horto das Oliveiras, e quando derramava o seu sangue com os açoites e os espinhos, e quando subia arrastando a pesada Cruz pelo longo e áspero caminho do Calvário; e quando, cravado nela, se desfazia em sangue entre indizíveis tormentos. Em ti pensava com entranhado amor, como se tu foras o único homem da terra.
Que tens a concluir daqui?
“Amemos a Deus já que Ele nos amou primeiro” (I Jo 4,19).
E Deus te atraiu a Ele pelo batismo, graça capital e primeira da tua vida, e pela Igreja, em cujo seio foste então admitido. Quantos há que, só a força de trabalhos e canseiras, conseguem encontrar a verdadeira Fé, e a ti te a ofereceu Deus desde o berço, por puro amor. Atraiu-te a Ele e te atrai sempre pelos sacramentos e pelas inumeráveis graças interiores e exteriores de que te enche todos os dias, pois, em verdade, estás nadando, como em imenso mar, na bondade e amor de Deus. E este amor, quer ainda coroá-lo colocando-te consigo no Céu e fazendo-te eternamente feliz. Que lhe deves por tanto amor? Não é verdade que deves corresponder a ele? Amemos também a Deus já que Ele nos amou primeiro.
Pois, vamos a contas e dize-me: Como tens pago a Deus, tão bom e amoroso, o seu amor e bondade para contigo? Dir-me-ás, sem dúvida, que com ingratidão e pecados. E pesa-te essa ingratidão? Sem dúvida que sim e queres ressarcir a tua pesada ingratidão, amando quanto possas tão grande e amoroso benfeitor. Pois, olha, se assim é, já tens contrição perfeita, contrição de amor de Deus. Para facilitar, chama-se a esta contrição de amor de Deus, contrição de amor ou de caridade.
Na mesma contrição de caridade, há uma mais levantada, que é quando alguém ama a Deus porque Ele é em si infinitamente formoso, glorioso, perfeito e digno de amor, prescindindo do seu amor e misericórdia para conosco. Há estrelas — e com esta comparação julgo que entenderás melhor — que, por estarem muito longe de nós, não as podemos distinguir, e, contudo, são tão grandes e formosas como o sol, que tão prodigamente nos dá o calor e a vida.
Pois assim, ainda quando o homem não tivesse visto nem gozado nunca do amor de Deus, eterna estrela do céu, ainda quando Deus não tivesse criado o mundo nem criatura alguma, seria apesar disso grande, formoso, glorioso e digno de ser amado, porque é em si mesmo e para si, o bem mais excelente, o mais perfeito e digno de amor. Isto e não outra coisa quer dizer essa expressão que, mais de uma vez, terás encontrado nos devocionários e nas fórmulas do ato de contrição e te terá parecido talvez algum tanto obscura.
Detém-te, pois, agora e contempla o amor de Deus; contempla-o, sobretudo, nos amargos sofrimentos do Salvador, a cuja luz o compreenderás tão facilmente como facilmente te arrebatará o coração.
Eis aqui o modo de alcançar praticamente a contrição perfeita.

Como se excita a contrição perfeita?

Hás de pressupor que a contrição perfeita é graça e grande graça do amor e misericórdia de Deus; e, se assim é, hás, portanto, de pedi-la com instância. Porém, não te contentes com fazê-lo somente quanto trates de excitar a contrição, porque o desejo de alcançá-la deve ser um dos mais ardentes anseios de tua alma. Pede-a, pois, dizendo: Senhor, dai-me a graça do perfeito arrependimento, da perfeita contrição dos meus pecados. E Deus não te faltará com a sua graça, se tiveres boa vontade.

Posto isto, repara como poderás facilmente conseguir a contrição perfeita. Põe-te diante de um crucifixo, na igreja ou na casa de tua habitação, ou senão imagina que o tens diante de ti, e, chorando de compaixão à vista das feridas do Senhor, pensa uns momentos com fervor: Quem é este que está pendente da Cruz e sofrendo nela?
— É Jesus, meu Deus e Salvador.
— Que sofre?
— As mais terríveis dores no corpo, tem-no ensangüentado e coberto de feridas; a alma, tem-na lacerada pelas dores e afrontas. Por que sofre tudo isso?
— Pelos pecados dos homens e... também pelos meus pecados; em meio de suas amarguradas dores, também pensa em mim, também sofre por mim, também quer expiar os meus pecados.
— Entretanto, deixa que o sangue redentor do Salvador, quente ainda, caia sobre ti, gota a gota, e pergunta a ti mesmo como tens correspondido ao teu Salvador, tão atormentado por ti.

