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quinta-feira, 21 de julho de 2011

O Homem Que Esqueceu Como Sonhar.

Chegou exausto de mais um dia de trabalho. Abraçou a mulher, demoradamente, para espanto dela. Estava especialmente carinhoso naquela noite.
Enquanto a abraçava, pediu perdão pela vida que vinham levando, pediu seu perdão com os olhos marejados.
Ela olhou e viu:
Aquele já não era mais o jovem por quem se apaixonara um dia. Era um homem de meia idade, cansado, exaurido, sem perspectivas. E ela sabia porque:
Ele deixara de sonhar. Seus sonhos foram ficando para trás, um a um, foram deixando de existir, como quem vai tirando uma peça de roupa, todos os dias e, um dia, se está nu. E percebe que não sobrou nada além de si mesmo, de seu corpo gasto e de um olhar vazio e sem esperança.
Ela o abraça, por piedade. Não diz nada, pois sabe que ele tem razão. Talvez ele desejasse ouvir uma palavra de consolo, uma negativa, mas não. Ela não tem o que dizer.
O que dizer a alguém que abriu mão de seus sonhos? Que deixou que os levassem, os tirassem dele?
O carro sonhado foi-se, os planos de conhecer o mundo foram-se, as coisas comezinhas, para manter a chama acesa, como um jantar fora, só os dois ou um fim de semana na praia, sozinhos, tudo foi-se. Não havia mais sonhos para aquele homem sonhar. E não havia nada que aquela mulher solitária pudesse fazer para trazê-los de volta para ele.
Duas solidões vivendo juntas. Cada um no seu mundo. Ele, num mundo técnico, de números, trenas, cimento e tijolos. Ela, no mundo da casa, da família, dos filhos, procurando manter, aos trancos e barrancos o lar que haviam construído um dia.
Mas ela tinha seus sonhos, jamais abrira mão deles. Eles a mantinham de pé, embora, por vezes, a vida teimasse em dissolvê-los, frágeis que eram, como nuvens, num só sopro. A realidade, muitas vezes se sobrepunha aos sonhos e os dissolvia como poeira e, ainda assim, ela conseguia enxergar na poeira brilhante, as purpurinas indo embora, com o vento. Mas, não se lamentava, pois, depressa, construiria outros, afinal, era mestra em construir sonhos, em sonhar dormindo ou acordada. Precisava deles para respirar e poder seguir. Eles eram seu alicerce e seu tijolo. Eles a faziam levantar-se todas as manhãs. Seus sonhos, só a eles ela possuía de seu, agora.
Mas como ensinar alguém a sonhar? Como fazer com que o marido buscasse dentro de si os sonhos, os desejos  de antes? Tudo o que esquecera e deixara que se fosse?
Fechou os olhos e tentou dormir, com um grande nó na garganta, uma vontade de chorar sem tamanho. Mas pensou que logo dormiria e que sonharia a noite inteira enquanto que o homem triste ao seu lado, roncava um sono de uma vida sem sonhos...
Amanhã, quem sabe?

