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terça-feira, 21 de junho de 2011

Solstício De Inverno

Eu era bem pequena e meu pai possuía um calendário repleto de fotos com paisagens nevadas que eu adorava.
Ficava horas e horas olhando aquelas imagens cheias de gelo e neve e, não sei bem porque, tinha vontade de lamber as crostas de gelo, que eu associava, em minha imaginação infantil, à  pedaços gigantes de açúcar candy, como no conto do João e Maria e à casa de doces da velha bruxa....
Eram várias páginas, uma mais deslumbrante do que a outra, mostrando neve, rios congelados, casinhas cobertas com uma grossa camada de gelo, parecendo mesmo aquelas coberturas de glacê branco dos bolos de antigamente...puro açúcar de confeiteiro...
Eu olhava e olhava e não me cansava de olhar...Não sei bem porque meu pai guardava aquele calendário ano após ano, talvez, também ele, sonhando com paisagens distantes, com o dia em que veria a neve, com o dia em viajaria para um país gelado...Talvez fosse este o seu grande sonho: ver neve e paisagens brancas, tão aparentemente inalcançáveis para quem vive nos trópicos....
Um dia, tomei coragem e lhe pedi o calendário...e ele me deu. Guardei-o durante anos com carinho e sempre que o tirava de uma gaveta ou o encontrava por acaso, remexendo em minhas coisas, olhava-o distraída e me perdia novamente naquelas paisagens deslumbrantemente azuis e brancas e, associava, de imediato, aquelas brancuras geladas ao açúcar, às grandes coberturas cremosas, como chantilly cobrindo um bolo feito só para mim...Suspiros de neve com o gosto doce da infância...
Hoje, ao procurar fotos para falar sobre o solstício de inverno aqui no hemisfério sul, que tem a noite mais longa do ano, me deparei com essas lembranças...elas saltaram de uma gaveta perdida no tempo e pularam sobre mim, fazendo com que eu mudasse totalmente o rumo do que iria escrever...
Talvez seja a idade, talvez o momento que vivo, talvez o livro que ando terminando, não sei dizer a razão, mas minhas memórias têm voltado de uma forma tão intensa, tão bela...Belas sim, porque vêm com uma saudade que não tem mais dor. Trazem com elas somente uma nostalgia, como no livro de Proust, como uma busca suave de um tempo pedido. O sabor da infância que o palato já esqueceu, mas que a memória teima em trazer...
O calendário de meu pai, me trouxe uma lembrança doce, um pouco do açúcar daquele creme imaginário e que jamais provei...Tampouco ele...que deve ter deixado de realizar sonhos para que nós, seus filhos, pudéssemos sim, sonhar....

Dedico esse post de solstício de inverno aos sonhos e à possibilidade de os realizarmos...
E, à memória de meu pai, que morreu sem ter tido tempo de realizar os seus...