Pensa um momento, recorda teus pecados, e esquece-te, se quiseres, do Céu, do inferno, e arrepende-te principalmente porque são eles que a tão miserando estado reduziram o teu Salvador; promete-lhe que não tornarás a crucificá-Lo com mais pecados e, por fim, reza, pausadamente e com fervor, acompanhando com sentimento interno, as palavras, a fórmula da contrição.

Esta oração ou fórmula pode ser diversa e ainda pode cada um servir-se para ela de suas próprias palavras. No fim do livrinho, encontrarás algumas; contudo juntarei aqui uma bastante vulgar:
“Senhor meu e Deus meu: pesa-me, do mais íntimo do coração, de todos os pecados de minha vida, porque com eles tenho merecido que a vossa divina Justiça me castigasse na vida e na eternidade; porque tenho correspondido ao vosso amor com tanta ingratidão, sendo como Sois o meu maior benfeitor; porém, sobretudo, porque com eles Vos tenho ofendido a Vós, meu bem supremo e digno de todo o amor. Proponho firmemente emendar-me e não mais pecar. Dai-me, meu Jesus, a graça para cumpri-lo. Amém.”

Três porquês contém esta oração, e a cada porquê acompanha um motivo de contrição, primeiro da imperfeita, depois da perfeita; pois, da imperfeita se passa mais facilmente para a perfeita e é por isto conveniente unir as duas espécies de contrição. Em outras palavras, convém que se excite em primeiro lugar a contrição imperfeita e depois a perfeita. Dize, pois:

1— “porque com eles, tenho merecido...” Isto é ainda contrição imperfeita.
2— “porque tenho correspondido...” Esta vai já se aproximando da contrição perfeita e até se reduz a ela; porque, se deveras sinto ter correspondido com ingratidão e com pecados ao amor e bondade de Deus, necessariamente hei de querer ressarcir com amor esta ingratidão; e o sentir por amor a ofensa do benfeitor, a quem até agora se desconhecia, é já contrição perfeita, contrição de caridade para com Deus.
3— “porém, sobretudo, porque com eles Vos tenho ofendido...”

Se voltares a ler o capítulo I, entenderás o que isto significa e, entendendo-o, verás mais claramente expressado aqui o amor perfeito e a contrição perfeita. Para consegui-lo mais facilmente, podes acrescentar, mentalmente ou por palavras, o que segue: “porém, sobretudo, porque com eles Vos tenho ofendido a Vós, meu bem supremo e digno de todo o amor. Salvador meu que, por meus pecados, morrestes na Cruz”.

Depois vem o propósito: “Proponho...” — Porém, padre, dir-me-ás talvez — para outros, será isso muito fácil, mas para mim, é coisa muito difícil, quase impossível.
— Parece-te isso? Pois não o julgues tal.


É difícil excitar a contrição perfeita?

Antes de tudo, é verdade que, para a contrição perfeita, se requer mais do que para a imperfeita, que é a de que se necessita para a Confissão. Contudo, porém, ajudado com a graça de Deus, pode qualquer um alcançar a contrição perfeita, bastando que deveras a deseje, porque a verdadeira contrição está na vontade e não no sentimento.

Tudo se reduz a termos o devido motivo de arrependimento, quer dizer, que nos arrependamos porque amamos a Deus sobre todas as coisas e, por seu amor, detestamos os nossos pecados; nisto, e não na duração ou intensidade da dor, está a contrição perfeita. Digo isto, porque muitas vezes se confunde a contrição perfeita com certa contrição que há, altíssima e sublime, não se advertindo que a contrição perfeita tem seus graus e degraus, e que, para que o seja, não é necessário que chegue à contrição altíssima e firmíssima de São Pedro, de Madalena, de São Luiz Gonzaga e de outros santos: muito bom seria isso, mas não é necessário; um grau mais baixo de contrição perfeita e verdadeira basta para perdoar os pecados.

Além disso, advertirás uma coisa, que me parece te animará e te dará confiança para poderes alcançar a contrição perfeita. Antes de Jesus Cristo, na Lei antiga, por espaço de 4.000 anos, foi a contrição perfeita o único meio que tiveram os homens para alcançarem o perdão dos pecados e entrarem no Céu. E hoje mesmo a milhões e milhões de pagãos e hereges que só e unicamente pela contrição perfeita, podem sair do pecado.