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

Um Conto - O Guardador de Palavras

Giovanni não podia imaginar que o trabalho que arranjara como guarda palavras naquela biblioteca fosse ser tão difícil.
Não, não imaginara mesmo que seria tarefa tão fatigante.
Porque lidar com palavras não era coisa fácil. Agrupá-las, discipliná-las, mantê-las quietas era muito trabalhoso, tanto física quanto emocionalmente.
Sua responsabilidade era imensa, ele sabia agora.
Havia as inquietas, as que teimavam em sair de onde não deviam.
Havia as hiperbólicas, as que não cabiam em si de tão grandiosas. E as metafóricas, leves, melífluas, que saíam voando, entontecidas, como penugens assopradas quando bate uma brisa...
Por mais que as etiquetasse, datasse, guardasse, engavetasse...não havia meio que as fizesse seguir regras, ou  ficassem nos lugares determinados.
Algumas, e ele era obrigado a fazê-lo, tinha mesmo que amarrar nos livros a que pertenciam, com fios invisíveis a olho nu.
Era uma tarefa meticulosa, pois a agulha tampouco se enxergava com os olhos da cara. E, mesmo fazendo aquele trabalho de Penélope, de costurá-las às páginas, uma a uma, nem assim as conseguia prender.
Às vezes perdia a paciência: Ah! Diabos que as carreguem!
Outras, obedientes, quase não causavam estorvo, a não ser quando se juntavam às revolucionárias, às libertárias, às palavras de ordem...Essas, ninguém segurava e ainda influenciavam as outras, as que andavam na linha e saíam, juntas e levando as outras, as inócuas, a fazer balbúrdia pela biblioteca.
As onomatopéicas, essas eram barulhentas, escandalosas, quebravam o silencio das noites escuras e insones. O cheiro de papel novo e velho enchia as salas escuras e era quase palpável o perfume que se desprendia dos velhos livros, alguns antiquíssimos...
Ele tinha bem poucos dias de paz, o pobre Giovanni. Muito poucos mesmo.
Na maioria deles o guardador não parava um minuto, pois mal se distraía  e virava as costas para uma das milhares de estantes, bastava isso, e pronto. As palavras já começavam de novo a se embaralhar, entrar em páginas proibidas, trocar de lugar com outras, sair dos tomos onde haviam sido escritas há muitos anos atrás, mudando o sentido das frases, às vezes de parágrafos inteiros!
Proibições! Elas não admitiam proibições. Eram cheias de vontades, tinham vida própria, senhoras de si.
Às vezes, quando Giovanni cochilava em seu cansaço, acordava com algumas delas pousadas em seu bigode ou nas suas grossas sobrancelhas. Outras, penduravam-se em suas orelhas, como brincos e riam-se dele, a zombar daquele pirata barrigudo...
Pobre coitado. Não era definitivamente tarefa fácil persuadí-las a voltar de onde vieram, aos seus livros de origem, às páginas onde foram escritas.
Mas havia dias em que as sapecas apiedavam-se dele e comportavam-se como crianças na missa de domingo, aparentemente submissas, mas cochichando baixinho, cutucando umas às outras. Nesses dias ele conseguia tirar uma boa soneca, ouvindo o sussurro ao longe e sentindo leves cócegas nos dedos dos pés.
Mas, na maior parte das noites e dias elas agiam como crianças levadas, que após saírem da escola, onde estiveram por tanto tempo enfurnadas, correm, gritam, enfim libertas das paredes e lições.
Mas, pensando bem, entre elas, ocupando seus dias e noites, mesmo tendo que amarrá-las, coibí-las, seguí-las, domá-las, sentia-se feliz. Pois, sabia em seu íntimo, que agora sua vida tinha algum sentido.

Dedico esse conto à minha querida amiga e bibliotecária Giovanna, guardadora de livros e palavras, e ao seu amor pelos livros antigos e novos, e, pelas palavras, elas também, a minha paixão e o que dá sentido à minha vida.

segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

Um Conto: O Homem Que Mijava Jasmins

O Homem Que Mijava Jasmins

Depois do sexo, a urina dele cheirava a jasmim. Não perguntem porque. Ela não saberia explicar.
Mas, quando ele mijava depois de fazer amor, seu mijo possuía notas de flor, adocicadas, em meio ao cheiro forte de urina de macho.
E ele não puxava a descarga. Pegara essa mania. Dizia que puxar a descarga, todas as vezes em que fosse dar uma mijadinha, gastaria milhares de litros d'água, sem necessidade. E o planeta agradeceria. E, afinal, seu mijo cheirava a jasmim, embora disso, ele não soubesse.
Assim, ia juntando, duas, três mijadas no vaso, até que ela, não suportando mais o cheiro de flor misturado à urina, apertava a válvula, demoradamente, gastando os tais litros que ele achava desperdício, jogando no esgoto o perfume e os mijos antigos de seu homem.
Tinha sido seu primeiro amor. Vivia com ele já há uns bons vinte anos. Mas, ultimamente, ele dera para irritá-la.
Pequenas coisas. O jeito desligado, quando não a ouvia e deixava o olhar ir se distanciando, como se procurasse um objeto perdido num lugar qualquer, fora dali. Ela então, parava a frase no meio, irritada, ao constatar que falara sozinha durante vários minutos. O olhar dele mostrava que nada ouvira...
Não achava nada que procurasse, fosse na despensa ou no armário da cozinha. Ou esquecia o rosto de um conhecido, mesmo já tendo sido apresentado a ele inúmeras vezes. Como isso a irritava!
Com algumas manias já havia se acostumado. Acostumado não, mas tolerava. Deixara de se incomodar tanto. O problema era dele, não seu.
Se parecia antipático, se não puxava assunto com alguém...problema dele.
São maneiras, jeitos, idiossincrasias que não nos pertencem, pertencem ao outro. Não nos dizem respeito.
O jeito com que mastigava a comida, 50 vezes, antes de engolir, quando cruzava os talheres e parecia pensar e calcular quantos grãos de arroz havia no prato, demorando horas na mesa, enquanto ela tinha pressa. Ah, como isso a irritava. Engolia a comida, mastigava três vezes, se muito e pronto, acabava. Queria sair dali, tinha mil coisas a fazer.
Enquanto ela tinha pressa de viver, ele não, parecia observar o mundo como quem tem o universo todo e uma ampulheta em slow motion, à sua espera.
Ela não, tinha urgência. O hoje, o agora, o já, é que a interessavam. Era premente viver.
Mas quando ele a tocava, derretia-se.
Suas mãos sabiam seus caminhos. Vinte anos de trilhas percorridas. Compartilhavam seus cheiros, seus gostos. E, quando a tocava, com suas mãos enormes, como se quisesse prendê-la inteira para que nunca escapasse de seus longos dedos, nesse momento, sabia-se sua.
Às vezes, olhava aquele homem, um homem tão comum, como tantos outros, sem beleza, sem charme. Nem inteligente demais ele era. Um homem igual a milhares de outros e se perguntava porque.
Porque ele? Porque não outro? Porque amá-lo? Porque continuar com ele, mesmo tão irritante, e quase sempre, tão distante?
Mas que sabia tocá-la. Ao sentir o arrepio na pele, sabia o porque da sua escolha.
Porque quem escolheu foi ela. Ela, sim. Quem mira e caça é a mulher. É ela quem escolhe a presa e salta em cima, com o olhar, com um gesto. A mulher lança a isca, não o homem. Eles não sabem, mas é assim, desde o início dos tempos.
Ela o escolhera entre tantos, jogara a seta com seu arco de deusa e nem bem sabia porque. Talvez pelo toque de seus dedos, talvez ao sentir o cheiro da sua urina após o amor.
Foi outra vez ao banheiro. O aroma adocicado ainda insistia em suas narinas, pairando, impregnando o ar. Quando se preparava para apertar o botão da descarga, lá estava ele, enorme, frondoso, repleto de flores brancas, saindo do vaso, magnífico: um jasmineiro.

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

Posso Pedir Um Favor?

Pessoal, preciso de vocês. Sou participante do site Portal Literal e meu conto Às Cegas (aquele da foto da nuvem) está em votação para ser publicado no site.
Como é um site de muita visibilidade, se puderem ir lá e votar no meu conto para que o publiquem, agradeço muito. Sei que é chato pedir votos, mas tenho 48 hs para obter 20 votos para que o conto seja publicado no Portal.
Este é o link:
http://portalliteral.terra.com.br/artigos/as-cegas

Posso contar com vocês?
Sei que posso.
Obrigada a todos os amigos, leitores e seguidores por seu incentivo.
Beijos.

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Às Cegas

Nuvem Sobre o Largo da Carioca- Márcia Foletto (foto vencedora do Concurso Prosa & Verso, do jornal O  Globo, cujo tema era: Contos do Rio)