sexta-feira, 17 de junho de 2011

Um Livro, Óculos e Uma Caneta - Natureza Viva

Alguns poderão olhar esta foto e ver simplesmente, um livro, uns óculos e uma velha caneta tinteiro...
Pois, para mim, é meu primeiro livro, os óculos que me fazem enxergar e me possibilitam a escrita e a velha e usada, tantas vezes manipulada, Parker 51 que pertenceu ao meu pai. Trata-se de um natureza viva e pulsante.
Já contei a estória desta caneta aqui e aqui.
Meu livro não é nenhuma obra prima, é somente meu primeiro livro, onde coloquei minhas dores, angústias, dúvidas e respostas que encontrei em mim e nas mulheres à minha volta. Não será daqueles livros marcantes ou inesquecíveis. Tenho plena consciência das suas falhas, defeitos, erros mesmo. Mas não importa. É meu, foi o que consegui fazer e dar de mim naquele momento.
Não tenho sequer a pretensão de achar que todos deveriam gostar ou avaliá-lo como excelente.
Tenho tido ótimas avaliações, até de gente que nem conheço, como a mãe de uma amiga que me disse que leu, releu e tornou a ler, ou de uma amiga, inteligente e culta que me disse que ficou pasma ao ver como descrevi bem essa fase da vida das mulheres e de sua surpresa ao constatar como escrevo bem...acho que nunca havia lido o que escrevo por aqui...Tenho recebido emails, comentários, o livro está vendendo muito bem, já passou dos 250 exemplares vendidos, mas sei que não será um best seller e nem ouso pretender isto.
Enfim, sei que não sou um Tólstoi, um Machado, uma Lígia, sequer uma Martha...sei que engatinho na arte da escrita, tenho meus méritos, sei que escrevo bem, mas sei também que como eu, há milhares e muitos outros, melhores, mil vezes melhores, e não tenho a extrema vaidade que alguns supõem que eu tenha. Tenho-a na dose certa, pois sei do meu valor. Claro que fico feliz ao receber elogios. Fico feliz e me sinto orgulhosa do que fiz e do que tenho feito até agora.
Mas, não é sobre isso que vim falar hoje, ainda me restabelecendo da gripe. Vim falar sobre a caneta de meu pai, a velha e gasta Parker 51, que está guardada e é a minha fonte de inspiração, uma espécie de amuleto, pois veio parar em minhas mãos, nem me lembro mais como ou porque.
Eu me emociono todas as vezes que falo dela, porque ela me faz lembrar meu pai, que me dizia que publicaria meus poemas quando eu era adolescente e que partiu, num dos infartos que teve, quando eu tinha quinze anos...
Já falei sobre meu pai aqui, sobre a minha relação com ele em vários posts e sobre a sua ausência em minha vida nesta fase tão complicada que é a adolescência, mas, enfim, não quero me vitimizar e nem levar a coisa toda para um lado que não é de meu feitio. Sobrevivi à sua perda, virei mulher, casei e tive meus filhos e a caneta só me pareceu importante de uns anos para cá.
Acho que ela tem uma simbologia única, pois, ao olhá-la, sinto como se olhasse o meu pai. Ao tocá-la, sinto que um pedaço de meu pai, está ali, nas digitais deixadas, na pena torta pela sua escrita, nos resquícios de tinta azul turquesa que ele gostava de usar.
Então, escrevi hoje esse post, porque meu pai continua sendo meu mecenas, ainda que não mais esteja aqui há muitos anos, pois investiu em mim, na minha cultura, nos livros que me deixou, em tudo o que me transmitiu em ética e amor pelos livros, mas, principalmente, por ter acreditado em mim, quando eu era praticamente uma criança. Ele atestou o meu valor. Para mim, isso foi fundamental.
Ao olhar esta foto, com três coisas que simbolizam a minha primeira vitória, o primeiro passo na construção de um sonho sonhado lá atrás, numa outra esquina do tempo, senti vontade de escrever sobre isto e de como, apesar de tanta gente continuar me olhando de braços cruzados, gente com laços de sangue, gente que poderia ter me estendido a mão e não estendeu, eu, a filha temporã, a raspa do tacho, a que se lembrava tão pouco dele, sinto o olhar de meu pai, sinto seu toque, seu abraço perdido nas brumas do passado, seu aval, seu sorriso...Tudo isso, simplesmente, porque possuo a sua caneta. Uma velha e gasta Parker 51.
Obrigada a todos que tem me dado força e coragem para continuar. Obrigada, meu amado irmão Renato. Obrigada Paulo Bastos, meu amigo e fotógrafo que eternizou um momento, numa esquina do tempo chamada Saudade.

segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Meu Pai e Eu...2a. Parte



Ontem fiquei muito mexida depois de ter escrito o post sobre meu pai e a caneta Parker, que, não sei porque acabou vindo parar em minhas mãos. Tenho um irmão mais velho, que inclusive tem o seu nome. Porque não ficou com ele?
Tenho uma irmã mais velha que era muito ligada ao meu pai. Porque não ficou com ela?
Não sei porque, sinceramente, essa caneta ficou comigo. Se foi minha mãe que me deu. Se eu peguei e fiquei com ela.
Não me recordo mais.
Mas ontem, depois do almoço, e com 3 taças de vinho Chianti na cabeça, fui tomar banho e, enquanto a água quente caía sobre mim, tive uma espécie de "revelação" causada, talvez pelo álcool, ou pela emoção.
Fiquei pensando que meu pai vive em mim...Não como uma reencarnação, não é isso, mas um pedaço dele ainda está em mim e aquela caneta, mesmo velhinha, com o dourado descascado pelo uso, me fez pensar sobre o quanto de nossos antepassados carregamos conosco.
Meu pai tinha uma escrita brilhante. Escrevia muito bem porque leu muito. Sua caligrafia era primorosa.
E sua caneta, tão usada e gasta, com vestígios da tinta azul turquesa que tanto gostava, quis o destino, que viesse parar em minhas mãos.
Durante o banho, refleti sobre isso. E o romance de ficção, baseado em fatos reais que estou escrevendo agora, me fez ter a certeza que não só meu pai, mas todos os meus ancestrais vivem em mim.
Pode ser que através de minhas mãos eles estejam querendo contar uma parte da estória de nossa família. Pode ser que eu seja o instrumento, a mão que escreve, com uma caneta que pertenceu a meu pai, um pedaço de uma estória que estava esquecida por todos.
Senti, com a água quente descendo em meu corpo, que eu sou todos eles. Tenho todos eles em mim.
Não recuperarei a caneta, como pensei inicialmente.
Vou usá-la assim, gasta, com as digitais de meu pai impressas nela.
Que a parte dele que há em mim me dê a força que preciso para lutar por meu sonho. Que através da força e da coragem de meus ancestrais eu encontre o tesouro que tanto desejo, no final desse arco íris que vislumbro daqui.