Portanto, se é verdade, como é, que Deus não quer a morte do pecador, parece natural que não haja exigido para a contrição perfeita ato demasiadamente difícil, mas antes que esteja ao alcance de todos. Pois, se podem alcançar a perfeita contrição tantos e tantos que vivem e morrem afastados, é verdade que sem culpa sua, da corrente da graça e da Igreja Católica, ser-te-á isto a ti difícil, a ti, que tens a grande dita de ser cristão e católico, a ti, que tens muito mais graças e estás mais instruído do que eles?

E ainda te digo mais: muitas vezes, sem o saber ou sem o pensar, tens realmente contrição perfeita; quando, por exemplo, ouves piedosamente a santa Missa, quando fazes com devoção a Via-Sacra, quando meditas com fervor diante de uma imagem de Jesus crucificado ou do Sagrado Coração, ou assistes à pregação da palavra divina.

Além disso, muitas vezes pode-se exprimir com poucas palavras o amor mais ardente e a mais profunda contrição, atendendo só ao sentido e ao motivo (o amor de Deus). Por exemplo, com estas jaculatórias: “Deus meu e meu tudo!”; “Meu Jesus, misericórdia!”; “Ó meu Deus, amo-Vos sobre todas as coisas!”; “Meu Deus, compadecei-Vos de mim pecador!”  E...

“Pequei, já minha alma
Sua culpa confessa;
Mil vezes me pesa
De tanta maldade.
Mil vezes me pesa
De haver, obstinado,
Teu peito rasgado,
Ó suma Bondade!”

Finalmente, se tão soberanos efeitos obra Deus pela contrição perfeita, sinal é de que quer que a excitemos e de que Ele nos ajudará para consegui-la.
— E que efeitos são estes que produz a contrição perfeita?

Efeitos verdadeiramente admiráveis!
Se és pecador, perdoa-te imediatamente os pecados e isto de cada vez e ainda antes de receberes o sacramento da Confissão; necessário é, porém, que tenhas vontade de confessá-los mais tarde (vontade esta que já está incluída na contrição perfeita). E este efeito é produzido pela contrição perfeita e verdadeira não só em perigo de morte, mas sempre e quando a excitamos no coração; de modo que o pecador, ao mesmo tempo que lhe são remitidas as penas do inferno, recobra os méritos passados e, de inimigo de Deus, se faz seu filho e herdeiro do Céu.

Se és justo, a contrição perfeita assegura-te e aumenta-te o estado de graça, apaga-te os pecados veniais que, pelo ato de contrição de caridade, detestaste; perdoa-te, sobretudo, as penas dos pecados, firmando e robustecendo-te no verdadeiro e sólido amor de Deus.

Tais são as maravilhas que o amor e a misericórdia de Deus obram na alma do cristão pela contrição perfeita.
Tão grandes são que, talvez, te pareçam incríveis; tratando-se do perigo de morte, já terás ouvido que se devem pedir a contrição e a dor; mas que também, em tempo de saúde e em qualquer tempo, a contrição perfeita obre tais maravilhas, mal te atreverás a acreditá-lo.

— Será, pois, certa e segura esta doutrina da contrição perfeita?

Digo-te que é tão firme e tão segura como a própria palavra de Deus.
No Concilio ecumênico de Trento, onde a Igreja declarou e explicou os principais ensinamentos divinos que já eram correntes nela e eram combatidos por muitos hereges, diz-se na Sessão 14, cap. 4: “A contrição perfeita, a contrição que procede do amor de Deus, justifica o homem e reconcilia-o com Deus ainda antes de receber o sacramento da Confissão”.

Como o Concilio não diz que isto seja só em tempo de necessidade e em perigo de morte, segue-se que a contrição perfeita produz sempre este efeito. E, para o afirmar, apóia-se a Igreja na palavra e ensino de Jesus Cristo, que diz entre outras coisas: “Se alguém me ama (e isto só o faz o que tem verdadeira contrição no coração), meu Pai o amará e Nós viremos a ele e faremos nele morada” (I Jo 14,23).

Para que, porém, Deus possa habitar na alma, é preciso que o pecado tenha desaparecido; logo, o apagar o pecado é um dos efeitos da contrição perfeita, da contrição de caridade.

Assim também o tem declarado sempre a Igreja infalível, chegando a condenar como herege, Baio, por dizer o contrário.