Contos do Rio – Às Cegas 
Gloria Leão
Pairava sobre a cidade, enquanto cigarras loucas cantavam, imensa nuvem tal e qual nave-mãe, de tule e renda...
Verão de 50 graus, sem sombras, tórrido, vento ausente. Nenhuma brisa balançava as poucas folhas meio secas das escassas árvores: mudas, quietas, sedentas assistindo ao final da tarde.
Homens e mulheres. Pressa, gravatas frouxas, frouxos sorrisos de até amanhã...Metrôs, trens, ônibus lotados. Vontade louca de um ar condicionado.
E a nuvem nem se movia, indiferente ao movimento. Travessas, ruas, avenidas se esvaziando aos poucos...Carros, buzinas, guinchos, freadas, fumaças.
Dentro de alguns minutos a cidade seria sua. Nave-mãe protetora, aguardava.
Ninguém olhava pra cima...só o chão interessava, o sinal pro ônibus, o buraco, o tropeço...Eu ein? Cair numa hora dessas?
Xingamentos, palavrões, ambulantes, contrabandos, água em garrafas plásticas, biscoitos de polvilho...Olha o DVD do filme que ainda nem passou. Aqui, só comigo, o último modelo de óculos do "Feichon Rio" É hoje só...aí madame, a sacola do "Luis Viton"  que acabou de chegar de Paris...
Segura a bolsa. Olha a mochila. Vem um trombadinha virando a esquina. Olhos atentos, cansados, sonolentos. Suor escorrendo nos decotes, nos ternos, nas costas. Celulares tocando... portas dos metrôs engolindo, ônibus cuspindo, motos vomitando gás carbônico, fumaça negra, inferno na terra. Gente feia, outras bonitas, uns pobres coitados, alguns mendigos.
E a nuvem, imóvel, branca e rosada ao cair da tarde no centro do Rio. Magnânima rainha, disco voador etéreo, ancorado num céu de dezembro.
Afinal, todos se foram, embarcaram em suas vidas, atrelados ao destino, cada qual com sua dor, seus amores, sonhos, desejos. Tristes uns, outros felizes. Formiguinhas apressadas voltando aos seus formigueiros. Mal sabem elas que basta uma pisada...formigas apenas, no meio de milhões de outras...
Nuas ruas, silencio, cães latindo, paisagem rosada....e a nuvem pairando, esperando o momento adequado.
Silenciava a cidade. As cigarras se calavam, o calor dava uma trégua, uma brisa finalmente soprava. Céu escurecia...
Despontou primeiro um halo, depois um raio, resplendor. Foi saindo devagar, detrás da nuvem enorme...foi saindo, suave, enquanto a brisa desfazia sua coberta , seu imenso manto de organdi....desmanchou-se a renda e o tule e deu lugar à lua cheia, imensa, redonda, amarela... escondida o dia inteiro...E o espetáculo aconteceu, sem público e sem platéia....só as poucas árvores assistiam. Solitariamente descortinou-se, iluminou a cidade...não valia a pena mostrar-se pra uma gente que se esqueceu de olhar pro céu uma única vez...
31/05/2010.
Participei com este conto do Concurso Prosa&Verso do jornal O Globo, onde era necessário escrever sobre a foto. Deixo aqui, como um presente aos meus leitores e amigos.

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Contos Para Gente Grande 2 - Rapunzel

Rapunzel

Era uma vez um casal muito feliz que esperava seu primeiro filho. Eram vizinhos de uma mulher má, feia e invejosa, uma verdadeira bruxa, cujo prazer era espreitar o que o casal fazia.
A infeliz chegava ao cúmulo de ficar escondida atrás das cortinas e, pela janela, olhar enquanto faziam amor imaginando-se no lugar da jovem mulher e, excitada, fechava os olhos, sonhando que eram seus, os lábios que o jovem, da casa em frente, beijava.
Esta mulher tinha uma bela horta, pois isso era a única coisa que sabia fazer bem, plantar legumes e verduras que vendia na feira.
Numa noite, a jovem grávida sentiu um desejo imenso de comer beterrabas. Desejo de grávida tem que ser satisfeito, pois como sabem, se não o for, a criança poderá nascer feia como um rato.
O marido, preocupado e sem um tostão no bolso, pensava onde iria arrumar beterrabas aquela hora da noite, quando teve uma ideia: pedir a vizinha que lhe desse duas ou três, só para saciar o desejo de sua mulher e que no fim do mês lhe pagaria.

Ao bater à porta da feiosa, ela abriu de má vontade, arrastando as chinelas:
- O que quer a estas horas?
Quando viu que era o jovem rapaz, assanhou-se toda, ajeitou os cabelos desenxavidos, aprumou-se e deu-lhe seu melhor sorriso banguela.
_ Boa noite minha senhora, me desculpe por estar incomodando a estas horas mas é que minha mulher...e blá,blá,bla...explicou tudo.
A bruxa, imediatamente, como só as pessoas má intencionadas sabem fazer, pensou logo num meio de tirar vantagem da situação.
- Hum sei...queres beterraba pra aquela tua mulher...hum. Bem, te proponho um trato.
E, como quem não quer nada, lançou ao jovem um olhar cheio de excitação e volúpia, deixando escorrer a blusa de modo a que ele visse, num relance, suas duas muxibas caídas e murchas, mais murchas que maracujá de gaveta.
- Dou-te as beterrabas, mas tu hás de se deitar comigo e fazer amor como fazes com aquela tua mulher.
O jovem arregalou os olhos e sacudiu a cabeça, veementemente.
- Isso não senhora, de jeito nenhum! Argh!