domingo, 8 de agosto de 2010

Meu Pai e Eu..


Eu não sou nada a favor dessas datas comerciais, como dia das mães, dia dos pais etc, mas, como estou num momento muito importante da minha vida, momento que pode ser um divisor de águas, embora tardio, na minha caminhada, resolvi falar de meu pai hoje. Lembrar dele, coisa que tenho feito muito ultimamente.
Já contei antes, aqui, que perdi meu pai quando eu tinha 15 anos.
Em plena adolescência, período conturbado e difícil, onde atravessamos uma espécie de limiar que divide a nossa vida entre a juventude e a maturidade.
Pois foi justamente aí, nessa fase, que meu pai me deixou. Ele já estava doente há cerca de três anos.
Já havia tido 2 infartos e quatro edemas pulmonares, causados pelo fumo. No terceiro ataque cardíaco e quinto edema, ele morreu e o mais traumático, em casa, pois a ambulância demorou a chegar e quando os médicos chegaram, nada mais puderam fazer.
As minhas últimas palavras para meu pai, e talvez, as últimas que ele ouviu, saíram da minha boca, que da inocência dos meus quinze anos, achava que assim, estaria distraindo-o e aliviando seu sofrimento. A lua estava cheia e linda lá fora e o céu, muito estrelado. Ele, sentado na cama, lutando para respirar.Entrei em seu quarto e, quando olhei pela janela e vi a lua, falei: Pai, olha que lua linda está lá fora...Não me recordo se cheguei a beijá-lo, mas logo saí do quarto e não tive mais coragem de voltar lá e vê-lo naquele sofrimento horrível.
Acho que meu pai morreu sozinho. Pois minha mãe e minha irmã aflitas, esperavam a ambulância que nunca chegava, na porta do prédio onde morávamos.
Eu tinha prometido a mim mesma que não iria chorar hoje, ao contar isso, mas é impossível não reviver a dor de uma quase criança que ficou sem pai quando mais precisava dele.
Meu pai havia me prometido publicar meus textos e poesias e fazer um livro com meus escritos.
Então, vejam só: meu sonho foi enterrado junto com ele. Pelo menos eu pensei que tivesse sido. Continuei escrevendo pela vida, mas abandonei o sonho, não me achava capaz de concretizá-lo sem meu pai.
O tempo passou, me casei aos 20 anos, terminei a faculdade, tive meus filhos, fui morar no interior e parei de escrever.
Não sentia mais vontade, parecia que a poeta dentro de mim havia sucumbido à rotina, ao vai e vem da vida, das mudanças.
Mas o que eu não enxergava era que o que meu pai havia plantado em mim, estava adormecido, mas continuava lá, em algum canto escondido de mim mesma.
Tudo o que meu pai me ensinou e me deixou foi cultura, conhecimento e, principalmente o amor pelos livros.
Ela era um homem de frases e nos dizia, a mim e a meus irmãos: "Conhecimento não ocupa espaço".
Ou " Leia tudo o que cair em suas mãos, desde o gibi até o melhor dos livros".
Era um homem elegante, de personalidade forte e voz de locutor de rádio, grave e bonita.
Eu herdei sua caneta tinteiro. Ele só escrevia com sua Parker dourada e tinta azul turquesa. Tinha uma letra de caligrafia impecável.
Será com essa caneta que autografarei meus livros. Será minha maneira de homenagear o homem que me fez amar os livros e inventou, de certa maneira, essa escritora que vos escreve.
Um Feliz Dia dos Pais a todos os pais que, como o meu, por amor a seus filhos, deixa dentro deles a semente que um dia, no futuro, irá brotar.
Ao meu Pai, Renato e à sua memória!

quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

Homenagem

Ontem, dia 6 de janeiro, seria aniversário de meu pai e, hoje, pois já é meia noite, dia 7, aniversário de minha mãe...
Sempre comemorávamos o aniversário da minha mãe à meia noite...pois geralmente mamãe fazia uma festinha ou um jantar para o meu pai e ele, fazia questão que eu e meus irmãos, déssemos o presente a ela, meia noite em ponto.
Se fosse viva, minha mãe faria 90 anos hoje. Meu pai era dois anos mais velho.
Como já contei aqui antes, meu pai morreu aos 56 anos...muito novo, mas, fumante inveterado, teimoso, depois de vários infartes e edemas pulmonares, continuou fumando escondido. Morreu em casa, sentado na cama...e eu, nunca vou me esquecer desse dia, pois, querendo consolá-lo na sua agoniante falta de ar, esperando a ambulância que nunca chegava, olhei pro céu e vi a noite tão linda, com uma lua cheia tão brilhante, que falei as últimas palavras que disse a meu pai: Pai, está uma noite tão linda lá fora...
Eu, na sensibilidade e inocência dos meus 15 anos, achei, que naquele momento, aquilo poderia consolá-lo... Por que não o abracei, não o beijei, porque?
Depois disso, não consegui mais entrar em seu quarto, nem vê-lo morto...não fui ao enterro...me recusei...minha mãe, coitada, pra me proteger, me mandou pra casa do meu irmão, já casado na época. Então, eu não vivenciei a dor da perda, a dor de minha mãe com duas filhas para criar, sendo que eu, ainda uma adolescente...Hoje penso como a pobre deve ter sofrido, sem trabalhar fora, tendo vivido a vida toda, para a casa, para o marido e os filhos...de repente, se ver sozinha, sem amparo...como deve ter se sentido só e desesperada. E ainda jovem, com 54 anos.
Minha mãe foi uma mulher muito bonita, morena, de corpo lindíssimo, mas uma pessoa com muitos problemas emocionais...Hoje vejo que o que ela tinha era depressão, mas, naquele tempo não se procurava psicólogo, muito menos psiquiatra, então, sublimou-os todos, se voltando para a religião. Talvez essa minha ojeriza desde pequena, por todas as igrejas, por todas as formas de repressão, seja por causa disso...
Minha mãe era uma católica ferverosa, vendo pecado em tudo, mas apesar disso, foi uma boa mãe...comigo, foi muito carinhosa, sempre preocupada com minha saúde, pois sou asmática desde pequena, e, sempre me ajudou muito, apesar de suas limitações.
Meu pai, me lembro tão pouco dele...mas lembro de sua risada imitando o Popeye, que ele gostava de fazer pra mim e eu, adorava ouvir...Me lembro de seu amor pela leitura, pelos livros, amor esse, que nos deixou de herança... meu pai foi também, um homem extremamente honesto e íntegro...Trabalhou na Caixa Econômica, sempre em cargos de chefia, durante 30 anos e era tanto amado quanto detestado, pois era extremamente exigente com seus funcionários. Nunca aceitou suborno ou qualquer tipo de desonestidade. Ele abominava essas coisas...Acho que eu e meus irmãos temos muito dele, dessa coragem e integridade.
Outra coisa que nunca esqueci: jamais mentir. Ele odiava mentiras e nós também, sou assim até hoje. Prefiro a verdade que doa do que a mentira que entorpece...mentir é igual a uma droga pesada, depois que se começa, não se consegue mais parar.
São tantas e tantas as coisas que aprendi com meus pais... O que sou e até o que não sou, devo a eles.
Ficaram casados por mais de 30 anos, tentaram fazer cada um ao outro feliz, lá à maneira deles...e morreram no mesmo mês, em maio. Meu pai em 1973 e minha mãe em 2000.
Hoje, já não tenho mais os dois, não tenho mais o colo, o abraço, o porto seguro, que tantas e tantas vezes na vida procurei e não achei mais.
Nem pensei que isso mexeria tanto comigo, mas estou escrevendo isso, chorando tanto, que por vezes, nem vejo o teclado, então, me perdoem se porventura não escrevi tão bem assim...foi a emoção...
Hoje, quis homenageá-los com minhas lembranças, algumas não tão doces como gostaria, mas todas, com uma imensa, incomensurável saudade.