O mesmo ensinam os Santos Padres e Doutores sagrados sem exceção e o mesmo confirma a razão, porque se, como já disse, tão grandes efeitos produzia a verdadeira contrição no Antigo Testamento, quando ainda imperava a lei do temor, quanto maior produzirá no Novo, em que impera a lei do amor!

— Dir-me-ás, talvez, porém, se a contrição perfeita destrói os pecados, a que vem confessá-los depois?

Sim, é verdade; a contrição perfeita faz o mesmo que a Confissão, faz com que desapareçam da alma os pecados; não o faz, porém, com independência do sacramento da Confissão, porque é necessário ter vontade de confessar mais tarde os pecados destruídos ou apagados pela contrição perfeita.
E isto porque é lei de Jesus Cristo que se confessem todos os pecados, pelo menos todos os mortais, e esta lei, de forma alguma, se pode mudar. Verdade é que, se alguém não quisesse depois confessar os pecados que lhe foram perdoados pela contrição perfeita, não os contrairia novamente; mas é certo que perderia de novo o estado de graça, precisamente por faltar à obrigação de confessá-los.

— E devemos confessar os pecados logo que o possamos fazer depois da contrição de caridade?

Em rigor, não é necessário; porém, de todo o coração, aconselho-te e recomendo-te que o faças; assim estarás mais seguro de ter alcançado o perdão e conseguirás, por sua vez, as grandes graças que traz consigo o sacramento da Confissão e que se chamam graças sacramentais.

Talvez que alguém, tentado pelo demônio, vendo os grandes efeitos da contrição perfeita, diga: “Pois se é tão fácil alcançar o perdão dos pecados com a contrição perfeita, já não preciso mais me confessar; peco quanto quiser, arrependo-me depois com contrição perfeita, e estou pronto. Não é assim?”

Não, de forma alguma; porque quem assim pensa não tem nem sombra de contrição. Não ama a Deus sobre todas as coisas logo que não queira em tudo e por tudo romper com o pecado mortal, nem trata seriamente de emendar a sua vida, coisa que tanto se requer para a Confissão como para a contrição perfeita; em uma palavra, falta-lhe boa vontade e, faltando-lhe esta, faltar-lhe-á a graça de Deus, sem a qual a contrição perfeita é absolutamente impossível.

Poderá enganar-se a si mesmo, jamais, porém, enganará a Deus Nosso Senhor. Aquele que tem contrição perfeita, está inteiramente resolvido a romper com o pecado mortal; receberá logo que possa e com mais fervor do que dantes, os santos sacramentos, e com a sua boa vontade, ajudada da graça de Deus, conservar-se-á livre de pecado e se firmará mais e mais no feliz estado de filho de Deus.

A quem, de modo especial, a contrição perfeita auxilia, é aos que leal e sinceramente querem adquirir e conservar o estado de graça e, sobretudo, aos que pecam por costume, isto é, aos que, ainda que tenham boa vontade, a força dos maus hábitos e a própria fraqueza os fazem cair de vez em quando; porém, de forma alguma, a contrição perfeita ajuda aos que se acolhem a ela para pecarem mais à vontade. E estes convertem o celestial remédio do perfeito arrependimento em narcótico fatal e em infernal veneno.