E saiu porta a fora, sem as beterrabas.
Ao voltar para casa, sua mulher, já salivando, perguntou pelas beterrabas, e ele, tristemente, disse que a vizinha não lhe quisera vender.
Ela caiu num pranto sem fim.
- Ai, pobre de mim, meu filho há de nascer com cara e focinho de rato...ai de mim!
O marido voltou à casa da maledeta.
- Aff, mulheres, como são complicadas!
Bateu novamente à porta:
- Minha senhora, por favor, me dê as beterrabas, minha mulher está desesperada de vontade de comê-las.
- E eu com isso? falou a desdentada. Eu quero é ser comida por ti e muito bem comida. Tu me apeteces e não é de hoje. Faz-me o favor de entrar, tiras a roupa, fazes amor comigo e te dou todas as beterrabas que quiseres.
- O jovem negou, enojado, e disse-lhe que faria qualquer outra coisa que a bruxa pedisse, menos deitar-se com ela.
- Então vou pensar no que desejo. Podes pegar as beterrabas. Mas lembra-te do que me prometeu! Não poderás voltar atrás.

E assim, o jovem levou quantas beterrabas lhe couberam nas mãos e satisfez o desejo da mulher.
Passaram-se os meses e um dia, quando sua filha já estava com quase um ano, a mulher bateu à porta.
- Vim buscar o prometido.
Ah? Como assim? perguntaram os dois jovens, entreolhando-se.
- Vim buscar a menina. Tu me prometestes o que eu quisesse, não te lembras? Em troca das beterrabas, sorria, desdentadamente, a malvada.
A mãe apertou a filhinha contra o peito e a velha a puxava. A criança berrava e a velha por fim, conseguiu soltá-la da mãe e sumiu com ela na escuridão.
Os dois jovens não suportaram a perda e acabaram se separando. A moça nunca perdoou o marido. Teria sido preferível mil vezes ter se deitado com a bruxa.
Rapunzel, que era como a menina se chamava, mudou-se com a velha para outra cidade. Foram morar na cobertura de um prédio, afastado do centro.
A velha só deixava que Rapunzel saísse para levá-la ao médico, pois agora, era mais velha ainda e vivia cheia de dores nas juntas, estava diabética e enxergava mal.
Os cabelos de Rapunzel cresceram tanto que, para penteá-los, ela tinha que jogar as tranças para fora da janela do terraço e eles batiam lááá na calçada.
Ela vivia triste, sozinha, tendo como única companhia, a velha e egoísta que a criara.
Um dia, olhou para o céu e pensou:
- Tudo o que eu queria era um homem interessante, bem apessoado, sensível e com quem eu pudesse dividir meus sonhos.

Um dia, ao desembaraçar seus longos cabelos sentiu um peso danado, puxando-a para baixo. Teve que segurar-se no peitoril da janela para que não caísse daquela altura, quando de repente, um jovem de óculos e ar de intelectual, cabelo espetado com gel, saltou na sua frente, agarrado em suas tranças.
Ela, levou um susto enorme, mas bem que gostou ao ver aquele jovem tão bem apessoado, ali.
Deu-lhe seu melhor sorriso e convidou-o a se sentar.
Ele, respondeu-lhe:
- Não meu bem, obrigadíssimo. Só vim aqui te convidar para ir ao meu salão. Sou cabeleireiro aqui no bairro e queria te dar o meu cartão. Quando resolver cortar esses seus cabelos lindos e enoooormes não se esqueça de me procurar, darling!
Deu dois beijinhos nela e pediu:
- Faz um obséquio querida? Me empresta suas tranças pra eu descer? Se chego amassado no salão, meu parceiro vai me fazer um interrogatório, ele mooooorre de ciúmes de mim. Beijinho querida.
Rapunzel, decepcionada, colocou as tranças na janela e deixou o moço descer. E continuou a viver com a velha e morreu solteira e solitária à espera de um amor que nunca veio.

" Tomemos cuidado com o que desejamos pois nossos sonhos  podem tornar-se realidade" 
 autor anônimo

quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Contos Para Gente Grande 1 - A Princesa e a Ervilha

Lembram dos contos dos irmãos Grimm, de Hans Christian Andersen? Pois é, resolvi reescrever vários contos de crianças, adaptando-os para adultos. Se vai dar certo? Sei lá, mas aqui vai o primeiro:

A Princesa e a Ervilha.