Não sejas, pois, destes, leitor amado; não consintas, incauto, que graça tão preciosa como a contrição perfeita te sirva para o mal, senão para o bem, já que tão grandes bens produz na alma do cristão.
— E que bens são esses que produz a contrição perfeita? Por que é tão importante e até necessária a contrição perfeita?
É importante na vida e na morte.
I — É importante na vida
Porque: que precioso não é o estado de graça!
A graça não adorna somente a alma, mas invade-a e penetra-a toda, e transforma-a em uma nova criatura, em filha de Deus e herdeira do céu. Além disso, faz com que todas as obras e trabalhos do cristão sejam meritórios para o Céu; a graça é a varinha mágica que tudo converte em ouro, porém em ouro de méritos celestiais.
Pelo contrário, que triste é o estado do cristão que jaz em pecado! Todos os seus trabalhos, todas as suas orações, todas as suas boas obras ficam inúteis e sem mérito para o Céu; é inimigo de Deus e, no momento em que o tênue fio da vida se parta, cairá precipitado no inferno. Não será, pois, importante e necessário o estado de graça para o cristão?
Pois, se o perdeste, podes recuperá-lo, principalmente de duas maneiras:
Pela Confissão.
Pela contrição perfeita.
A Confissão é o meio adequado e ordinário para alcançar a graça santificante. Como este meio, porém, nem sempre está ao nosso alcance, Deus deu-nos outro extraordinário, que é a contrição perfeita.
Imagina que, um dia, tens a imensa desgraça de cometer um pecado mortal. Quando, passada a agitação do dia, vem o sossego da noite, a tua consciência angustiada levanta-se e clama com voz poderosa. — Confessar­se agora... não é possível.
Como remediar este estado? Pois olha, Deus põe em tuas mãos a chave de ouro que te vai abrir as portas do Céu; arrepende-te de teus pecados por verdadeiro amor de Deus, protesta-lhe firmemente não tornar a cometê-los, promete confessá-los quanto antes, e podes acreditar que estás reconciliado com Deus; deita-te tranqüilo.
Porém, se o cristão não conhece nem pratica a contrição perfeita, que triste estado o da alma! Em pecado mortal se deita e se levanta, e assim vive dois, três, quatro meses e mais, até a Confissão seguinte.
E talvez que, neste estado, continue por anos inteiros, sem que a profunda noite do pecado seja interrompida, nem um momento sequer, na sua alma pelos raios do sol da graça depois da Confissão. Triste estado! Viver quase sempre em pecado, inimigo de Deus, sem mérito para o Céu e em perigo de eterna condenação!
Mais; quando alguém, antes de receber um sacramento, por exemplo, o da Confirmação, o do Matrimonio, se lembra de um pecado grave não perdoado, pode, pela contrição perfeita, fazer-se digno de receber o sacramento. Somente para a Comunhão, isso não basta; é necessária a Confissão.
Também para o cristão que está em estado de graça, é importante o uso freqüente da contrição perfeita. Antes de tudo, nunca podemos estar completamente seguros de que estamos em estado de graça. Porém, esta segurança aumenta e se confirma com cada ato de verdadeira contrição perfeita.
Sucede, além disso, que alguém tenha dúvida sobre se consentiu em alguma tentação; estas dúvidas acovardam e desalentam a alma no caminho da virtude. Que há a fazer nestes casos? Examinar se consentimos ou não? Isso de nada aproveita. Excita-te à contrição perfeita e fica tranqüilo.
Porém, ainda que tivéssemos toda a certeza possível de que estamos em graça, que preciosa não é a contrição perfeita!
Por cada ato de contrição perfeita, aumentamos este estado de graça na alma, e cada grau de graça vale mais do que todas as riquezas do mundo.
Por cada ato de contrição perfeita e caridade, destroem-se os pecados veniais e as faltas que mancham a alma, e esta fica cada vez mais formosa diante de Deus.
Por cada ato de contrição perfeita, são perdoadas as penas temporais dos pecados (*).
(*) Quer dizer que se perdoam sempre algumas penas e até todas, se o ato for mui intenso (N. do T.).
Recorda-te do que o Senhor disse à Madalena: “Perdoados lhe são muitos pecados, porque amou muito” (Lc 7,47). E se tanto apreciamos, e com razão, as indulgências, as boas obras, as esmolas, incluamos entre estas a caridade, a rainha das virtudes.
Por cada ato de contrição perfeita vai a alma confirmando-se mais e mais no bem e robustecendo-se contra o mal, de modo que, com razão, pode esperar a suprema graça da perseverança final. Já vês, pois, que é importante a contrição perfeita na vida. Porém, de modo particular;
II — É importante na morte
Sobretudo em perigo de morte repentina.
Houve um grande incêndio numa cidade, e neste pereceram centenas de pessoas. Entre muitas que gemiam no pátio de uma casa, via-se um menino de doze anos que, de joelhos, pedia em voz alta a graça da contrição; explicou depois porque o fazia e suplicou que orassem com ele em voz alta.
Talvez que, por seu intermédio, muitos daqueles infelizes se salvassem para sempre.
Perigos como este sem conta te cercam e, quando menos o penses, podes ser vítima de uma desgraça repentina: podes, por exemplo, cair de uma árvore; podes ser atropelado por um carro na rua; podes ser surpreendido de noite, pelo fogo, na tua habitação; podes colocar mal o pé em uma escada; pode ser que, enquanto trabalhas, te falte repentinamente os sentidos e caias... levam-te moribundo à casa, vão a correr chamar o sacerdote; este, porém, tarda em chegar, e urge tanto!... Que fazer? Excita-te em seguida à contrição perfeita, arrepende-te por amor e gratidão para com Deus, e Jesus Cristo paciente salvar-te-á por toda a eternidade; a contrição perfeita terá sido para ti a chave do Céu no último momento e no último e supremo transe para a alma e para o corpo.
Com isto, não desejo que alguém se aventure a deixar tudo para o último momento, à mercê de um ato de contrição perfeita, julgando ficar já por isso livre de pecado, pois é muito duvidoso que a contrição perfeita possa servir aos que têm pecado à sua sombra. O que deixo dito vale, antes de tudo e sobre tudo, para os que têm boa vontade.
— Porém, haverá tempo — dir-me-ás — em tais circunstâncias, para fazer um ato de contrição perfeita?

Com a ajuda de Deus, sim; porque, para a contrição perfeita não se requer muito tempo, sobretudo quando antes, em tempo de saúde, nos temos exercitado nela; em um momento a podemos excitar e penetrar na alma. E como, em casos tão extraordinários, tem mais eficácia a graça de Deus, e o espírito, mais atividade no transe tremendo da morte, dos momentos se fazem horas. Lembra-te de que falo por experiência própria.

Uma vez, a 20 de julho de 1886, estive em grande e terrível perigo de morte, seria coisa de oito ou dez segundos, o espaço para meio Pai-Nosso. Pois, em tão curto espaço de tempo, mil pensamentos cruzaram-se em minha mente; a minha vida inteira passou diante de minha alma, com rapidez incrível, e, atrás dela, o que seria de mim depois da minha morte; tudo isto, como disse, num espaço de tempo insignificante, o suficiente para meio Pai-Nosso. Por dita minha, porém, e grande favor de Deus, a quem rendo graças, não foi aquele momento para morte, mas sim para vida; — do contrário, não teria podido escrever a Chave de ouro.

Pois, a primeira coisa que fiz, em tão terrível momento, foi o que, segundo o Catecismo, deve fazer todo o cristão em perigo de morte: excitar-se à contrição e recorrer a Deus pedindo-a e implorando-a a seu favor. E a verdade é que, naquela ocasião, creio que aprendi a amar e apreciar o valor da contrição perfeita; desde então tenho difundido, quanto me tem sido possível, o seu conhecimento e estima. E esta misericórdia, que podes exercitar na tua alma no último momento, podes exercitá-la também com os demais cristãos, teus irmãos. E quão triste é que, em tão apurado transe, não seja isto melhor compreendido!

Acode muita gente, choram e gritam desordenadamente, e, sem saber que fazer, correm à procura do médico e do sacerdote, trazem todos os remédios que têm em casa e, entretanto, o enfermo agoniza, e... Naqueles breves mas preciosos momentos, talvez não haja quem se compadeça da sua alma imortal e lhe proponha que faça um ato de contrição perfeita e o salve para sempre.

Se te apresentar ocasião, vai com sossego e tranqüilidade para o lado do moribundo ferido ou enfermo; se te for possível, põe-lhe o Crucifixo diante dos olhos e, com voz firme mas tranqüila, pede-lhe que pense e repita com o coração o que tu vais rezar; e, feito isto, vai dizendo compassada e claramente o ato de contrição, ainda que te pareça que ele nada ouve nem entende. Com isto, terás feito uma obra sumamente boa, e o moribundo te agradecerá eternamente no Céu. Sim, até mesmo a um herege, podes ajudar desta maneira em seus últimos momentos; não lhe fales, se queres, de Confissão, porém excita-o a que faça um ato de amor de Deus e de Jesus Crucificado e dize-lhe compassadamente o ato de contrição.

III - Quando se deve excitar a contrição perfeita?

1. Se, com fidelidade e bom desejo, me tens seguido até aqui, cristão leitor, deixa que, olhando-te afetuosamente e apertando-te a mão, te diga de todo o coração e com a maior insistência: dá este prazer a Deus e à tua alma: fase devotadamente todas as noites, com tuas orações, um ato de contrição perfeita. Não deixes passar noite alguma sem exame de consciência e contrição, como não deixes passar manhã alguma sem purificar a intenção. Não pecarás, é claro, se o deixares de fazer alguma vez; porém tem por bom e saudável o conselho que te dou.

E não me digas que isso de exame de consciência e contrição é coisa própria de sacerdotes e homens perfeitos e não para ti; não te escuses com o “não há tempo”; “está a gente tão cansado quando chega a noite...”