Era uma vez uma princesa.
Ela era chic, fashion, inteligente, só usava Prada e sapatinhos Laboutin com a solinha vermelha. Lenços e echarpes Hermès. Tudo o que o dinheiro podia comprar ela possuía. Mas ela era solitária. E invejada.Todos os homens pelos quais se apaixonou só queriam saber de sua fortuna e de sua realeza.
Numa de suas estadas em Paris, hospedou-se no Georges V, como sempre fazia e arrumaram o quarto mais lindo para a linda e loura princesa.
Com vista para a Torre Eiffel e o rio Sena (na minha estória pode, tá?), borrifado com lavanda da Provence, o quarto era um sonho cor de rosa.
Para que a cama da princesa ficasse beeeem macia, pois ela estava acostumada com tudo de melhor que havia no mundo e só dormia em colchões de pluma de ganso e em lençóis de 2000 fios egícios, o velho camareiro colocou cerca de 30 colchões, um em cima do outro e uma escada ao lado para que a princesa pudesse subir láááá no alto da cama.

Acabou que, ao se deitar, a princesa ficou com a cabeça quase colada no teto e começou a ouvir uns barulhos vindos do quarto de cima.
Uns gemidos, uns arquejos. A princesa, curiosa, colou o ouvido no teto para ouvir melhor:
- Ai meu amor, assim...
- Ai que gostoso, querido...
- Meu amor, como eu te amo...
E ouvindo tanto aiaiai, uiuiui e tantas juras de amor  a princesa começou a pensar em como desejava arranjar um príncipe, lindo, forte, musculoso, másculo e que a amasse de verdade.
Chamou o camareiro e pediu um champagne.
Tomou a garrafa quase toda, na esperança de dormir e não ouvir mais os gemidos e sussurros do casal do quarto de cima.

Nada adiantava. Ela continuava ouvindo o casal que fazia amor no andar de cima, pelo visto, no chão.
Até que resolveu pedir um Rivotril ou um Lexotan qualquer coisa  que a fizesse dormir, pois de nada adiantava a maciez do colchão, o perfume de lavanda, o champagne. Ela estava começando a ficar triste demais e a ter a consciência de que nada adiantava ter dinheiro, luxo e conforto quando não se tem com quem dividí-lo.
Até que o camareiro, com pena da princesa, trouxe-lhe uma sopa de ervilhas bem quentinha, sentou-se na cadeira ao seu lado e começou a contar sua vida.
A princesa, encantada, ouviu o relato do velho camareiro, enquanto tomava sua sopa cheirosa e quente, até que, finalmente, adormeceu.
O camareiro saiu, pé ante pé, fechou a porta do quarto devagar e sorriu contente, pensando com seus botões: Ainda bem que as ervilhas encontradas debaixo dos colchões e  juntadas ao longo de todos esses anos, finalmente, serviram para aquecer um coração solitário.
E assim, a princesa aprendeu, que sempre que se sentisse só, bastava uma boa e quente sopa de ervilhas e um amigo ao lado para que sua solidão desaparecesse.

 "Precisamos de muito pouca coisa. Só uns dos outros."
Carlito Maia - escritor e publicitário.
                                                           Fim

quinta-feira, 26 de novembro de 2009

Feliz!






Gente, passei rapidinho pra dizer que estou feliz, emocionada, com o coração batendo descompassado!
Minha amiga Cris do blog http://www.cantodecontarcontos.blogspot.com/ postou 2 contos meus hoje!
O primeiro escrevi por volta dos 16 anos, o segundo escrevi para o aniversário do blog dela, há mais ou menos 2 semanas atrás.
Nunca tive nada meu publicado ou divulgado, embora sempre tivesse vontade de escrever um livro...o tempo passou e hoje escrevo aqui...mas quem sabe, isso me dê uma força e a coragem que preciso pra escrever meu livro tão sonhado?
Cris, fica aqui, minha gratidão sem tamanho a você, pelo carinho, sensibilidade e aconchego que dá a todos que usufruem de sua amizade!
As fotos que você escolheu para os meus contos são de uma beleza indescritível. Conseguiram expressar e captar exatamente a minha essência.
Um graaaaande beijo.