Quanto tempo julgas que é necessário? Meia hora? Não. Um quarto de hora? Também não; alguns poucos minutos bastam. Não costumas recitar algumas orações antes de te deitares? Pois, em seguida à tua pequena oração, pensa uns momentos nas faltas e pecados do dia que acaba de passar, e reza, pausadamente e com fervor, diante do Crucifixo, o ato de contrição. Depois podes recolher-te tranqüilo. Deste ao Senhor as boas noites, e ele te respondeu: “Boa noite, filho”. Ele perdoou-te misericordiosamente os teus pecados. Que te parece? Fá-lo desde esta noite e jamais te arrependerás.

2. Se, nesta vida, tiveres a imensa desgraça de cometeres um pecado mortal, não permaneças mergulhado em tão grande miséria; levanta-te pela contrição perfeita, levanta-te imediatamente, ou, o mais tarde, logo que faças as tuas orações da noite; depois não demores muito em confessar-te.

3. Finalmente, cristão da minha alma, mais tarde ou mais cedo, terás que morrer, e se, o que não te desejo, a morte te colhesse de improviso, já sabes onde está o remédio, já sabes onde está a chave do Céu.

Chama imediatamente por Deus com íntima e perfeita contrição, e, se em vida te exercitares nela gostosa e devidamente, não te faltarão então tempo, vontade e graça de Deus para teres firme contrição perfeita, e a contrição perfeita te salvará.

4. Porém, se antes de morrer, tens tempo para prevenir-te e preparar-te para o caminho da eternidade, que a última coisa que na terra penses e faças, com conhecimento, seja um ato de entranhado amor de Deus, teu Criador, teu Redentor, Salvador e Juiz; um ato de sincera e perfeita contrição de todos os pecados da tua vida. Feito isto, lança-te com confiança nos braços da misericórdia divina e Deus será para ti bondoso Juiz.

Com isto, me despeço de ti, amado leitor; vê e faze o que neste livrinho tens lido. Ama e pratica a contrição perfeita, meio esplêndido de graça que a divina misericórdia põe em tuas mãos para saíres do pecado mortal em qualquer momento, e não só em perigo de morte; meio fácil, que tão grandes efeitos produz; meio supremo e único que, em caso de necessidade, salvará a tua alma; fonte, enfim, de graças na vida e na morte — verdadeira chave de ouro do Céu.

Atos de Contrição

1. Senhor meu Jesus Cristo, Deus e homem verdadeiro, Criador e Redentor meu, por serdes Vós quem sois, e porque Vos amo sobre todas as coisas, pesa-me de todo o coração de Vos ter ofendido; proponho firmemente nunca mais pecar, confessar-me, cumprir a penitência que me for imposta, e afastar-me de todas as ocasiões de Vos ofender; ofereço-Vos a minha vida, obras e sofrimentos em satisfação de todos os meus pecados, e confio na vossa bondade e misericórdia infinitas que os perdoareis pelos merecimentos do vosso preciosíssimo Sangue, Paixão e Morte, e me dareis graça para emendar-me e perseverar em vosso santo serviço até o fim da minha vida. Amém.

2. Senhor meu e Deus meu! Do íntimo do coração, me pesa de todos os pecados da minha vida. Pesa-me porque com eles mereci o purgatório ou o inferno; porque tenho desprezado o céu e porque tenho sido tão ingrato para convosco, o meu maior benfeitor. Pesa-me, sobretudo, porque, com os meus pecados, Vos tenho açoitado e crucificado, a Vós meu amabilíssimo Salvador. Agora, porém, amo-Vos, meu maior benfeitor, meu pai amabilíssimo e misericordiosíssimo Redentor; amo-Vos de todo o coração e sobre todas as coisas, e, porque Vos amo, me pesa e me arrependo de Vos ter ofendido, Deus meu, que sois infinitamente formoso, bom e digno de ser amado. Proponho firmemente emendar a minha vida e não mais pecar. Ó meu Jesus! dai-me a vossa graça para cumpri-lo. Amém.

3. Senhor meu Jesus Cristo, Deus e homem verdadeiro, Vós me criastes à vossa imagem e semelhança, Vós me remistes com infinito amor, morrendo na Cruz e me quereis levar ao Céu para me fazer eternamente feliz. Eu, em troca, tenho-Vos ofendido tantas vezes com meus pecados e tenho merecido justos castigos nesta vida e na outra.
Sim, sou culpado do vosso Sangue e de vossas feridas; tenho afligido e amargurado o vosso amantíssimo Coração de Redentor com meus pecados e minha ingratidão. Detesto esta ingratidão e, para compensá-la, amo-Vos com mais ardente amor, sobre todas as coisas. E, porque Vos amo, pesa-me de todo o coração e sobre todas as coisas, de Vos ter ofendido, Senhor meu e Deus meu. Perdoai-me, eu Vos peço. Quero desde este momento emendar-me com fervor. Dai-me, Jesus misericordioso, a vossa graça para isto. Amém.

Ato de amor perfeito e contrição perfeita,
atribuído a São Francisco Xavier

Não me move meu Deus, para querer-te,
O Céu que me tens prometido,
Nem me move o inferno, tão temido,
Para deixar por isso de ofender-te.
Tu me moves, Deus meu, move-me o ver-te
Cravado em uma cruz, escarnecido;
Move-me o ver teu Corpo tão ferido,
Movem-me tuas afrontas e tua morte;
Move-me, enfim, teu amor e de tal maneira
Que, ainda que não houvesse Céu, te amaria,
E, ainda que não houvesse inferno, te temeria.
Nada tens que dar-me porque te quero;
Porque, se não esperasse o que espero,
Te queria o mesmo que te quero.


Resumo do ato de Contrição que usava o
Ven. Marcos de Aviano, religioso capuchinho,
morto em odor de santidade.

Eu, ruim e indigna criatura, me lanço a vossos pés, Deus meu, e, com o coração contrito e aflito, reconheço e confesso diante de Vós, Redentor de minha alma, que, desde o instante em que nasci até agora, tenho cometido inumeráveis negligências e pecados.
Tenho-Vos ofendido, Deus meu! Pequei, Senhor! Porém, detesto os meus pecados e me arrependo do íntimo do coração. Por isso, prometo solenemente não mais pecar. Porém, se Vós, em vossa altíssima sabedoria, preveis que posso novamente ofender-Vos e cair outra vez no vosso desagrado, de todo o coração Vos peço que me leveis agora desta vida, em vossa graça.
Oxalá a minha dor fosse tão grande que o propósito de não mais Vos ofender permanecesse sempre imutável! Porque Vos devo infinito agradecimento pela vossa divina bondade e porque mereceis que Vos ame sobre todas as coisas, arrependo-me de meus pecados, não tanto para livrar­me dos tormentos eternos que por eles mereci, nem para gozar das delicias do Céu, que tão inconsideradamente desprezei, como porque vos desagradam a Vós, Deus meu, que, por vossa bondade e infinitas perfeições, sois digno de infinito amor.
Oxalá todas as criaturas vos mostrem sem interrupção, amor, reverência e agradecimento. Amém.


Ato de contrição usual no Brasil

Senhor meu Jesus Cristo, Deus e homem verdadeiro, Criador e Redentor meu, por serdes Vós quem sois, sumamente bom e digno de ser amado, e porque Vos amo e estimo sobre todas as coisas: pesa-me, Senhor, de todo o meu coração, de Vos ter ofendido; pesa-me, também, por ter perdido o Céu e merecido o inferno; e proponho firmemente, ajudado com os auxílios de vossa divina graça, emendar-me e nunca mais Vos tornar a ofender. Espero alcançar o perdão de minhas culpas pela vossa infinita misericórdia. Amém.


Disposição do Código de Direito Canônico
sobre a contrição perfeita.

Cânon 916 — Quem está consciente de pecado grave não celebre a missa nem comungue o Corpo do Senhor, sem fazer antes a confissão sacramental, a não ser que exista causa grave e não haja oportunidade para se confessar; nesse caso, porém, lembre-se que é obrigado a fazer um ato de contrição perfeita, que inclui o propósito de se confessar quanto antes.
A propósito deste cânon, os canonistas espanhóis da Universidade de Navarra, Pedro Lombardia e Juan Ignacio Arrieta, fazem o seguinte comentário, na edição anotada do Código de Direito Canônico promovida pela mesma Universidade:
“Este cânon se refere ao celebrante ou ao que recebe o sacramento. Um ato de contrição perfeita, com efeito, perdoa o pecado mortal; porém — como lembra o segundo mandamento da Igreja — permanece a obrigação de confessar-se previamente à recepção da Eucaristia; obrigação que só se dispensa a iure quando coincidem, suposta a contrição perfeita, estas duas condições:
1) causa grave: perigo de morte, ou de infâmia se não celebrar ou comungar;
2) impossibilidade de confessar-se previamente, por falta de confessor idôneo (cfr. Concílio de Trento, Sessão 13, cap. 11).
Naturalmente, o ato de contrição, como parte integrante de sua perfeição, exige o propósito firme de confessar-se, que deve satisfazer-se tão logo seja possível”.

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